sexta-feira, 14 de setembro de 2012

A Cruz, mistério e caminho de salvação


A Igreja celebra hoje a Festa da Exaltação da Santa Cruz. O que dizer, pois, do “culto” da Igreja à Cruz do Senhor? Em primeiro lugar, não se trata de culto ao objeto em si, ao madeiro da Cruz, mas ao mistério que ela não apenas representa, mas efetua em si. É na morte de Jesus na Cruz que se consuma a nossa salvação (cf. Jo 19,30). Por isso, a Igreja proclama: “Nós vos adoramos, Senhor Jesus Cristo e vos bendizemos, porque pela vossa Santa Cruz remistes o mundo”. A Cruz é, portanto, o instrumento da nossa salvação, o meio pelo qual fomos salvos.
A Cruz é o altar do Cristo-Rei. Aquele que será elevado para a salvação do mundo, como outrora foi a serpente no deserto, é o que será o caminho de salvação para quantos creem nele. (cf. Jo 3,14-15; Nm 21,4-9). “Quando tiverdes elevado o Filho do Homem, então sabereis que Eu Sou” (Jo 8,27). Este trono do Rei dos reis que é a Cruz confunde os homens: aos que pensavam num reino esplendoroso, num reino glorioso, vemos um rei humilde, que vem montado num jumento e cuja coroa é de espinhos. O trono... a Cruz. Este trono, ainda hoje, é escândalo para muitos. Ainda hoje, com as devidas emendas, manifesta-se o que São Paulo disse a respeito: “A linguagem da Cruz é loucura para aqueles que se perdem, mas para aqueles que se salvam, para nós, é poder de Deus. (...) Os judeus (e, hoje, tantos protestantes ou alguns católicos protestantizados, que só falam em milagres, milagres, milagres) pedem sinais, e os gregos (hoje os ateus e agnósticos, embora raramente) andam em busca de sabedoria; nós, porém, anunciamos a CRISTO CRUCIFICADO, que para os judeus (e afins) é escândalo, para os gentios (e afins) é loucura, mas para aqueles que são chamados, tanto judeus quanto gregos, é Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus” (1Cor 1,18.22-24).
A Cruz é o símbolo que condensa o seguimento do fiel em Cristo. “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia e siga-me” (Lc 9,23). A nossa cruz pessoal, DE CADA DIA, é participação na Cruz de Jesus, de forma que nós completamos na nossa carne, isto é, na nossa existência humana, o que faltou à Paixão de Cristo (cf. Cl 1,24). Efetivamente, a cruz na nossa vida significa as dificuldades, os sofrimentos. “É preciso passar por muitas tribulações para entrar no Reino de Deus” (At 14,22). Assim exorta São Paulo a Timóteo: “Assume a tua parte de sofrimento como bom soldado de Cristo Jesus” (2Tm 2,3). E prossegue: “Lembra-te de Jesus Cristo, ressuscitado dentre os mortos, da descendência de Davi (...). Fiel é esta palavra: Se com Ele morremos, com ele viveremos. Se com Ele sofremos, com ele reinaremos” (2Tm 3,8.11-12a).
Diante de tudo isso, santificamos as palavras irônicas de Tomé aos Apóstolos: “Vamos também nós, para morrermos com Ele!” (Jo 11,16). Sim, tomemos nossa cruz, nossa cruz de cada dia e sigamos ao Senhor, que se dirige a Jerusalém para morrer. Não é preciso procurar o sofrimento: ele é inevitável. Ele vem cada dia; de diversas formas ele bate à nossa porta. Não desanimemos nem rejeitemos o sofrimento: como Jesus, que abraçou a sua Cruz por amor a nós, também abracemos nossa cruz por amor a Jesus e com Ele prossigamos o caminho da nossa vida, unidos a Ele. Não tem jeito: ou sofremos com Jesus ou sem Ele. Tertium non datur, não há outra opção. A cruz é o caminho impreterível e único para a salvação. Não se poderá salvar quem rejeita a cruz. Isso nos garante o próprio Salvador: “Pois aquele que quiser salvar sua vida a perderá, mas o que perder sua vida por causa de mim, a salvará” (Lc 9,24).

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

O Cristianismo e a salvação

O Cristianismo (...) não se afirma simplesmente como continuação da história de Israel ou como simples retomada de sua trajetória, mas como a realização das promessas anunciadas pelos profetas e como a inauguração dos tempos últimos da salvação. Cristo constitui a ação decisiva de Deus na história, ação que muda “uma vez para sempre” o sentido da condição humana e traz novidade que, a partir daí, torna-se absolutamente adquirida: ninguém poderá mais separar a união da natureza humana com a natureza divina realizada em Cristo. E ninguém mais poderá cancelar a redenção que ele já adquiriu para todos. Não é mais possível qualquer recaída. No plano objetivo, a humanidade já está irrevogavelmente salva. Resta apenas fazer todos os homens participarem daquilo que foi realizado uma vez por todas em Cristo: agora, cada homem decide o sentido de sua própria existência e de sua própria eternidade em função da acolhida ou da rejeição desse mistério de salvação operado na história. Em Cristo, tem-se o evento que introduz mudança qualitativa na história do mundo, a tal ponto definitiva que não se pode mais voltar atrás. Tudo isso impede de fazer do cristianismo uma espécie de gnose ou concepção do mundo ideal, mais ou menos fora das realidades humanas e às quais viria como que sobrepor por fora. O cristianismo não nasce de um sistema filosófico ou de um conjunto de verdades abstratas, mas de um evento, único e irrepetível, determinado e determinável no espaço e no tempo, embora absolutamente transcendente.
A fé cristã representa a afirmação de que o mistério da salvação há séculos esperado já se cumpriu em Cristo, nada mais havendo agora a esperar senão sua extensão à humanidade inteira e sua manifestação visível com a escatologia definitiva.

Carlo Rocchetta, Os Sacramentos da fé, Paulinas, p. 34-5.