domingo, 26 de abril de 2009

Cristo haveria de sofrer - III Domingo de Páscoa

As leituras da liturgia da palavra desse III Domingo de Páscoa apresenta-nos uma verdade, às vezes obscurecida pelas alegrias pascais: O Cristo glorioso, ressuscitado, sofreu o suplício da cruz verdadeiramente; aliás era preciso que sofresse, e, assim se cumprisse as Escrituras, conforme nos atesta Pedro em seu discurso (cf. At 3,18, e as palavras do próprio Jesus (cf. Lc 24,44).
O sofrimento redentor de Cristo foi necessário devido ao pecado humano. Deus nos criou para a comunhão com Ele. Fomos criados para sermos participantes da vida divina, sermos Filhos de Deus por meio do Filho Jesus Cristo. Isso aconteceria independente do pecado, pois antes mesmo do pecado, antes da fundação do mundo, de acordo com o testemunho de S. Paulo (cf. Ef 1,4-5) éramos predestinados à santidade, à adoção filial, ou seja, a vida no Espírito Santo, que nos coloca na comunhão da Trindade Santa. Uma vez que pecamos, dissemos não a esse projeto, aprouve a Deus na sua graça sanar o nosso pecado. E assim, antes de nos elevar a si, Deus apagou a nossa dívida. E o fez por meio de Jesus Cristo. Ele é a vítima de expiação pelo nosso pecado, diz-nos S. João (cf. 1Jo 2,2).
Em Jesus, na humanidade assumida por Ele, fomos redimidos. Foi uma remissão real, pois o Cristo de fato sofreu as conseqüências do pecado. É por isso que Jesus sempre que aparece aos seus discípulos, como no texto de hoje, apresenta as marcas da paixão em suas mãos, em seus pés e em seu lado (cf. Lc 24,39): verdadeiramente Ele sofreu, morreu e ressuscitou. Deus cumpriu sua promessa.
Verdadeiramente Deus e homem, experimentado nos sofrimentos, Jesus tornou-se nosso defensor (cf. 1Jo 2,1). Ele sabe o quanto pesa o pecado humano, conhece o que o pecado pode fazer em nosso coração, embora Ele mesmo não tenha pecado. Não há outro paráclito no qual possamos pôr a nossa segurança e esperança.
Diante da experiência de tão grande amor de Deus por nós, cabe-nos anunciar que Cristo está vivo realmente, guardando seus mandamentos (cf. 1Jo 1,3-5a); e, assim, seremos testemunhos de tudo isso (cf. Lc 24,48).

Cristo haveria de sofrer - III Domingo de Páscoa

As leituras da liturgia da palavra desse III Domingo de Páscoa apresenta-nos uma verdade, às vezes obscurecida pelas alegrias pascais: O Cristo glorioso, ressuscitado, sofreu o suplício da cruz verdadeiramente; aliás era preciso que sofresse, e, assim se cumprisse as Escrituras, conforme nos atesta Pedro em seu discurso (cf. At 3,18), e as palavras do próprio Jesus (cf. Lc 24,44).
O sofrimento redentor de Cristo foi necessário devido ao pecado humano. Deus nos criou para a comunhão com Ele. Fomos criados para sermos participantes da vida divina, sermos Filhos de Deus por meio do Filho Jesus Cristo. Isso aconteceria independente do pecado, pois antes mesmo do pecado, antes da fundação do mundo, de acordo com o testemunho de S. Paulo (cf. Ef 1,4-5) éramos predestinados à santidade, à adoção filial, ou seja, a vida no Espírito Santo, que nos coloca na comunhão da Trindade Santa. Uma vez que pecamos e dissemos não a esse projeto, aprouve a Deus na sua graça sanar o nosso pecado. E assim, antes de nos elevar a si, Deus apagou a nossa dívida. E o fez por meio de Jesus Cristo. Ele é a vítima de expiação pelo nosso pecado, diz-nos S. João (cf. 1Jo 2,2).
Em Jesus, na humanidade assumida por Ele, fomos redimidos. Foi uma remissão real, pois o Cristo de fato sofreu as conseqüências do pecado. É por isso que Jesus sempre que aparece aos seus discípulos, como no texto de hoje, apresenta as marcas da paixão em suas mãos, em seus pés e em seu lado (cf. Lc 24,39): verdadeiramente Ele sofreu, morreu e ressuscitou. Deus cumpriu sua promessa.
Verdadeiramente Deus e homem, experimentado nos sofrimentos, Jesus tornou-se nosso defensor (cf. 1Jo 2,1). Ele sabe o quanto pesa o pecado humano, conhece o que o pecado pode fazer em nosso coração, embora Ele mesmo não tenha pecado. Não há, portanto, outro paráclito no qual possamos pôr a nossa segurança e esperança.
Diante da experiência de tão grande amor de Deus por nós, cabe-nos anunciar que Cristo está vivo realmente, guardando seus mandamentos (cf. 1Jo 1,3-5a); e, assim, seremos testemunhas de tudo isso (cf. Lc 24,48).

A celebração da Eucaristia

Da Apologia em favor dos cristãos, de S. Justino, mártir
A ninguém é permitido participar da Eucaristia, a não ser àquele que, admitindo como verdadeiros os nossos ensinamentos e tendo sido purificado pelo batismo para a remissão dos pecados e a regeneração, leve uma vida como Cristo ensinou.
Pois não é pão ou vinho comum o que recebemos. Com efeito, do mesmo modo como Jesus Cristo, nosso salvador, se fez homem pela Palavra de Deus e assumiu a carne e o sangue para a nossa salvação, também nos foi ensinado que o alimento sobre o qual foi pronunciada a ação de graças com as mesmas palavras de Cristo e, depois de transformado, nutre nossa carne e nosso sangue, é a própria carne e o sangue de Jesus que se encarnou.
Os apóstolos, em suas memórias que chamamos evangelhos, nos transmitiram a recomendação que Jesus lhes fizera. Tendo ele tomado o pão e dado graças, disse: Fazei isto em memória de mim. Isto é o meu corpo (Lc 22,19; Mc 14,22); e tomando igualmente o cálice e dando graças, disse: Este é o meu sangue (Mc 14,24), e os de somente a eles. Desde então, nunca mais deixamos de recordar estas coisas entre nós. Com o que possuímos, socorremos a todos os necessitados e estamos sempre unidos uns aos outros. E por todas as coisas com que nos alimentamos, bendizemos o Criador do universo, por seu Filho Jesus Cristo e pelo Espírito Santo.
No chamado dia do Sol, reúnem-se em um mesmo lugar todos os que moram nas cidades ou nos campos. Lêem-se as memórias dos apóstolos ou os escritos dos profetas, na medida em que o tempo permite.
Terminada a leitura, aquele que preside toma a palavra para aconselhar e exortar os presentes à imitação de tão sublimes ensinamentos.
Depois, levantamo-nos todos juntos e elevamos as nossas preces; como já dissemos acima, ao acabarmos de rezar, apresentam-se pão, vinho e água. Então o que preside eleva ao céu, com todo o seu fervor, preces e ações de graças, e o povo aclama: Amém. Em seguida, faz-se entre os presentes a distribuição e a partilha dos alimentos que foram eucaristizados, que são também enviados aos ausentes por meio dos diáconos.
Os que possuem muitos bens dão livremente o que lhes agrada. O que se recolhe é colocado à disposição do que preside. Este socorre os órfãos, as viúvas e os que, por doença ou qualquer outro motivo se acham em dificuldade, bem como os prisioneiros e os hóspedes que chegam de viagem; numa palavra, ele assume o encargo de todos os necessitados.
Reunimo-nos no dia do Sol, não só porque foi o primeiro dia em que Deus, transformando as trevas e a matéria, criou o mundo, mas também porque neste mesmo dia Jesus Cristo, nosso salvador, ressuscitou dos mortos. Crucificaram-no na véspera do dia de Saturno; e no dia seguinte a este, ou seja, no dia do Sol, aparecendo aos seus apóstolos e discípulos, ensinou-lhes tudo o que também nós vos propusemos como digno de consideração.

sábado, 25 de abril de 2009

Ai de mim, se não anunciar o Evangelho – Festa de São Marcos

A Igreja festeja hoje o Santo Evangelista Marcos. João Marcos foi primeiramente discípulo de S. Paulo, acompanhando-o na primeira viagem missionária deste (cf. Fm 24; Cl 4,10, onde se diz que era primo de Barnabé). Posteriormente, separando-se de Paulo (cf. At 15,36-39), Marcos tornou-se discípulo de Pedro e o acompanhou a Roma, de onde Pedro provavelmente escreveu sua Primeira Carta, na qual Marcos é mencionado, de acordo com a primeira leitura da Sagrada Liturgia deste dia (5,13). É de Roma que Marcos escreverá o seu Evangelho para a comunidade local, a partir da pregação de Pedro, entre os anos de 60-70 d.C.
O Evangelho de Marcos foi o primeiro dos quatro Evangelhos a ser escrito. A mensagem fundamental é a própria Pessoa de Jesus Cristo. Sua estrutura gira em torno da confissão de fé em Cristo, Filho de Deus. Assim, ele começa o Evangelho com uma profissão de fé: “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (1,1) e o termina com a mesma confissão na boca de um pagão: “Verdadeiramente este homem era filho de Deus!” (15,39). No meio do Evangelho temos outra confissão, desta vez na boca do chefe da Igreja, que fala em nome dela: “Pedro respondeu: Tu és o Cristo” (8,29).
No entanto, Nosso Senhor Jesus Cristo, como nos mostra o Evangelho de hoje, mandou que se pregasse o Evangelho; nem Ele próprio escreveu nada nem deixou ordem para tal. E como se passaram os anos entre a morte do Senhor e a redação do primeiro Evangelho? Este foi pregado pelos Apóstolos e seus sucessores, entre eles Marcos. Daí se segue que o Evangelho não é propriamente um livro, mas a mensagem salvífica, que, trocando em miúdos, é a própria Pessoa do Senhor. Deste modo, o significado mesmo da palavra “Evangelho”, Boa Nova, nos dá a dimensão da realidade que anuncia: a boa notícia de que o homem não está mais sozinho, que o homem não está entregue ao próprio destino, que o homem pode ter esperança: Deus veio ter conosco, e em seu grande amor, enviou-nos Seu Filho, que nos amou e por nós se entregou (cf. Gl 2,20).

sexta-feira, 24 de abril de 2009

A árvore da vida

Dos Sermões de São Teodoro Estudita

Ó preciosíssimo dom da cruz! Vede o esplendor de sua forma! Não mostra apenas uma imagem mesclada de bem e de mal, como aquela árvore do paraíso, mas totalmente bela e magnífica para a vista e o paladar.
É uma árvore que não gera a morte, mas a vida; que não difunde as trevas, mas a luz; que não expulsa do paraíso, mas nele introduz. A esta árvore subiu Cristo, como um rei que sobe no carro triunfal, e venceu o demônio, detentor do poder da morte, para liberar o gênero humano da escravidão do tirano.
Sobre esta árvore o Senhor, como um valente guerreiro, ferido durante o combate em suas mãos, nos pés e em seu lado divino, curou as chagas dos nossos pecados, isto é, curou a nossa natureza ferida pela serpente venenosa.
Se antes, pela árvore, fomos mortos, agora, pela árvore recuperamos a vida; se antes, pela árvore, fomos enganados, agora, pela árvore, repelimos a astúcia da serpente. Sem dúvidas, novas e extraordinárias mudanças! Em vez da morte, nos é dada a vida; em lugar da corrupção, a incorrupção, da vergonha, a glória.
Não é sem razão que o Apóstolo exclama: Quanto a mim, que eu me glorie somente na cruz do Senhor nosso, Jesus Cristo. Por Ele, o mundo está crucificado para mim, como estou crucificado para o mundo (Gl 6,14). Pois aquela suprema sabedoria que floresceu na cruz desmascarou a presunção e a arrogante loucura da sabedoria do mundo; toda a espécie de bens maravilhosos que brotaram da cruz, extirparam inteiramente a raiz da maldade e do pecado.
Já desde o começo do mundo, houve figuras e alegorias desta árvore que anunciavam e indicavam realidades verdadeiramente admiráveis. Repara bem, tu que sentes um grande desejo de saber:
Não é verdade que Noé, com seus filhos e esposas, e os animais de toda espécie, escapou da morte do dilúvio, por ordem de Deus, numa frágil arca de madeira?
E o que dizer da vara de Moisés? Não era figura da cruz quando transformou água em sangue, quando devorou as falsas serpentes dos magos, quando separou as águas do mar com o poder de seu golpe, quando as fez voltar ao seu curso normal, afogando os inimigos e salvando aqueles que eram o povo de Deus?
Símbolo da cruz foi também a vara de Aarão, quando se cobriu de folhas num só dia para indicar quem devia ser o sacerdote legítimo.
Abraão também prenunciou a cruz, quando colocou seu filho amado sobre o feixe de lenha.
Pela cruz, a morte foi destruída e Adão recuperou a vida. Pela cruz, todos os apóstolos foram glorificados, todos os mártires coroados e todos os que crêem, santificados. Pela cruz, fomos revestidos de Cristo ao nos despojarmos do homem velho. Pela cruz, nós, ovelhas de Cristo, fomos reunidos num só rebanho e destinados às moradas celestes.

Ano após ano: A Páscoa...

Por Pe. Thiago Henrique Soares P. Tavares
Mais uma vez estamos vivendo o Sagrado Tempo da Páscoa. Tempo marcado pela celebração mais significativa da fé cristã: a Páscoa do Senhor Jesus Cristo! A passagem de Cristo da morte para a vida, das trevas para a luz. Tudo começou na Páscoa: a fé cristã, a vida da Igreja, a esperança sem limites dos discípulos de Jesus, a certeza da vitória, a alegria humana de estar novamente em comunhão com Deus, a quebra do pecado da humanidade ferida por ele, a vida eterna da qual já fazemos parte etc. Não há tempo como a Páscoa!
Este ano, na madrugada do dia 12 de abril, a Igreja celebrou este Dia, o mais importante da fé cristã e início de um tempo novo! Naquela noite os cristãos do mundo inteiro contemplaram boquiabertos o nascer de um dia no qual o sol jamais se põe! “Ó noite de alegria verdadeira, que prostra o Faraó e ergue os hebreus... pondo na treva humana a Luz de Deus” (Exultat), Uma noite santíssima, onde a Igreja mais uma vez, na sua caminhada na história, pôde celebrar solenemente a ressurreição do Senhor. Depois de passar pelos conscientizantes dias da Quaresma, enfim, a Páscoa, a Vitória, a alegria verdadeira que mais uma vez inunda o coração da fé e nos plenifica de esperança. Os longos passos da Quaresma – e que passos penosos... – deram lugar á Vitória do Rei, Senhor de tudo, Jesus Cristo! Que alegria, irmãos, saber que não há mais porque temer, que já não há mais porque nos preocupar, que já não há mais lugar para chorar em nossas vidas!
No entanto, ainda peregrinos neste mundo, não é possível deixar de observar que ainda existe miséria, choro, tristeza, injustiça, dor... mesmo depois da Páscoa. A começar pelos tantos católicos que não se lembraram de ir celebrar a Páscoa do Senhor, ou os que foram como se fosse mais um dia qualquer, ou aqueles que nem sequer deram importância ao que estava sendo celebrado preferindo suas, tão sem importância, alegrias rotineiras. Muitos dos nossos jovens celebraram a Páscoa do Senhor nas baladas – claro era sábado à noite! –, como todos os outros sábados de suas vidas. Muitos dos nossos pais celebraram a Páscoa do Senhor entre amigos, conversando, bebendo, brincado, como em todos os outros sábados. Muitos dos nossos amigos celebraram a Páscoa em meio à tristeza de uma noite solitária e vazia... Todos sem saber o real motivo da festa pascal.
...Ó noite de alegria passageira, que ilude o coração e esmaga a fé... Eis o Sábado Santo da Vigília Pascal para a grande maioria do mundo! Quantos buscaram alegria sem fim naquela noite e só encontraram o vazio de um entusiasmo sem sentido que antes do amanhecer passou? A Páscoa de Cristo tornou-se mais uma desculpa para farras, para diversão desenfreada e atropeladora... a páscoa do coelhinho, que alienava a homem da verdadeira Páscoa, já se perde em meio as novas e tão gritantes afrontas contra a fé. Não há mais necessidade de enganarmos as nossas consciências com sinais sem sentido, agora já temos maturidade de dizer que a Páscoa de Cristo “é uma festinha na igreja, uma missa longa de madrugada ou de manhã”... “e logo no sábado de noite?”, “logo no domingo depois de uma noitada?” (!!!) É meus irmãos... a Páscoa desse ano já é mais esquecida que a do ano passado... Para muitos é mais importante festejar uma páscoa particular, em casa, nas festinhas de cada noite, sem sentido, sem alegria verdadeira, sem Cristo Ressuscitado!
O que importa para essa tão vazia maioria é a ilusão de um bem estar material, de uma alegria marcada pela aparência, de uma patética demonstração de superioridade financeira. Sem contar com a importância suprema que dão a si mesmos, de seus próprios interesses, a satisfação de suas vontades, de seus desejos... a coroação de suas mesquinharias... a ressurreição, na páscoa, de suas misérias! Que mundo pequeno, sem perspectivas de crescimento, de melhora. E quem tem coragem de afrontar a afronta desse mundo? Aos poucos nos tornamos submissos a esta gigantesca realidade de desprezo às coisas sagradas, aos poucos nos configuramos não a Cristo Ressuscitado, mas a estes... que pena!
No entanto, Cristo Ressuscitou dos mortos!!! Venceu, naquela noite, esta realidade miserável e paupérrima. Não importa o que haja no mundo, a Igreja sempre reaviva sua fé na Festa mais importante do Mundo, onde ela renasce e se alimenta. Chega até a ser engraçado, mas é trágico na verdade: as mesmas pessoas que ignoram a fé na Páscoa e em tantas outras festas cristãs, são as mesmas pessoas que choram, tantas vezes, por não ter motivo para festejar. Fazem festas por qualquer motivo por não ter um motivo verdadeiro para se alegrar... “Só tu, ó noite feliz, soubeste a hora, em que o Cristo da morte ressurgia. E é por isso que de ti foi escrito: a noite será luz para o meu dia!” (Exultat). Agora a própria noite tem um motivo de alegria verdadeira. A luz que resplandeceu em meio às trevas do vazio do mundo trouxe o Motivo para a Festa! Festa de fé, que só pode ser celebrada na fé, na fé sem igual, de uma humanidade que tornou-se miserável, pelo pecado, em um Deus salvador que nos tira da lama que nos atola e nos faz Novos em Seu Amor! De tanta alegria, até a noite se fez dia e não dará mais lugar a escuridão do vazio que nos cercava!
Neste dia o “Sol” não se põe mais, não se farão mais as trevas da solidão, da tristeza, do vazio do coração humano. Se ainda passamos tantas dificuldades em um mundo que insiste em ser miserável não é culpa de Deus, nem prova de que o discurso da fé é um engano. O engano em tudo isso é nosso, do próprio homem, que ao invés de contemplar a Ressurreição do Senhor, festeja a ressurreição da mesmice de si mesmo! O que pode haver de bom nisso, de magnífico, para que nos alegremos sem contas? Que ilusão do mundo achar que pode ser feliz sozinho...
Assim, nosso coração cristão se alegra verdadeiramente na Páscoa do Senhor, mas ao mesmo tempo se inquieta frente à realidade do mundo que insiste em procurar Jesus no túmulo, permanecendo sem esperança, sem rumo, sem alegria. Cristo Vive!!! Eis a grande alegria! Alegria que nos acompanha no dia-a-dia, enfrentando os obstáculos, na luta pela verdade e por dias melhores, na esperança de viver um dia que não conheça o ocaso. Onde todos se dêem as mãos e, verdadeiramente, saibam de onde nos vem a Alegria Verdadeira tão sonhada e tão buscada por todos em tantos lugares: CRISTO JESUS RESSUSCITADO!!!

segunda-feira, 20 de abril de 2009

O cristão e a angústia – IX

Do livro O cristão e a angústia, de Hans Urs von Balthasar

No calvário só Cristo é a vítima; quem se encontra na sua vizinhança ou é, como o ladrão, crucificado com justiça em razão de seus delitos, ou (sempre e de qualquer maneira) culpado pela crucificação de Cristo. Qualquer participação real e objetiva na angústia da cruz do Senhor só poderá ter, subjetivamente, este caráter de parcialidade que separa como um abismo, a angústia de Cristo da angústia do Cristão: aquele que sofre por uma graça concedida, é, apesar de tudo, sempre um pecador manchado ao menos pela culpa hereditária. Não quer dizer que a sua qualidade de pecador lhe seja expressamente manifesta como ocasião da angústia: pode acontecer que permaneça escondida, tal como a luz sobrenatural que é preciso deixar incondicionalmente à vontade de Deus. Mas, mesmo neste caso, nunca será tentado a confundir a sua angústia com a do Senhor; suportá-la-á, solitário, no lugar que lhe foi destinado e numa obediência para ele próprio inexplicável.
Podemos por conseguinte, e em resumo, formular uma segunda lei:
Enquanto somos pecadores, e podemos sempre voltar a sê-lo de novo, ainda como crentes, a objetiva ação redentora da Cruz não aboliu simplesmente a angústia do pecado; pelo contrário, esta é posta diante de nós, mesmo na Nova Aliança. Podemos deixá-la atrás de nós, na medida em que verdadeiramente nos aproximamos da Fé que a Cruz nos oferece; fé viva, isto é: que forme a nossa vida. Todavia, ainda que nos seja concedida a graça de sofrer a angústia da Cruz, permanece respeitada a distância que há entre quem não faz mais do que participar do sofrimento e Quem sofreu a sua Paixão redentora; e desta distância é consciente quem sofre a angústia.
No que acabamos de dizer está implícita uma terceira asserção que deve ser ainda expressamente considerada. Se é verdade que a angústia participante na cruz é um fruto especial nascido de um dom da fé, da caridade e da esperança, e uma particularíssima intensificação das mesmas, concedida por Deus, então é impossível que um homem passe diretamente da angústia do pecado para a angústia da Cruz. Em outras palavras: o mistério do obscurecimento na angústia da Cruz, está, sob o ponto de vista teológico, necessariamente enquadrado no mais amplo mistério da redenção cristã do pecado como da angústia do pecado e, por aí, na alegria cristã. Uma autêntica participação, segundo a vontade de Deus, na noite do Crucificado será, pois, sempre um episódio inserido entre uma e outra luz, entre uma e outra alegria, entre uma e outra força.
É, não só improvável, mas intrinsecamente impossível, que Deus chame um homem da angústia do pecado para a angústia da Cruz, sem que este tenha experimentado plenamente a alegria cristã. Isto vale antes de tudo para a noite mística propriamente dita, que não se pode interpretar cristãmente senão numa referência à Cruz: não como um fenômeno de “purificação” posta no início de uma via espiritual, mas sim, e em primeiro lugar, como uma graça cristã, e portanto social, que é administrada por Deus somente, e que pode, por conseguinte, ser imposta em todas as etapas da vida espiritual, com a limitação, porém, que é concedida unicamente a quem tenha chegado a conhecer a luz de Deus na fé, na caridade e na esperança até aos mais profundos recantos da alma. Porque tal “noite” outra coisa não é senão a privação desta luz; e quanto maior for o contraste, quanto mais completa for a privação, tanto mais profunda e eficaz será a noite. Só o Filho de Deus, gerado desde toda a eternidade no seio do Pai, nutrido com a sua substância, pode avaliar plenamente o que significa ser abandonado pelo Pai. Ainda aqui as mulheres de Betânia nos ensinam: elas não teriam podido sentir a angústia da ausência incompreensível de Jesus, se não tivessem sido suas amigas, se a sua presença santificante não tivesse sido para elas a própria vida. Se isto vale para a grande noite mística e para a grande angústia mística que nela se experimenta, vale de um modo análogo, como que em menor formato, para toda a vida de fé cristã viva: “o conforto” da fé precede sempre o “desconforto”, porque este não pode ser sentido cristãmente senão como privação de uma luz espiritual.

domingo, 19 de abril de 2009

Caminhemos, olhos fixos em Jesus!

“Criastes-nos para Vós, e o nosso coração está inquieto, enquanto não descansar em Vós” (Santo Agostinho, Confissões, I,1). Mas, embora o nosso coração tenha sede de Deus, embora nós nos sintamos sozinhos neste mundo, embora este mundo seja tão imperfeito por causa do pecado e do mal, nós insistimos em pôr o nosso coração onde Deus não está! De fato, mesmo nós batizados, mesmo nós que dizemos que conhecemos a Deus, mesmo nós que dizemos que acreditamos na vida eterna, será que vivemos de modo a merecer esta vida? Será que vivemos de acordo com a esperança que temos?
A multiplicidade das coisas, dos fatos, das pessoas, dos trabalhos que temos hoje em dia, continuamente nos deixa desconcertados e atônitos: falta ao homem de hoje a unicidade, a capacidade de viver a vida de maneira centrada e orientada. Nesta civilização do barulho, o que domina o homem é a dispersão. Conseguimos fazer uma coisa de cada vez? Quando paramos para ouvir uma música sem fazer nada ao mesmo tempo? Quantos sites abrimos simultaneamente na internet? Estes são apenas leves acenos de uma realidade muito presente em nossas vidas. O resultado? Sentimos-nos dilacerados, partidos em mil pedaços, querendo abarcar o mundo com um único abraço e não abraçando nada. Ficamos psicologicamente em frangalhos.
No meio de todas as atividades cotidianas, o homem moderno tende cada vez mais a se centrar nesse mundo e em seus problemas. Frequentemente nos esquecemos de Deus e das realidades celestes. E quando isto acontece, nós passamos a querer controlar a vida com nossas próprias mãos. Dizemos: “A vida é minha, eu faço com ela o que eu quiser”. E vivemos uma vida mesquinha, puramente terrena, baixa, com horizontes miúdos e de perspectivas pouco generosas. Aí se faz necessário um questionamento: onde está a nossa vida, nas nossas próprias mãos, ou nas mãos de Deus?
O antídoto para isso é um só: a oração e a contemplação das coisas eternas. É na oração que nos encontramos com Deus, que tratamos amorosamente com Ele em amizade, que penetramos – que contra-senso para o mundo moderno! – na verdadeira realidade do mundo. E a figura deste mundo passa (cf. 1Cor 7,31). Por isso a Igreja pede em nome de seus filhos: Senhor, “redobrai de amor para conosco, para que, conduzidos por vós, usemos de tal modo os bens que passam, que possamos abraçar os que não passam.” (Coleta do XVII Domingo do Tempo Comum). Se, através da oração, buscarmos forças para entregar nossa vida nas mãos de Deus, Este a tomará, a transfigurará e nos devolverá uma vida nova, totalmente transfigurada, uma vida pascal. Por isso, tenhamos coragem: como nos diz o autor sagrado, “corramos com perseverança ao combate proposto, com o olhar fixo no autor e consumador de nossa fé, Jesus” (Hb 12,1), pois “se soubermos perseverar, com ele reinaremos” (2Tm 2,12).

sábado, 18 de abril de 2009

"Paz a vós, recebei o Espírito Santo" - Domingo na Oitava de Páscoa


Esse domingo na oitava de Páscoa encerra os oito dias mais solenes desse tempo litúrgico. Desde o domingo passado até hoje, a Igreja celebra o dia da Ressurreição do Senhor, não cessando de repetir com as palavras do salmista: "Este é o dia que o Senhor fez: alegremo-nos e nele exultemos" (Sl 117,24).
E hoje, ao anoitecer, o Senhor Jesus aparece aos seus, reunidos a portas fechadas (cf. Jo 20,19a). Ele se manifesta e deseja a paz (cf. Jo,20b). Sim, a paz é fruto da páscoa, porque foi exatamente para isso que Filho Eterno se fez homem em nosso resgate: para nos reconciliar com Deus, para reunir os filhos de Deus dispersos pela soberba do pecado, para nos dar a paz com Deus. Jesus ressuscitado é, portanto, nossa paz (cf. Ef 2,14). Ao desejar a paz, Jesus mostra as mãos e o lado, para atestar que é Ele mesmo; a paz que Ele dá agora teve um preço, a cruz, o sacrifício (cf. Jo, 20,20a). Tudo aquilo sofrido por Ele, aparentemente sem sentido, tinha por finalidade a paz da humanidade.
Em seguida, Jesus sopra sobre os discípulos o Espírito Santo (cf. Jo 20, 22). O dom do Espírito é o dom da paz. É pelo Espírito que somos reconciliados com Deus e nascemos para a vida da graça. O dom do Espírito é o corolário de toda a história da salvação. Jesus, na sua humanidade, esvaziou-se de si, entregou tudo, até o espírito, para que na noite de Páscoa, recebesse do Pai, em plenitude, a vida nova no Espírito Santo. Por isso em Jesus, habita corporalmente a plenitude da divindade (cf. Cl 2,9). E uma vez pleno, Jesus derrama esse dinamismo divino, o Espírito, sobre os seus discípulos no Batismo. Hoje, os discípulos ali reunidos foram batizados.
É por isso que todo aquele que crê, nasceu de Deus, como nos diz S. João na sua primeira carta (CF. 1Jo 5,1a). Nasceu de Deus, porque recebeu o Espírito Santo, gerador do homem novo, vencedor do mundo, imagem do pecado (cf. 1Jo 5,4). E esse Jesus em que cremos vem pela água do Batismo e pelo sangue da Eucaristia, segundo o testemunho do Espírito (cf. 1Jo 5,6)no qual todas essas coisas se realizam.
Nascer de Deus é fazer a nossa Páscoa, é passar da realidade velha do pecado para a vida nova. O Espírito-dom devolve-nos a paz com Deus, faz partilhar com Jesus a condição de filhos de Deus, pois é a mesma vida de Jesus que possuímos, o mesmo Espírito; e nos coloca dentro da Igreja, corpo do Ressuscitado. Jesus é a Cabeça da nova humanidade congregada no novo Israel, seu Corpo.
Os Atos dos Apóstolos apresenta essa realidade de maneira muito bela. A multidão dos fiéis era um só coração e uma só alma (cf. At 4,32a). Não o era porque os discípulos da comunidade primitiva eram suficientemente bons ou melhores do que os cristãos atuais. Eram uma só realidade porque nasceram de Deus, por meio do Espírito, formando um único corpo. Por isso partilhavam tudo, a liturgia, as orações, os bens materiais (cf. At 4, 32b).
São essas as razões da nossa alegria nesse tempo de Páscoa, que esta apenas começando. Ao todo serão cinqüenta dias proclamando que o Senhor Ressuscitado nos deu a sua vida no seu Espírito. O mundo e muitos cristãos já não sabem o que é a Páscoa. Precisamos, de fato, crer no que professamos para anunciar: a vida nova já habita em cada um de nós. E nós somos felizes porque acreditamos ser ter visto o Senhor face a face, mas recebemos e acolhemos o testemunho dos seus apóstolos, e o encontramos vivo e ressuscitado sob o véu dos sacramentos, principalmente da Eucaristia. O Senhor ressuscitou verdadeiramente Aleluia!

O pão do céu e a bebida da salvação

Das catequeses de Jerusalém


Na noite em que foi entregue, nosso Senhor Jesus Cristo tomou o pão e, depois de dar graças, partiu-o e deu-o a seus discípulos, dizendo: “Tomai e comei: isto é o meu corpo”. Em seguida, tomando o cálice, deu graças e disse: “Tomai e bebei: isto é o meu sangue” (cf. Mt 26,26-27; 1Cor 11,23-24). Tendo, portanto, pronunciado e dito sobre o pão: Isto é o meu corpo, quem ousará duvidar? E tendo afirmado e dito: Isto é o meu sangue, quem se atreverá ainda a duvidar e dizer que não é o seu sangue?
Recebamos, pois, com toda a convicção, o Corpo e o Sangue de Cristo. Porque sob a forma de pão é o corpo que te é dado, e sob a forma de vinho, é o sangue que te é entregue. Assim, ao receberes o corpo e o sangue de Cristo, te transformas com ele num só corpo e num só sangue. Deste modo, tendo assimilado em nossos membros o seu corpo e o seu sangue, tornamo-nos portadores de Cristo; tornamo-nos, como diz São Pedro, participantes da natureza divina (2Pd 1,4).
Outrora, falando aos judeus, dizia Cristo: Se não comerdes a minha carne e não beberdes o meu sangue, não tereis a vida em vós (cf. Jo 6,53). Como eles não compreenderam o sentido espiritual do que lhes era dito, afastaram-se escandalizados, julgando estarem sendo induzidos por Jesus a comer carne humana.
Na Antiga Aliança havia os pães da propiciação; por pertencerem ao Velho Testamento, já não mais existem. Na Nova Aliança, porém, trata-se de um pão do céu e de um cálice da salvação que santificam a alma e o corpo. Assim como o pão é próprio para a vida do corpo, também o Verbo é próprio para a vida do corpo, também o Verbo é próprio para a vida da alma.
Por isso, não consideres o pão e o vinho eucarísticos como se fossem elementos simples e vulgares. São realmente o corpo e o sangue de Cristo, segundo a afirmativa do Senhor. Muito embora os sentidos te sugiram outra coisa, tem a firme certeza do que a fé te ensina.
Se foste bem instruído pela doutrina da fé, acreditas firmemente que aquilo que parece pão, embora seja como tal sensível ao paladar, não é pão, mas é o corpo de Cristo. E aquilo que parece vinho, muito embora tenha esse sabor, não é vinho, mas é o sangue de Cristo. Antigamente, bem a propósito, já dizia Davi nos salmos: O pão revigora o coração do homem, e o óleo ilumina a sua face (Sl 103,15). Fortifica, pois teu coração, recebendo esse pão espiritual e faze brilhar a alegria no rosto de tua alma.
Com o rosto iluminado por uma consciência pura, contemplando como num espelho a glória do Senhor, possas caminhar de claridade em claridade, em Cristo Jesus, nosso Senhor, a quem sejam dadas honra, poder e glória pelos séculos sem fim. Amém.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Falando de Sentimentos: a amizade


Selma Mendes Berti,
Ministra Extraordinária da Comunhão Eucarística.

“Um amigo ama em qualquer tempo” (Pr 17,17).
Este versículo dos Provérbios evidencia o vínculo existente entre a amizade e o amor, considerando este como parente próximo daquele.
A amizade, sentimento que nos conduz à busca do outro para fazê-lo crescer e ser feliz, tem sua fonte no amor, virtude natural do coração do homem para a realização do bem. Se o amor é sentimento nobre, a amizade leva à nobreza de sentimentos. E é por causa disto que se aprende a bendizer o verdadeiro amigo.
O verdadeiro amigo é aquele que caminha ao meu lado, crescendo e permitindo-me crescer, aperfeiçoando-se e participando do meu processo de aperfeiçoamento.
O verdadeiro amigo é aquele que sabe ser irmão, é irmão que sabe ser amigo, que sabe querer, que sabe envolver-se numa relação de afeto; em síntese, é alguém que me deseja a paz e o bem, que conjuga no plural o verbo amar.
O verdadeiro amigo não deveria partir nunca. Despedida de amigo dói, atinge a alma e o coração. Mas deixa uma certeza: mesmo partindo, o verdadeiro amigo permanecerá comigo. Nunca mais estarei só, a saudade o trará para bem perto de mim!

domingo, 12 de abril de 2009

Não está aqui. Ressuscitou como disse - Domingo de Páscoa

Ressuscitei, ó Pai,
E estou sempre convosco,
Puseste sobre mim a Vossa mão,
Vossa sabedoria é admirável, aleluia!

Ressuscitou Aquele por nós padeceu e foi sepultado! Alegremo-nos irmãos! Na madrugada de hoje, o Pai Eterno enviou seu Santo Espírito, o mesmo Espírito que Jesus tinha entregue ao espirar na cruz (cf. Jo 19,30) e que agora vivifica o seu Filho amado. Este fato, verdadeiramente real, é o centro e o cume da história humana; aqui o homem decaído tem restaurada sua virtude original, perdida em Adão; mais ainda: o homem é elevado à condição divina pela participação filial no Espírito do Único Filho, como nos diz de forma impactante uma Homilia antiga, do século IV, no dia do Sábado Santo: “Constituí anjos para que, como servos, te guardassem; ordeno agora que eles te adorem como Deus, embora não sejas Deus”.
Dirijamo-nos ao sepulcro, para vermo-lo vazio. Dir-nos-ão lá: “Não está aqui. Ressuscitou como havia dito” (Mt 28,6). Observemos, como Pedro e João, as faixas de linho no chão, como que murchas, e o lenço mortuário, endurecido pelo óleo perfumoso, com a forma da face do Senhor (cf. Jo 20,5-7), e creiamos n’Aquele que disse: “Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo 11,25).
Vivificados também nós pelo Espírito do Ressuscitado, recebido no batismo, vivamos também uma vida nova, como diz S. Paulo: “Se ressuscitastes com Cristo, esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus; aspirai às coisas celestes e não às coisas terrestres. Pois vós morrestes, e a vossa vida está escondida, com Cristo, em Deus” (Cl 3,1-3).
Cantemos ao Senhor, que se vestiu de glória! Vestiu-se do Espírito Santo! Despojemo-nos também das velhas roupas do pecado, e, embelezados pela imaculada veste batismal, vistamo-nos de Cristo, Ele que é nossa vida, nossa salvação e nossa glória!

sábado, 11 de abril de 2009

Eis agora a Páscoa, nossa festa! - Vigília Pascal


Hoje, na noite desse Domingo, celebramos a noite mais santa de todas noites. A noite da passagem do Senhor, pela qual fomos assinalados com o dom da vida no Espírito. Foi para esta noite que todo foi feito: Toda a humanidade foi criada para viver na comunhão com Deus, para portar consigo a vida de Cristo Ressuscitado, derramada em nós por Seu Espírito.
Essa noite foi preparada por Deus na história da salvação e levada ao pleno cumprimento hoje. No livro do Gênesis (cf. 1,1-2,1), Deus cria tudo muito bom. Cria o homem e vê que isso é muito bom. No entanto, essa criação ainda não está plena. Ela é destinada para Cristo, cujo sacrifício “ultrapassa em grandeza a criação do mundo realizada no princípio”(Oração após a primeira leitura da Vigília Pascal).
Dessa humanidade criada, Deus elege um povo que será sinal para todos os povos, e do qual virá o redentor da humanidade. Abraão é o primeiro chamado, é o nosso pai na fé, modelo de fidelidade. Ao ser capaz de dizer sim a Deus (Cf. Gn 22,1-18), mesmo na provação do sacrifício das coisas que lhe são caríssimas, como o seu filho Isaac, Abraão recebe a promessa de que, por ele, as gerações serão abençoadas, pois é de Abraão que nascerá Aquele que levará ao pleno cumprimento o projeto de Deus para a humanidade.
Mesmo quando esses filhos da eleição caíram na escravidão, Deus lhe veio em socorro, salvando-os por meio das águas (cf. Ex 14,15-15,1). Assim Deus se revela criador e redentor. O mesmo Deus que cria é o Deus que salva. A libertação de Israel através das águas é prefiguração do verdadeiro e definitivo banho de regeneração do batismo, por meio do qual Deus concede a “todos os seres humanos tornarem-se filhos de Abraão e membros do povo eleito” (Oração após a terceira leitura da Vigília Pascal).
Embora muitas vezes indignado com o seu povo, muita vezes infiel e pecador, que reiteradamente insistia em não reconhecer a Deus como fonte da verdadeira vida, Deus afirmava por seus profetas que nada podia mudar a aliança selada com Israel, nada poderia apartá-lo do seu povo eleito (cf. Is 54, 10). E convidava o povo a ir a Ele, buscando-o, enquanto podia ser achado (cf. Is 55, 6).
Era preciso ainda – Deus o afirmara por seu profetas -que Israel descobrisse sempre onde está a sabedoria e onde está o brilho dos olhos e a paz (cf. Br 3,11-14) porque, quando Israel abandonava a fonte da sabedoria, se perdia e se tornava escravo.
E assim Deus foi preparando a manifestação do Seu Filho pelo qual temos a vida nova no Seu Espírito. Tal evento foi anunciado nas palavras de Ezequiel: Deus nos daria um espírito novo, colocaria o seu espírito dentro de nós, purificando-nos de toda a idolatria, dando-nos um coração novo. (cf. Ez 36,26-28).
E finalmente, pela morte e ressurreição de Jesus Cristo, Deus nos dá a vida plena. Hoje, ao ressuscitar Seu Filho dentre os mortos, Deus dá início à ressurreição de toda a humanidade. “Ele ressuscitou” (cf. Mc 16,6) e derramou o mesmo Espírito de vida em cada um daqueles que foram batizados. A ressurreição, portanto, tem seu início no batismo, onde plenos do Espírito, somos chamados a viver na comunhão com Deus até o dia em que também passaremos dessa vida para a comunhão definitiva com Deus, por Jesus Cristo. “Pelo batismo na sua morte fomos sepultados com Ele, para que, como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, assim também nos levemos uma vida nova” (Rm 6,4). E “se, pois, morremos com Cristo, cremos que também viveremos com Ele” (Rm 6,8). Eis o projeto de Deus para nós, preparado através dos tempos: fazer-nos homens novos, filhos seus desde agora, e, plenamente, na eternidade. Eis agora a Páscoa, nossa festa!

"Ele desceu à mansão dos mortos" - Sábado Santo

Hoje a Igreja se coloca junto à sepultura do Senhor. Não se celebra nenhuma ação litúrgica. Há apenas a contemplação do mistério da morte do Senhor, sua descida à mansão dos mortos.
Sim, realmenre o Senhor experimentou a morte. E essa morte causou um grande silêncio. Esse é o sábado mais silencioso da história humana, e, paradoxalmente, o mais eloqüente.
É o mais silencioso porque a morte nos deixa sem palavras, sobretudo a morte do justo, a morte vil, como foi a de Jesus. É o sábado da ausência de palavras do próprio Deus. Hoje, o Pai parece ter abandonado a humanidade à sua própria sorte. O mal que o pecado traz, aparentemente, venceu.
O silêncio de Deus nesse sábado após a Sexta-feira da Paixão do Senhor, recorda-nos a dor da ausência de palavras nos dias que se sucedem aos absurdos da vida de cada um de nós: o absurdo das perdas dolorosas, das separações inevitáveis, dos amores frustrados.
No entanto, ao se calar diante da morte de Seu Filho, Deus nos fala. É por isso que esse sábado é também o mais eloqüente de todos os sábados. Ao silenciar perante a morte de Jesus, Deus revela o seu modo de agir para salvar a humanidade. É no silêncio do sepulcro, no dia de hoje, que o Pai, no Seu Filho, está salvando a humanidade. De que modo? Jesus desce à morada dos mortos, para de lá arrancar a humanidade morta pelos pecados.
E tudo isso Deus opera no silêncio. Jesus irá arrebentar as amarras da morte no silêncio da madrugada do Domingo de Páscoa. Ninguém saberá como isso aconteceu, apenas veremos o Ressuscitado. Deus age e sempre agirá assim.
E os cristãos verdadeiros, repletos do Espírito do Ressuscitado, agirão da mesma forma: no silêncio do sábado santo da vida cotidiana, trabalham pela redenção da humanidade, para que esta possa gozar das alegrias do Domingo da Páscoa definitiva na vida eterna.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

"Ele tomou sobre si as nossas enfermidades" - Sexta - Feira da Paixão do Senhor


Hoje, dentro do Solene Tríduo Pascal, a Igreja contempla o mistério da Paixão e Morte do Senhor. Não há missa, apenas se celebra a Paixão do Senhor, escutando sua Palavra, adorando a Sua Santa Cruz, comungando do Seu Corpo, com as hóstias consagradas na Missa Vespertina da Ceia do Senhor.
O servo do Senhor, anunciado por Isaías, assume a nossas enfermidades, sofrendo Ele mesmo as nossas dores (cf. Is 52,4) E o faz até o fim, até a morte e morte de cruz.
O mistério da nossa redenção não se tratou de uma encenação. O Filho de Deus, assumindo a nossa carne, viveu os dramas humanos, até o extremo, até o maior de todos eles: a morte física. A morte, consequência do pecado, alcança Aquele que não teve pecado. O Senhor Jesus hoje é ferido pela morte, e ferido de morte, é imagem de toda a humanidade chagada, desfigurada, sem aparência nem beleza.
Ao ser atingido pela morte, Jesus também é apresentado como paradigma da obediência a Deus, de um amor incondicional, de um amor concreto. Somente o amor fiel, somente o amor que faz da vida uma pró-existência até o extremo, pode redimir. É por isso que Ele se torna causa de salvação para todos aqueles que lhe assumem como modelo (cf. Hb 5,9).
Mas a morte de Jesus não é o ponto final no plano de salvação de Deus. A fidelidade a Deus nunca fica sem resposta. Jesus, como o grão de trigo caído na terra, será transfigurado, e, na potência do Espírito Santo, ressuscitará, sendo o primeiro de uma humanidade nova. Segundo a narração da Paixão segundo João, Jesus foi colocado em um túmulo novo, onde havia um jardim (cf. Jo19,41). Na criação, Adão foi plantado em um jardim, mas, por sua desobediência o perdeu. Pela obediência do novo Adão, Jesus Cristo, também plantado em um jardim, Deus fará brotar a nova criação, a nova humanidade obediente na obediência de Jesus.

Via Sacra - Meditação final

Depois de termos acompanhado o Senhor no seu caminho de sofrimento, no seu caminho de calvário, chegamos ao fim da caminhada, chegamos ao nosso destino, o destino de todo cristão: a cruz!
A cruz é a recompensa que o Senhor nos oferece por segui-Lo. Para a razão humana, isso pode parecer injusto e sem sentido. Perguntamo-nos: “Mas Senhor, é isso que recebemos, é isso que merecemos?” Sim... o verdadeiro discípulo, aquele que procura ser fiel e obediente, terá o mesmo destino do seu mestre. Não poderia ser diferente para nós, os cristãos, pois o nosso mestre, o Salvador da humanidade, sofreu injustamente pelos nossos pecados, e com o seu sofrimento nos libertou da escravidão.
Viver com Cristo é, antes de tudo, uma opção: “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sua cruz de cada dia e siga-me” (Lc 9,23). Ele nos convida e nos oferece uma vida nova, vida nova que brota de sua entrega na cruz. Ele nos transforma em homens novos.
Abracemos, portanto, a cruz de Cristo, que também é nossa, pois “Aquele que não toma sua cruz e não me segue não é digno de mim” (Mt 10,38), diz o próprio Senhor. O caminho da cruz é o mesmo que nos levará ao encontro de Cristo ressuscitado, vencedor da morte, o Cristo que nos comunica o dom da vida divina, que é viver no Espírito. A Páscoa de Cristo é também a nossa Páscoa.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim - Missa na Ceia do Senhor

Neste primeiro dia do Tríduo Pascal que começa na quinta-feira à tardinha com esta celebração, a Igreja faz memorial da entrega do Senhor, agora de forma incruenta e sacramental, e algumas horas mais tarde, na Nona Hora do dia, de forma cruenta na cruz. Mas é o mesmo sacrifício oferecido; o mesmo sacerdote que oferece; o mesmo altar no qual é oferecido; é Cristo. O que difere é a forma.
“Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que tinha chegado a sua hora, hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim. Foi durante a ceia.” Estas palavras do Evangelho desta missa introduzem-nos no sentido pleno de todo o mistério que celebramos no Sagrado Tríduo da Paixão e Ressurreição do Senhor.
A incrível realidade celebrada nesta Missa é expressa nas palavras da Consagração usadas no Cânon Romano: “Na noite em que ia ser entregue, para padecer pela salvação de todos, isto é, hoje, ele tomou o pão em sua as mãos, elevou os olhos a vós, ó Pai, deu graças e o partiu e deu a seus discípulos dizendo: Tomai todos, e comei: isto é o meu corpo, que será entregue por vós”. Neste hoje entramos, pela força do Espírito Santo, naquela ceia derradeira como se estivéssemos lá realmente. Por isso essa missa se diz “in Cena Domini”, na Ceia do Senhor. Nela, o Senhor Jesus entregou, no meio da ceia pascal judaica, o ritual para que se celebrasse o mistério de sua entrega ao Pai pelos homens e mandou que o celebrasse perpetuamente: “Fazei isto em memória de mim”, e como diz S. Paulo: “De fato, todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, estareis proclamando a morte do Senhor, até que ele venha” (1Cor 11,26).
O Evangelho, soleníssimo, nos relata o gesto de Jesus de lavar os pés dos discípulos. O próprio Senhor explica este gesto: “Se eu, o Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns aos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais assim como eu fiz para vós” (Jo 13,14-15). O gesto do lava-pés é, portanto, simbólico: ele serve para ilustrar aos discípulos o mandamento que o Senhor vai dar mais adiante: “Dou-vos um novo mandamento: Amai-vos uns aos outros. Como eu vos tenho amado, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 13,34; cf. 15,12). E “ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por seus amigos” (Jo 15,13). Assim, a maior prova de amor, o maior serviço, o maior lava-pés de Jesus é sua entrega na cruz. Neste sentido, o diálogo entre o Senhor e Pedro assume um sentido contundente: Pedro não deixar que o Senhor lhe lave os pés é o mesmo que não aceitar a morte de Jesus por ele e, em consequência, não ter parte com o Senhor pela ressurreição e vida nova. Assim, o Senhor faz entender a Pedro que aceitar com fé o sacrifício, o serviço, o lava-pés de Jesus, é condição sem a qual não é possível participar da morte e da ressurreição do Senhor.
Coloquemo-nos com humildade diante do Senhor que foi humilde para conosco, para que Ele, vindo Ressuscitado nesta Páscoa que se aproxima, nos faça participar da sua realeza já agora, nesta vida, e na vida no mundo que virá.

terça-feira, 7 de abril de 2009

O cristão e angústia – VIII

Aquele que caminha tem um terreno debaixo dos pés. Fé, esperança e caridade são precisamente o terreno firme oferecido ao homem para caminhar. Nem mesmo no parêntesis entre o pecado (que rejeita este terreno para estar sobre o próprio) e o retorno a Deus no arrependimento, se dá cristãmente falando, uma perda total deste terreno. Quem crê, quem se agarra solidamente à fé, anda para diante, e, enquanto avança, não pode pôr-se a filosofar sobre a possibilidade desse avanço, não pode refletir em si mesmo a própria passagem para Deus e ao mesmo tempo realizá-la. Isto sim, seria uma contradição, e semelhantes reflexões não poderiam gerar senão outras contradições e jogos dialéticos. Desde que há a possibilidade, de um ponto de vista cristão, da passagem para Deus – e Deus concede-a como graça – a passagem, sempre em linguagem cristã, não é tarefa que nos deva preocupar.

O homem não deve pensar senão em avançar, visto que Deus cuida previamente de tornar-lhe possível o avanço, resolveu o problema do continuum, e todos os paradoxos do espaço espiritual, incluindo o de Aquiles e a tartaruga, estão ultrapassados. A má consciência, e, por conseguinte, a angústia que atormenta muitos cristãos, não deriva tanto do fato de serem pecadores e reincidentes, mas de que cessaram de crer na eficácia e na verdade da sua fé; medem a força da fé pela própria impotência, projetando o mundo de Deus na própria psicologia, em vez de se deixarem medir por Deus. Fazem o que, como cristãos, lhes é proibido: consideram a fé de fora, desesperam da força da esperança, fecham-se ao poder do amor, instalam-se na vala que se forma entre a exigência cristã e a sua falência, vala que, em termos cristãos, é domínio do nada. Não é, pois, de admirar que, numa tal posição, a angústia se apodere deles. (...)

Estas linhas de pensamentos [a visão da angústia segundo a dialética oscilante de Lutero, que não admite nem uma verdadeira emancipação da angústia do pecado, nem uma autêntica participação na angústia da cruz do Senhor e a consequente linha que segue Kierkergaard, a visão da predestinação de Calvino e a da finitude da redenção de Jansênio] estão interditas ao católico. Não lhe é lícito recorrer a uma dialética, seja qual for, para tranquilizar aquele que se desesperasse ou duvidasse da sua verdadeira passagem para Deus: ele não tem de fazer mais do que indicar-lhe a fé viva como sendo o ato da passagem. A isto tendem, no fundo, também as duas formas de protestantismo, mas a vertigem provocada pela reflexão impede o elemento de presença de produzir o seu efeito ao mesmo tempo que o elemento escatológico. O católico não pode limitar-se a considerar a redenção como um fato objetivo, consumado na cruz e do qual basta que o crente tome conhecimento para beneficiar-se de seus efeitos. Pelo contrário, ele sabe que a redenção para se tornar subjetiva exige participação e apropriação; por isso o caminho da angústia do pecado para uma angústia redentora é, para ele, um verdadeiro progredir. Se ele se vira para esta última, não pode deixar a primeira atrás de si. Se se aproxima desta, afasta-se da outra. E entre as duas estende-se necessariamente uma zona de isenção da angústia, caracterizada pelo resplendor da fé, da caridade e da esperança.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Da imersão na morte à emersão para a vida

Estamos potencialmente mergulhados na morte. E esta é a mais terrível de todas as mortes, pois é aniquilação do que nos é mais valioso, nosso próprio ser. A clarividência de que o homem é um ser espiritual e que está destinado a evoluir em sua espiritualidade, se encontra em todas as tradições religiosas. A espiritualidade se apresenta como algo intrínseco e próprio ao ser humano. Este não é somente corporeidade. E se assim o fosse, não viveria de verdade, mas apenas vegetaria. Nós cristão, cremos nisso. Que o próprio Deus da paz vos santifique totalmente, e que tudo aquilo que sois – espírito, alma, corpo –. (1Ts 5,23). Por isso, se afirma de forma unânime que há, na pessoa, uma dimensão que a distingue de todos os outros animais. A saber, a dimensão espiritual. Esta corresponde à dimensão mais nobre, pois ela identifica o homem consigo mesmo que, simultaneamente, se percebe como ser existente. Em outras palavras, a dimensão espiritual torna o homem consciente de seu próprio ser. Nesta consciência ele se percebe tal como ele é, homem, criatura. E consciente de si mesmo se torna um ser responsável. Percebe- se assim, que a existência no seu sentido pleno, só é de fato, existência, sob a óptica espiritual. Assim, só há existência se houver uma espiritualidade, de forma que, na ausência desta, aquela se extingue. É aniquilada. Por isso, a firmação “estamos mergulhados na morte”. Mas, em que sentido?
Começamos a mergulhar na morte quando começamos a viver. Nesse sentido, viver está estritamente ligado ao conceito de vida medíocre que temos, no qual a vida se resume em força física e atividade. Dessa forma, “matamos” o que temos de melhor, nosso espírito e, conseqüentemente, morremos com ele. No nosso agir cotidiano temos muitos tipos de preocupações: estudo, trabalho, lazer, “tenho que fazer isso, aquilo...”. Estas ações estão ligadas, de certa forma, somente a nossa dimensão física. No entanto, mergulhados nosso corpo esquecemos nosso espírito e, ao poucos, esquecemos nós mesmos. E nos matamos a cada dia. Mas, o espírito é vida e a vida não morre. E mesmo que não tenhamos consciência, a dimensão que aniquilamos, aguarda o nosso sim à vida de verdade, para ela possa emergir da profundeza do ser da pessoa. Contudo, para que essa nobilíssima dimensão nos venha à tona, devemos ir onde ela está adormecida. Para que ela emirja à nossa consciência devemos imergir a profundeza de nosso próprio ser. Quando isso acontece nos deparamos com a nossa verdadeira realidade e identidade. Deparamos-nos com nosso próprio “eu real” tal e qual, na perfeita realidade, livre de ilusões e auto-afirmações de nós mesmos. Encontramo-nos como Deus encontrou nossos primeiros pais depois deles terem pecado: nus e totalmente humanos necessitados da graça de Deus, tal como eles eram, criaturas. Essa auto-percepcão nos é concedida por Deus a fim de nos mostrar quem realmente somos.
É a partir da descoberta dessa nossa dimensão – a espiritual – que começamos a evoluir espiritualmente. Pois, é nela que nos vemos como somos. Mas, o elemento que é a chave para uma verdadeira espiritualidade, além dessa descoberta, é aceitação de nós mesmos como somos de fato. Do que serviria nos conhecermos no mais alto grau, senão nos aceitássemos a nós mesmos com nossas capacidades e incapacidades e limitações? Mas não esqueçamos de que nesta vida, a morte que nos assalta é potencial. Eis que virá o dia, a hora e o “lugar” onde a potência se tornará ato. E em ato já não será a morte, mas vida e vida no sentido pleno. E a morte será de uma vez por todas aniquilada. Pois, Cristo disse: Ó morte eu serei a tua morte.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

XIV Estação: Jesus é depositado no sepulcro

-Nós vos adoramos Senhor Jesus Cristo e vos bendizemos!
- Porque pela vossa Santa Cruz remistes o mundo!

Mc 15,46-47

Deus em sua condição humana morreu e morreu numa cruz. Sendo descido dela, o corpo de Jesus é acolhido por sua mãe de coração trespassado de dor. É dos braços de Maria que os discípulos recebem o corpo do salvador da humanidade decaída. Com grande e verdadeira piedade, os discípulos, Madalena e Maria, a Mãe de Jesus, acompanhados por outras pessoas, seguiram o cortejo ao calvário. Foi num fim de tarde de sexta-feira. O corpo foi perfumado, coberto com um lençol e envolto de faixas, como era de costume judeu. Um homem de bom coração, José de Arimatéia, cedeu o túmulo que havia preparado para sua família. E sepultaram Jesus. Maria, beijando seu Filho pela última vez, vê o túmulo sendo fechado. Que grande dor!
Eis que a mãe, os discípulos e amigos de Cristo se depararam com o mistério da morte, que causa dor! Diante disso, seus corações são invadidos e tomados por grande tristeza e atordoamento. Como viver sem Aquele que se disse ser a vida? Como poderia a Vida morrer? Certamente eles ficaram, por instantes, atordoados. No entanto, eles tinham fé na promessa de Cristo e, por isso, viveram na esperança da eternidade e no amor a Cristo e ao próximo. Na fé, esperança e amor eles compreenderam que não iriam viver sozinhos e que a Vida não morreu. Mas, compreenderam que o caminho de Cristo deve ser os seus. E eles entenderam a afirmação de próprio Cristo: Se o grão de trigo cair no chão e não morrer ele permanece só, mas se morrer produzirá, a seu tempo, muito fruto”.
A vida de verdade humanamente plena nos é dada quando morremos para nós mesmos. E isso Cristo nos mostrou com seu testemunho sendo obediente a vontade do Pai até a morte e morte de cruz. Morrendo para nós, viveremos para Deus pela ação do Espírito Santo. Jesus viveu e morreu neste mundo para nos salvar e nos mostrar como devemos viver, enquanto somos peregrinos aqui na terra. Para chegarmos à vida ele nos mostrou o caminho. Qual é o caminho? O próprio Cristo. E Ele disse: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai, senão por mim”.

Oração: Ó Deus, que enviando vosso Filho unigênito ao mundo, nos tornastes participantes de vossa natureza divina, e Nele nos deixastes o modelo de santidade, fazei que, unindo-nos a Ele morto e sepultado, mereçamos ressurgir com Ele, pela ação do Espírito Santo, para uma vida nova. Amém.

Pai-nosso...

quarta-feira, 1 de abril de 2009

O cristão e a angústia - VII

Uma primeira lei sobre a angústia cristã poder-se-ia, pois, formular como se segue:
O Cristianismo quer e pode redimir o homem da angústia do pecado, se o homem se abre à redenção e se submete às suas condições; em lugar da angústia do pecado, ele dá-lhe acesso a Deus sem angústia, na fé, na caridade e na esperança; as quais, porém, derivando da cruz, podem por si mesmas provocar uma nova, carismática, coexpiante forma de angústia, no âmbito da solidariedade universal.
Com esta primeira verdade, simples e linear, cruza-se, porém, uma outra que ameaça velar-lhe a pureza. Para o filho de Deus, crucificado, sem pecado, a oposição da angústia redentora à angústia do pecado (infrutífera, que Ele não pode experimentar) é coisa óbvia. Pode-se também chegar a compreender que algo desta angústia redentora possa ser comunicado a um crente pela graça superabundante da cruz. Mas os cristãos, ainda que remidos e crentes, amantes e esperançados, não continuarão, apesar disso, sempre pecadores?; seja porque caiam em pecado grave, prevaricando com isso – segundo a ameaça do Apóstolo – de um modo muito mais terrível do que um pagão que não sabe (Hb 6,3-8); seja porque se debatem na penumbra, entre o amor e a concupiscência , entre a esperança e a dúvida, sem uma direção fundamental definida; como “almas salvas pela metade”, que merecem a qualificação tanto de “pecadores” como de “justos”? É claro que um homem não pode possuir a graça santificante e ao mesmo tempo odiar a Deus, no sentido em que Lutero ou o catecismo de Heidelberg interpretaram o simul justus et peccator. Mas quanto de verdade não contém ainda esta definição, como muito bem deveriam saber todos aqueles que são fracos, desencaminhados, que recaem sempre, tépidos, surdos aos mandamentos de Deus!
E nesta tepidez que se mantém à força de compromissos, não serão assaltados por uma nova, bem compreensível todavia unicamente ao cristão, ou seja: a angústia de verificar que é impossível estar “ao mesmo tempo dentro e fora” ou, pior, “nem dentro nem fora”? Não é esta exatamente a específica angústia cristã, ou, ao menos, aquela que com maior frequência se encontra e que, pela sua ambiguidade, mais desagradavelmente impressiona os estranhos, os pagãos, neste ponto mais inequívocos, menos decididos? Se “estes redimidos têm um ar tão pouco redimido”, se os cristãos não convencem, isto deve atribuir-se, e não em último lugar, à sua falta de segurança, produzida pela consciência de fazer mal as suas coisas, de representar tão mal a sua causa, ou , o que é ainda mias lamentável, ao medo de que se descubra que não são de modo algum o que pretendem ser.
Recai-se assim, de certo modo, na angústia da Antiga Aliança. Nela a angústia era superada graças a uma promessa; mas, uma vez que tal promessa não era atual, não tinha força para arrancar completamente os homens à angústia do pecado. Este estar suspenso entre o presente pecaminoso e a promessa que não podia ser nunca plenamente atualizada provocava uma nova forma de angústia. O mesmo parece repetir-se em plena Nova Aliança: na medida em que a redenção já vinda conserva um caráter escatológico e o pecador permanece a caminho da plena justiça; na medida em que não se dissipa nunca a ambiguidade entre “temor e esperança”, ou melhor, entre o medo que o pecador tem de Deus e da condenação divina e a esperança do crente na redenção. Não favorece o Novo Testamento esta ambiguidade enquanto acentua e torna definitivos os dois aspectos, tanto a promessa como a ameaça? Mas ao fazer isto, e ao submeter o homem que se encontra dentro do seu campo de força a tensões sobre-humanas – temer e esperar, estar certo e suspenso ao mesmo tempo – não pediu ele demasiado às nossas pobres forças, que como que são por ele fulminadas? Pode viver-se dentro desta contradição? Os muitos desvios e deformações não vêm comprovar que se exigem aqui ao homem coisas impossíveis? Não se perde o cristão, quando trata a sério com o pecado e com a redenção, numa dialética sem saída, em que cada grau a mais de graça corresponde um grau a mais de indignidade e culpa, e a religião nesta selva obscura se torna um verdadeiro inferno? E não tem precisamente aqui a mais impiedosa psicanálise um campo favorável?
Que o homem, ainda que crente, possa ser tomado de uma espécie de vertigem nesta situação transitória entre medo e esperança, é um fato inegável, confirmado pela experiência de todos os dias. Este sentir faltar o terreno debaixo dos pés, porém, não se pode imputar ao Cristianismo mas tão-somente ao homem que não quer tomar verdadeiramente a sério o Cristianismo. O Cristianismo não cava diante do homem um abismo, mas, ao contrário, oferece-lhe um terreno sólido; este terreno porém está em Deus, não no próprio homem, e o acesso a ele implica que o homem abandone o seu próprio terreno. O pecador é exatamente aquele que quer estar em si mesmo e sobre Deus ao mesmo tempo, acaba por cair num vazio intermediário. Verificar (ou mesmo apenas sentir) que se está sem terreno debaixo dos pés, pressupõe que se deixou de caminhar; de caminhar no terreno de Deus ou de efetuar a passagem do próprio terreno para o terreno de Deus. A fé, se é viva e operante, não é mais do que um caminhar, passar de um a outro ponto.

Apascentar em Cristo

“Apascentar em Cristo”. Com este lema Pe. Henrique Soares da Costa iniciou sue ministério sacerdotal em 15 de agosto de 1992. Nesses quase 17 anos de sacerdócio esse lema tornou-se o seu jeito de ser padre, um pastor segundo o coração do próprio Cristo.
Seu pastoreio sempre foi intenso: professor do seminário e de institutos teológicos, pregador de retiros, capelão do Mosteiro das Servas da Ss. Trindade de Rovigo, reitor da Igreja Nossa Senhora do Livramento, a pérola de seu ministério, segundo ele mesmo costumava afirmar.
Em todas essas atividades, pe. Henrique fez das palavras do apóstolo, “o que se espera dos administradores é que sejam fiéis” (1Cor 4,2) uma realidade concreta. No seu trabalho pastoral buscou sempre ser fiel à ortodoxia da fé e da liturgia, frequentemente vilipendiada.
Receba hoje a nossa gratidão por sua colaboração como professor e como formador do nosso seminário. Sua nomeação como bispo auxiliar de Aracaju enobrece a nossa Igreja de Maceió e o clero diocesano. Deus lhe abençoe nessa nova missão!

XIII Estação: Jesus é descido da cruz e entregue à sua Mãe


- Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo e vos bnedizemos!
- Porque pela vossa Santa Cruz remistes o mundo!

Mc 15, 42-43.46

Na noite de Natal contemplamos a Virgem embalando em seus braços o corpo recém-nascido do Verbo feito carne em seu seio. Agora Maria recebe em seus braços o mesmo corpo, desfigurado, sem aparência humana. Imaginemos o turbilhão de imagens que povoaram os pensamentos da Virgem Mãe: a lembrança do seu sim, a promessa de que o menino concebido seria grande, seria chamado filho do Altíssimo e Deus lhe daria o trono de Davi (cf. Lc 1,32). E eis agora o rei humilhado, escarnecido, morto. Mas Maria não perde sua fé, em nenhum momento considera a possibilidade de Deus ter falhado na sua promessa e seu sim ter sido inútil. Ela simplesmente faz aquilo que todo cristão deve fazer: guarda, como sempre fez, todos esses eventos em seu coração, meditando-os. Ou seja: Maria interpreta os fatos de sua vida na relação com Deus, buscando ver tudo pelos olhos da fé. E a fé de Maria não lhe deixará sem resposta. Sua fé lhe encherá de alegria quando encontrar seu Filho ressuscitado, pleno do Espírito Santo. Podemos até imaginar as palavras de Jesus dirigidas à sua mãe, e que servem para todos nós: “Vê mãe, crer vale a pena, quem diz sim é capaz de se doar por amor até a morte, redime o mundo, vencendo os poderes do mal, vencendo até a morte.”

Oração: Senhor Jesus, ao contemplar-vos massacrado e entregue à vossa Mãe, pedimo-vos a força de também sermos fiéis no nosso sim até a morte. Somente assim, morrendo como o grão de trigo, poderemos participar de vossa redenção, produzindo frutos para a vida eterna. Amém.