segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Santo André Apóstolo e Mártir

Das catequeses de Bento XVI

Nas últimas duas catequeses falámos da figura de São Pedro. Agora queremos, na medida em que as fontes o permitem, conhecer mais de perto também os outros onze Apóstolos. Portanto, falamos hoje do irmão de Simão Pedro, Santo André, também ele um dos Doze. A primeira característica que em André chama a atenção é o nome: não é hebraico, como teríamos pensado, mas grego, sinal de que não deve ser minimizada uma certa abertura cultural da sua família. Estamos na Galileia, onde a língua e a cultura gregas estão bastante presentes. Nas listas dos Doze, André ocupa o segundo lugar, como em Mateus (10, 1-4) e em Lucas (6, 13-16), ou o quarto lugar como em Marcos (3, 13-18) e nos Actos (1, 13-14). Contudo, ele gozava certamente de grande prestígio nas primeiras comunidades cristãs.
O laço de sangue entre Pedro e André, assim como a comum chamada que Jesus lhes faz, sobressaem explicitamente nos Evangelhos. Neles lê-se: "Caminhando ao longo do mar da Galileia, Jesus viu os dois irmãos: Simão, chamado Pedro, e seu irmão André, que lançavam as redes ao mar, pois eram pescadores. Disse-lhes: "Vinde comigo e Eu farei de vós pescadores de homens"" (Mt 4, 18-19; Mc 1, 16-17). Do Quarto Evangelho tiramos outro pormenor: num primeiro momento, André era discípulo de João Baptista; e isto mostra-nos que era um homem que procurava, que partilhava a esperança de Israel, que queria conhecer mais de perto a palavra do Senhor, a realidade do Senhor presente. Era verdadeiramente um homem de fé e de esperança; e certa vez, de João Baptista ouviu proclamar Jesus como "o cordeiro de Deus" (Jo 1, 36); então ele voltou-se e, juntamente com outro discípulo que não é nomeado, seguiu Jesus, Aquele que era chamado por João o "Cordeiro de Deus". O evangelista narra: eles "viram onde morava e ficaram com Ele nesse dia" (Jo 1, 37-39). Portanto, André viveu momentos preciosos de familiaridade com Jesus.
A narração continua com uma anotação significativa: "André, o irmão de Simão Pedro, era um dos dois que ouviram João e seguiram Jesus. Encontrou primeiro o seu irmão Simão, e disse-lhe: "Encontramos o Messias" que quer dizer Cristo. E levou-o até Jesus" (Jo 1, 40-43), demonstrando imediatamente um espírito apostólico não comum. Portanto, André foi o primeiro dos Apóstolos a ser chamado para seguir Jesus. Precisamente sobre esta base a liturgia da Igreja Bizantina o honra com o apelativo de Protóklitos, que significa exactamente "primeiro chamado". E não há dúvida de que devido ao relacionamento fraterno entre Pedro e André a Igreja de Roma e a Igreja de Constantinopla se sentem irmãs entre si de modo especial. Para realçar este relacionamento, o meu Predecessor, o Papa Paulo VI, em 1964, restituiu as insignes relíquias de Santo André, até então conservadas na Basílica Vaticana, ao Bispo metropolita Ortodoxo da cidade de Patrasso na Grécia, onde segundo a tradição o Apóstolo foi crucificado.
As tradições evangélicas recordam particularmente o nome de André noutras três ocasiões, que nos fazem conhecer um pouco mais este homem. A primeira é a da multiplicação dos pães na Galileia. Naquele momento foi André quem assinalou a Jesus a presença de um jovem que tinha cinco pães de cevada e dois peixes: era muito pouco observou ele para todas as pessoas reunidas naquele lugar (cf. Jo 6, 8-9). Merece ser realçado, neste caso, o realismo de André: ele viu o jovem portanto já se tinha perguntado: "mas o que é isto para tantas pessoas?" (ibid.) mas apercebeu-se da insuficiência dos seus poucos recursos. Contudo, Jesus soube fazê-los bastar para a multidão de pessoas que vieram ouvi-lo. A segunda ocasião foi em Jerusalém. Saindo da cidade, um discípulo fez notar a Jesus o espectáculo dos muros sólidos sobre os quais o Templo se apoiava. A resposta do Mestre foi surpreendente: disse que não teria ficado em pé nem sequer uma pedra daqueles muros. Então André, juntamente com Pedro, Tiago e João, interrogou-o: "Diz-nos quando tudo isto acontecerá e qual o sinal de que tudo está para acabar" (Mc 13, 1-4).
Para responder a esta pergunta Jesus pronunciou um importante discurso sobre a destruição de Jerusalém e sobre o fim do mundo, convidando os seus discípulos a ler com atenção os sinais do tempo e a permanecer sempre vigilantes. Podemos deduzir deste episódio que não devemos ter receio de fazer perguntas a Jesus, mas ao mesmo tempo devemos estar prontos para receber os ensinamentos, até surpreendentes e difíceis, que Ele nos oferece.
Por fim, nos Evangelhos está registrada uma terceira iniciativa de André. O Cenário ainda é Jerusalém, pouco antes da Paixão. Para a festa da Páscoa narra João tinham vindo à cidade santa alguns Gregos, provavelmente prosélitos ou tementes a Deus, que vinham para adorar o Deus de Israel na festa da Páscoa. André e Filipe, os dois apóstolos com nomes gregos, servem como intérpretes e mediadores deste pequeno grupo de Gregos junto de Jesus. A resposta do Senhor à sua pergunta parece como muitas vezes no Evangelho de João enigmática, mas precisamente por isso revela-se rica de significado. Jesus diz aos dois discípulos e, através deles, ao mundo grego: "Chegou a hora de se revelar a glória do Filho do Homem. Em verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica ele só; mas, se morrer, dá muito fruto" (12, 23-24).
O que significam estas palavras neste contexto? Jesus quer dizer: sim, o encontro entre mim e os Gregos terá lugar, mas não como simples e breve diálogo entre mim e algumas pessoas, estimuladas sobretudo pela curiosidade. Com a minha morte, comparável à queda na terra de um grão de trigo, chagará a hora da minha glorificação. A minha morte na cruz originará grande fecundidade: o "grão de trigo morto" símbolo de mim crucificado tornar-se-á na ressurreição pão de vida para o mundo; será luz para os povos e para as culturas. Sim, o encontro com a alma grega, com o mundo grego, realizar-se-á naquela profundidade à qual faz alusão a vicissitude do grão de trigo que atrai para si as forças da terra e do céu e se torna pão. Por outras palavras, Jesus profetiza a Igreja dos gregos, a Igreja dos pagãos, a Igreja do mundo como fruto da sua Páscoa.
Tradições muito antigas vêem em André, o qual transmitiu aos gregos esta palavra, não só o intérprete de alguns Gregos no encontro com Jesus agora recordado, mas consideram-no como apóstolo dos Gregos nos anos que sucederam ao Pentecostes; fazem-nos saber que no restante da sua vida ele foi anunciador e intérprete de Jesus para o mundo grego. Pedro, seu irmão, de Jerusalém, passando por Antioquia, chegou a Roma para aí exercer a sua missão universal; André, ao contrário, foi o apóstolo do mundo grego: assim, eles são vistos, na vida e na morte, como verdadeiros irmãos uma irmandade que se exprime simbolicamente no relacionamento especial das Sedes de Roma e de Constantinopla, Igrejas verdadeiramente irmãs.
Uma tradição sucessiva, como foi mencionado, narra a morte de André em Patrasso, onde também ele sofreu o suplício da crucifixão. Mas, naquele momento supremo, de modo análogo ao do irmão Pedro, ele pediu para ser posto numa cruz diferente da de Jesus. No seu caso tratou-se de uma cruz decussada, isto é, cruzada transversalmente inclinada, que por isso foi chamada "cruz de Santo André". Eis o que o Apóstolo dissera naquela ocasião, segundo uma antiga narração (início do século VI) intitulada Paixão de André: "Salve, ó Cruz, inaugurada por meio do corpo de Cristo e que se tornou adorno dos seus membros, como se fossem pérolas preciosas. Antes que o Senhor fosse elevado sobre ti, tu incutias um temor terreno. Agora, ao contrário, dotada de um amor celeste, és recebida como um dom. Os crentes sabem, a teu respeito, quanta alegria possuis, quantos dons tens preparados. Portanto, certo e cheio de alegria venho a ti, para que também tu me recebas exultante como discípulo daquele que em ti foi suspenso... Ó Cruz bem-aventurada, que recebestes a majestade e a beleza dos membros do Senhor!... Toma-me e leva-me para longe dos homens e entrega-me ao meu Mestre, para que por teu intermédio me receba quem por ti me redimiu. Salve, ó Cruz; sim, salve verdadeiramente!".
Como se vê, há aqui uma profundíssima espiritualidade cristã, que vê na Cruz não tanto um instrumento de tortura como, ao contrário, o meio incomparável de uma plena assimilação ao Redentor, ao grão de trigo que caiu na terra. Nós devemos aprender disto uma lição muito importante: as nossas cruzes adquirem valor se forem consideradas e aceites como parte da cruz de Cristo, se forem alcançadas pelo reflexo da sua luz. Só daquela Cruz também os nossos sofrimentos são nobilitados e adquirem o seu verdadeiro sentido.
Portanto, o apóstolo André ensina-nos a seguir Jesus com prontidão (cf. Mt 4, 20; Mc 1, 18), a falar com entusiasmo d'Ele a quantos encontramos, e sobretudo a cultivar com Ele um relacionamento de verdadeira familiaridade, bem conscientes de que só n'Ele podemos encontrar o sentido último da nossa vida e da nossa morte.

domingo, 29 de novembro de 2009

Ave Maria, por Giovanni Vianinni

Caríssimos, um singelo presente de fim de domingo para vocês. Ave Maria, por Giovanni Vianinni. Saudemos a Mãe de Deus com filial devoção e roguemos a ela que interceda por nós agora, neste Advento e na hora de nossa morte, quando entregarmos nossa alma a Cristo seu Filho e nosso Deus.

A vossa libertação está próxima - I Domingo do Advento

Os trechos da Palavra de Deus que a Igreja nos propõe neste primeiro Domingo do Advento falam da segunda vinda de Jesus. Deus foi paulatinamente revelando ao povo de Israel o seu desígnio de salvação: haveria um dia em que o seu povo seria salvo definitivamente, um momento em que a história humana chegaria ao seu zênite e onde todas coisas teriam a sua finalidade. Este dia final, chamado Dia do Senhor pelos profetas, é dia de salvação para o seu povo e dia de perdição para os que rejeitaram a Deus e viveram fora do seu amor. Vejamos, portanto, esses dois aspectos do desenlace escatológico da história humana.
Em primeiro lugar, o Dia do Senhor é dia de salvação para seus fiéis, aqueles que permanecem n’Ele, em Seus Mandamentos, dia em que ele cumprirá plenamente as promessas de felicidade eterna que fez a seus amados ao enviar o seu Messias, que resgatará e salvará os que são do povo de Deus. É o que diz o profeta Jeremias na primeira leitura da Solene Liturgia de hoje: “Naqueles dias, naquele tempo, farei brotar de Davi a semente da justiça, que fará valer a lei e a justiça na terra. Naqueles dias, Judá será salvo e Jerusalém terá uma população confiante; este é o nome que servirá para designá-la: ‘O Senhor é a nossa justiça’”. No entanto, percebemos que muitos dos que possuem o nome de cristãos não vivem segundo aquilo que são, renascidos na água e no Espírito Santo, mas vivem de modo que desagrada ao Senhor, desprezando os seus mandamentos, não aceitando que Deus seja realmente Deus em suas vidas, mas divinizando a si mesmo ou outras pessoas ou coisas, elevando-as à condição de critério absoluto da vida. Eis, portanto, o critério para se saber quem será salvo, ou seja, quem pertencerá ao número dos eleitos: o critério é guardar os mandamentos de Deus, porque, assim nos diz São João em sua primeira Epístola (2,3-6): “Eis como sabemos que o conhecemos: se guardamos os seus mandamentos. Aquele que diz conhecê-lo e não guarda os seus mandamentos é mentiroso e a verdade não está nele. Aquele, porém, que guarda a sua palavra, nele o amor de Deus é verdadeiramente perfeito. É assim que conhecemos se estamos nele: aquele que afirma permanecer nele deve também viver como ele viveu”. Viver nos mandamentos de Deus, guardar a sua Palavra, é praticar as boas obras; assim, rezamos na oração da coleta para que sejamos achados, diante de Cristo, com as mãos cheias destas boas obras.
O Evangelho nos mostra a outra realidade deste dia da Parusia, ou seja, da manifestação do Senhor. Esta será aterrorizante e catastrófica para os ímpios: “Haverá sinais no sol, na lua e nas estrelas. Na terra, as nações ficarão angustiadas, com pavor do barulho do mar e das ondas. Os homens vão desmaiar de medo, só em pensar no que vai acontecer ao mundo, porque as forças do céu serão abaladas” (Lc 21,25-26). E o Senhor nos convida à vigilância, advertindo contra os perigos e tentações que advém neste e deste mundo e que nos podem fazer temer o dia do juízo: “Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse dia não caia de repente sobre vós; pois esse dia cairá como uma armadilha sobre todos os habitantes de toda a terra. Portanto, ficai atentos e orai a todo momento, a fim de terdes força para escapar de tudo o que deve acontecer e para ficardes em pé diante do Filho do Homem” (Lc 21,34-36).
O dia do juízo acontecerá realmente um dia, o qual, porém, ninguém sabe, nem compete a nós sabê-lo. Entretanto, estejamos preparados, porque mesmo que nós não vejamos esse dia ele indubitavelmente ocorrerá no momento de nossa morte. E, pelo jeito com que vivermos neste mundo, procurando fazer as obras de Deus ou não, iremos recebê-lo ou com a cabeça erguida porque vem a nossa salvação, ou com pavores e desmaios se formos indignos.

sábado, 28 de novembro de 2009

O tempo do Advento

Mais uma vez começa o tempo do Advento, tempo de silenciosa e alegre espera do Senhor que vem para cumprir suas promessas.
O início do Advento coincide com o início do ano litúrgico. É preciso que compreendamos bem o que vem a ser o ano litúrgico: ele é o compêndio espiritual dos mistérios da salvação no decorrer do tempo. Ao passar os dias do ano, dentro do espaço temporal da liturgia, nós, ao mesmo tempo em que permanecemos no tempo, entramos na eternidade de Deus através do Espírito Santo que habita em nós. Dessa forma, viver cada ano com intensidade os mistérios celebrados diariamente no ano litúrgico deve ser uma preocupação primordial para o fiel de Cristo. Nesse sentido, o tempo do Advento com o qual se inicia o ano litúrgico constitui uma oportunidade ímpar para predispor o espírito para receber o Senhor que vem nos visitar no Natal.
O tempo do Advento é marcado pela cor roxa, sinal da vigilância que deve ser o estado de espírito corrente do cristão e que a Igreja convida a aprofundar nesse período. Apenas no terceiro Domingo do Advento o roxo é substituído pelo róseo ou roxo mitigado, em sinal da proximidade das festas natalinas. Também nos lembra a necessidade de buscar a reconciliação com Deus por meio do sacramento da reconciliação para podermos participar dignamente dos santos mistérios de Deus.
Um outro aspecto importante deste tempo litúrgico é o convite que a Igreja faz para que seus filhos ouçam mais e melhor a Palavra de Deus. Nesse sentido é que ela nos faz ouvir durante este período, grande parte da profecia de Isaías, além de, no Evangelho, destacar cada dia que a vinda do Senhor no fim dos tempos está iminente. Este é o tom deste tempo: a expectativa e certeza da vinda do Senhor no fim dos tempos (durante as primeiras semanas do Advento) e no Natal (a partir do dia 17 de dezembro), além da vinda cotidiana do Senhor em nossos corações pelo Seu Santo Espírito e na Sagrada Liturgia, nos irmãos etc.
A riqueza do tempo que agora se inicia é tamanha que não caberia nem ao menos assinalar os principais pontos neste minúsculo texto. Durante todo o tempo do Advento chamarei a atenção de você, caro leitor, para outros aspectos importantes. Também tentarei colocar uma série diária de reflexões acerca das leituras do profeta Isaías que forem sendo lidas no decorrer deste período e que meditarei, convidando você a fazer o mesmo.
De todo coração, desejo a você um santo tempo de Advento, de forma que possamos receber, de coração dilatado, o nosso doce Jesus neste Natal de 2009 e também durante estes dias que o antecedem.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Um país realmente católico

A respeito da decisão do Tribunal de Direitos Humanos da União Europeia de forçar a Itália a retirar os crucifixos das paredes das salas de aula, houve um levante indignado em todo o país. Vejam, católicos brasileiros, o que acontece num país realmente católico e depois se pergunte: o Brasil é um? O texto está no blog Frates in Unum.


“Oh, bella Italia! A Itália mostra aos imbecis europeus com quantos paus se faz uma canoa” – esclareceu o BLOG ‘Fakten Fiktionen’ na quinta-feira:
“Esta é a resposta ao Juiz turco de Estrasburgo!”.
O Blog narra os fatos: “O prefeito de San Remo, Maurizio Zoccarato, está colocando uma cruz de dois metros no prédio da prefeitura!”
A cidade de San Remo encontra-se no extremo noroeste da Itália.
Ao mesmo tempo Zoccarato exigiu que todos os diretores de escolas afixem cruzes nas salas de aula.
Segundo o blog ‘Fakten Fiktionen’, em toda a Itália inicia-se uma competição para mostrar isso aos juízes de Estrasburgo”.
Na cidade de Busto Arsizio, perto de Milão, a administração municipal hasteou as bandeiras da União Européia em frente aos prédios oficiais a meio mastro.
Um enorme crucifixo está resplandecendo há pouco tempo diante da fachada do Teatro Bellini de Catania, na Cicília.
Inúmeras comunidades italianas encomendaram novas cruzes para as suas escolas.
A cidade Sassuolo na província de Modena no norte da Itália encomendou cinqüenta novos crucifixos. Eles deverão ser pendurados em todas as salas de aula em que ainda não houver algum.
O Ministro da Defesa Ignazio La Russa abordou o tema da defesa nacional espiritual em uma discussão de TV: “Todas as cruzes devem permanecer penduradas, e os opositores da cruz que morram, juntamente com essas instituições aparentemente internacionais!”
A comunidade Montegrotto Terme com 10.000 habitantes – onze quilômetros a sudoeste de Pádua – anuncia em placas de néon: “Noi non lo togliamo” – Não vamos ceder.
O prefeito da cidade de Treviso no noroeste da Itália resumiu a situação muito bem: “Encontramo-nos no reino da demência, essa é uma decisão, que clama por vingança. O tribunal deve processar a si mesmo pelo crime que cometeu!”
O prefeito de Assis sugeriu que além dos crucifixos fossem colocados também presépios nas salas de aula.
O prefeito da cidade de Trieste esclareceu que tudo permaneceria do jeito que está.
A Câmara de Comércio romana pediu que as lojas pendurassem crucifixos.
Na comunidade Abano Terme – onde mora a ateísta militante finlandesa que reclamou do crucifixo – haverá protestos amanhã em frente das escolas a favor da Cruz de Cristo.
O prefeito de Galzignano Terme na província de Pádua, Riccardo Roman, ordenou colocação imediata de cruzes em todos os edifícios públicos – não somente escolas, mas também na Prefeitura e museus. Dentro de duas semanas a polícia irá conferir se a ordem foi obedecida, caso contrário haverá uma multa de 500 Euros. O autor de ‘Fakten Fiktionen’ está maravilhado: “Bravo! Vou descansar alguns dias lá no ano que vem! Deve valer à pena!”
O Prefeito Maurizio Bizzarri da comunidade de Scarlino na Toscana do sul impôs uma multa de 500 Euros para aqueles que retirarem uma cruz dos prédios públicos.
Na cidade Trapani no extremo oeste da Sicília o Presidente e o assessor do governo da província encomendaram 72 cruzes com recursos próprios.
Na cidade de Neapel apareceu uma pixação que dizia: “Se arrancar a cruz, eu arranco a tua mão fora!”
‘Fakten Fiktionen’ se dá por vencido: “Lamento, preciso parar, mas parece que não existe nenhuma cidade sem resistência.”

sábado, 21 de novembro de 2009

Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo

Chegamos à ultima semana do ano litúrgico. O ciclo litúrgico é imagem da história da salvação: ele começa com a expectativa da chegada do Salvador da humanidade, penetra no mistério da morte e ressurreição do Senhor, segue e termina no acontecimento escatológico quando o Cristo virá para reinar sobre o mundo, exercer a justiça sobre a terra e dar a recompensa aos servos justos: o reino preparado para eles desde toda a eternidade.
Pois bem: chegamos ao último domingo do ano litúrgico, comemorando este fato escatológico que, celebrado na Sagrada Liturgia, acontece agora. Sim, meus irmãos, na Liturgia entramos na eternidade: o Sacrifício pascal de Cristo é tornado presente, bem como toda a economia da salvação e, inclusive, os tempos futuros. Na liturgia penetramos o “tempo” de Deus, que não é tempo, mas eternidade; utilizando as categorias de Santo Agostinho, diríamos que na liturgia deixamos o nunc transiens, o agora que passa, ou seja, o tempo, para penetrar no nunc stans, o agora que permanece, isto é, a eternidade.
Assim sendo, podemos agora entender o sentido preciso da Solenidade de hoje: no fim dos tempos Cristo virá como Rei para reinar sobre o reino que seu pai lhe deu (cf. Sl 2), sentando-se no seu trono glorioso para separar o joio do trigo (cf. Mt 13,30.41-42), os peixes bons dos maus (cf. Mt 13,47-50), as ovelhas dos cabritos (cf. Mt 25,32). Mas, na verdade, o Cristo já reina, embora de modo não-pleno ainda: reina por Sua presença (cf. Lc 17,21) que enche toda a terra e, no coração humano que o acolhe, reina como Senhor. Cristo já reina no coração dos que creem e já reina na Igreja; enquanto Deus, reina sobre toda a criação por sua virtude divina. Mas também nos incumbe de fazer que seu reinado se estenda por toda a terra, não apenas nos corações dos homens, mas nas estruturas sociais, nas leis das nações, na cultura, na economia... É dever de todo cristão impregnar o mundo com o bom odor de Cristo, espalhar pelo orbe o seu reino “de verdade e vida, santidade e graça, justiça, amor e paz” (cf. Prefácio da Missa de Cristo Rei). É preciso lutar contra as forças do mal que querem apagar da sociedade os sinais de Cristo, retirando os crucifixos dos lugares públicos, fazendo passar leis iníquas nos parlamentos, sendo conivente com as ideologias pagãs e destrutivas. Ergamo-nos, cristãos: vós formais um reino de sacerdotes (Ap 5,10) e, se Cristo é o Rei dos reis, Senhor dos senhores, é porque ele reina e domina sobre nós: nós somos reis, nós somos senhores.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Inspiração e inveja


É realmente inspirador depararmo-nos com pessoas competentes em seus ofícios, em suas profissões. Um bom médico é capaz de salvar a vida de uma pessoa graças à dedicação que teve em aprender a medicina, à sua experiência diária na profissão, ao seu empenho neste caso específico. Falo do médico apenas como um exemplo, mas isso serve para todos os ofícios humanos. Não é reconfortante saber que recebemos o serviço de alguém competente? E, ao mesmo tempo, como dito, é inspirador. Mas na nossa singular nação este sentimento não parece ser tão óbvio quanto parece. Um médico medíocre tanto pode inspirar-se num competente quanto pode ficar com inveja e desprezá-lo, procurando subterfúgios para diminuir o outro e elevar-se a si próprio. E, se há a oportunidade, este sujeito passará o outro para trás. Do mesmo modo nos outros ambientes: na escola, na empresa, na repartição e – infelizmente! – na Igreja.
Não é o que frequentemente encontramos ao nosso redor? Inveja, pusilanimidade, mediocridade e todos os sentimentos mais baixos apoderam-se das pessoas quando veem alguém que deu certo na vida – em nosso caso, na Igreja, de alguém que busca a santidade, a obediência, ou que chegou a ocupar um cargo de liderança ou destaque. É verdade que isto é próprio do ser humano em geral, não é uma macabra particularidade do Brasil, mas é fato que aqui como em nenhum outro lugar, este sentimento é particularmente agudo. E isto extrapola para dentro da vida eclesial, como não nos pode deixar mentir você, caro leitor! Quem sabe você próprio – ou este que te escreve – não sofre da mesma paixão? No entanto, entre nós, não deve ser assim. Entre nós – e isto deveria transbordar para a vida civil em geral – não deve existir essa maligna emulação que consiste em corroer-se de inveja e planejar o mal para o outro, ou mesmo sentir-se triste com o progresso alheio. O desenvolvimento do meu irmão – não importa em que sentido – deveria ser motivo de alegria para mim e – voltamos ao começo deste minúsculo artigo – motivo de encorajamento e inspiração. Assim viveram os santos: tendo sempre modelos de vida reta que os estimulavam a seguir a Cristo e tornando-se eles mesmos modelos para demais irmãos.
Desta forma, peçamos ao Senhor, curador de nossas paixões, que nos livre da inveja e da disputa e nos faça sentir um verdadeira alegria com as vitórias, com o sucesso e com a competência alheias, onde quer que se encontrem.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Os Padres da Igreja - São Justino 3

Vida de São Justino
Do livro Os Padres da Igreja de A. Hamman

A escola de Roma
Roma constitui para o cristianismo uma posição de capital relevância. Todas as seitas empenham-se para aí se implantarem e, tanto quanto possível, nela exercer o seu domínio. Mais importante ainda seria conseguir que a ortodoxia aí se achasse representada, e a verdade cristã fosse defendida contra a heresia e o paganismo.
Justino fez seus adeptos. A história conservou o nome de Taciano, que mais tarde cairá na heresia. Seis dos discípulos de Justino tornar-se-ão seus companheiros de martírio. Seu sucesso deixará na sombra o filósofo cínico Crescêncio que, em vez de combatê-lo lealmente, se contentou em denunciá-lo covardemente. Os ensinamentos do filósofo cristão obrigaram as autoridades e os pensadores a levar em conta o cristianismo. Ele deu ao pensamento cristão direito de cidadania. Seu martírio prova que sua ação e sua influência eram temidas pelas autoridades romanas.
Justino concentrou seus esforços na demonstração da fé cristã, tendo em vista converter judeus e pagãos. Sua controvérsia devia refutar a heresia que começava a proliferar de maneira perigosa. Cinquenta anos mais tarde, Irineu de Lião testemunha sua veneração pelo mestre de Roma que havia sido um precursor.

O escritor
A obra literária de Justino é considerável. Muitos dos seus escritos acham-se hoje perdidos. Dentre eles restam-nos três cuja autenticidade é incontestável: as duas Apologias, o Diálogo com o judeu Trifão, que nos permitem fazer uma ideia da apologética cristã, tal como se desenvolveu por volta da metade do século II.
Justino não é um literato. “Ele escreve rudemente, afirma Duchesne, e numa língua incorreta”. O filósofo só se preocupa com a doutrina. Seu plano é fraco, o ritmo de sua exposição interceptado por digressões e retrocessos para retomar pontos já abordados. O homem comove-nos mais pela retidão de sua alma do que pela arte de sua dialética ou de sua composição. A originalidade de Justino não está na sua qualidade literária, mas na novidade de seu esforço teológico. Por trás deste esforço, descobrimos o testemunho de um homem, de um conversão, de um opção definitiva. Os argumentos que ele apresenta têm uma história: a dele. As tentações contra as quais recomenda que se esteja alertado, ele as conheceu. Para quem sabe descobrir este testemunho, os livros de Justino não envelhecem.

O exegeta
O leitor moderno sente-se um pouco desorientado diante da exegese de Justino. Este percebe, ao longo de toda a Bíblia, a palavra do Verbo de Deus. Para ele a Bíblia inteira anuncia o Cristo. O Verbo que se encarna preexistiu e inspirou os profetas. Ele constitui a unidade dos dois Testamentos. Esta exegese, cara a São Paulo, tornar-se-á tradicional durante o período patrístico. Vamos reencontrá-lo em Irineu e em Agostinho.
Não possuímos mais nenhum dos tratados teológicos compostos por Justino. Somos obrigados a nos contentar com seus livros apologéticos. O Deus do universo só é conhecido por nós através de seu Verbo, que se apresenta a Justino como uma ponte entre o Pai e o mundo. Por ele, Deus criou o mundo, age sobre este e governa-o, ilumina toda alma de boa vontade. Tudo o que os poetas, os filósofos ou os escritores possuem de verdade é um raio de sua presença luminosa. O Verbo guia não somente a história de Israel, mas toda busca sincera de Deus.
Este admirável frescor, esta visão ampla e generosa da história, apesar de certas formulações desajeitadas, encerra a intuição de um gênio, intuição que será retomada desde santo Agostinho até São Boaventura, e, mais perto de nós, por Maurice Blondel. Ele se acha singularmente próxima de nossa problemática moderna.
“Ninguém acreditou em Sócrates enquanto ele não morreu para confirmar o que ensinava. Pelo Cristo, porém, artesãos e até pessoas ignorantes desprezaram o medo da morte”. Estas nobres palavras, que poderíamos atribuir a Pascal, são dirigidas por Justino ao prefeito de Roma.

O mártir
O filósofo cristão dirigira uma primeira apologia ao imperador Marco Aurélio para defender os cristãos caluniados. Não falava ao imperador-filósofo como um acusado, mas como um parceiro. A Apologia não dispusera esse homem sério a conhecer melhor a nova seita, que reunia em uma mesma fraternidade, escravos e patrícios. O imperador continuou a condenar sem conhecer. Este homem, observa o padre Lagrange, que fazia diariamente seu exame de consciência e que se acusava de pecadinhos, nunca se questionou a si próprio para saber se, em relação aos cristãos, não agia como um verdadeiro tirano!
Justino foi denunciado por um filósofo invejoso, que de filósofo só tinha o nome e as vestes aparatosas; as atas do processo foram conservadas. São de uma autenticidade incontestável. O filósofo comparece diante de Rústico, que havia iniciado o jovem Marco Aurélio na moral de Epicteto. Fazem-se as jogadas. Justino sabe-o. não se trata mais de convencer, senão de confessar.
– A que ciência te dedicas?
– Estudei sucessivamente todas as ciências. Acabei por apegar-me à doutrina verdadeira dos cristãos.
As respostas são simples e nobres, nítidas como o metal. Condenaram Justino a ser flagelado e depois a sofrer a pena capital. Assim, glorificou ele a Deus. Sua vida terminava, como as atas que no-la contam, numa doxologia. Era a sua última celebração.
Justino não estava só: achava-se cercado de seus discípulos. As atas citam seis deles. E esta presença constituía a homenagem mais comovente que se possa prestar a um mestre da sabedoria.

sábado, 14 de novembro de 2009

Os Padres da Igreja - São Justino 2

Vida de São Justino

Do livro Os Padres da Igreja de A. Hamman

O homem
Ninguém estava mais bem preparado para este confronto do que Justino. O pensamento dos filósofos, ele o havia procurado, praticado e amado; conhecia-o por dentro, pois que jamais procurou a verdade que não fosse para vivê-la. Havia lutado, viajado, sofrido, em busca do saber. Por esta razão, sem dúvida, percebemos um despojamento por trás de sua descoberta, um testemunho que não engana. Este filósofo do ano 150 está mais perto de nós do que muitos pensadores modernos. “Justino, filho de Prisco, filho de Baqueios, de Flávia Neápolis, na Síria da Palestina”, é com estes termos que Justino faz a sua própria apresentação, à primeira página de sua Apologia. Ele nascera no coração da Galiléia, na cidade de Naplusa, cidade romana e pagã, construída da antiga Siquém, perto do poço de Jacó, onde Jesus anunciara à Samaritana o culto novo. Naplusa era uma cidade moderna, onde floresciam as romãzeiras e os limoeiros, e que ficava encaixada entre as encostas de duas colinas, a meio caminho entre a verdejante Galiléia e a cidade de Jerusalém.
Os pais de Justino eram colonos abastados, de origem latina mais do que grega, o que explica sua nobreza de caráter, seu gosto pela exatidão histórica, as lacunas de sua argumentação. Ele não possui nem a flexibilidade nem a dialética sutil de um grego. Viveu em contato com judeus e samaritanos.

O filósofo
Natureza nobre, apaixonado pelo absoluto, bem jovem ainda sentiu-se inclinado para a filosofia, no sentido que se lhe dava naquela época: não uma especulação por diletantismo, mas busca da sabedoria e da verdade que levam a Deus. A filosofia conduziu-o passo a passo até o limiar da fé. O próprio Justino conta-nos, no Diálogo com Trifão, o longo itinerário de sua busca, sem que nos seja possível fazer a discriminação entre o artifício literário e a autobiografia. Sucessivamente, em Naplusa, freqüentou as aulas de um estoico; depois, de um discípulo de Aristóteles, que logo abandonou, trocando-o por um platônico. Com candura, esperava que a filosofia de Platão lhe permitisse “ver imediatamente a Deus”.
Retirando-se à solidão, Justino passeava pela areia, à beira-mar, para meditar sobre a visão de Deus, sem conseguir apaziguar sua inquietação, quando encontrou um ancião misterioso que dissipou suas ilusões. Este mostrou-lhe que a alma humana não podia atingir a Deus com seus próprios recursos; somente o cristianismo era a filosofia verdadeira, que apresentava conclusão para todas as verdades parciais: “Platão, para dispor a pessoa ao cristianismo”, dirá Pascal.
Instante inesquecível, que assinala uma data na história cristã, em que se encontram a alma platônica e alma cristã. A Igreja colhia Justino e Platão. Tendo ingressado no cristianismo por volta do ano 130, o filósofo cristão, longe de abandonar a filosofia, afirma ter encontrado no cristianismo a única filosofia segura, que satisfaz todos os seus desejos. Ele se apresenta sempre coberto com o manto dos filósofos. Isto para ele é um título de nobreza. Não repudia o pensamento de Platão, mas o introduz na Igreja. Justino gosta de declarar que os filósofos eram cristãos sem o saberem. Justifica esta afirmação começando por um argumento tirado da apologética judaica, que achava que os pensadores deviam o melhor de sua doutrina aos livros de Moisés (Apol. 44,40). O Verbo de Deus ilumina todos os homens, o que explica as parcelas de verdade que se encontram nos filósofos. Os cristãos não têm por que invejá-los, pois possuem o próprio Verbo de Deus.

Testemunha da comunidade cristã
Depois de se ter feito cristão, Justino, sem dúvida alguma, nunca foi padre. Viveu em Roma como um simples membro da comunidade cristã, cujas reuniões dominicais descreve, bem como o batismo e a eucaristia. Desta forma, fornece-nos a primeira descrição da liturgia e dá testemunho da fraternidade que anima e une os membros da comunidade.Primeiro em Éfeso, depois em Roma por volta do ano 150, Justino funda escolas filosóficas cristãs. Na capital do império, morava, como ele conta ao longo do seu interrogatório, “perto das Termas de Timóteo, na casa de um homem chamado Martinho”. Mantém aí uma escola, ensinando a filosofia de Cristo.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Os Padres da Igreja - São Justino - 1

Vida de São Justino
Do livro Os Padres da Igreja de A. Hamman

De todos os filósofos cristãos do século II, Justino é o mais célebre e o maior. É também o que toca mais profundamente o íntimo do nosso ser. Este leigo, este intelectual, inicia o diálogo com os judeus e com os pagãos. Sua vida foi um alonga busca da verdade. De sua obra, escrita com rudeza e sem arte, desprende-se um testemunho cujo preço os séculos só fizeram valorizar cada vez mais. O cristianismo para ele não é, antes de tudo, uma doutrina, porém uma pessoa: o Verbo encarnado e crucificado em Jesus.
Neste homem, que viveu há dezoito séculos, percebemos o eco de nossos anseios, de nossas objeções, de nossas certezas. Descobrimos nele uma abertura de alma, uma possibilidade de acolhimento, uma vontade de diálogo, que desarmam e seduzem. Se muitas de suas obras estão hoje perdidas, as que nos restam fornecem-nos o diário íntimo desse cristão, e são suficientes para nos revelar a sua vida, desde o seu nascimento e a sua formação, até o seu martírio.

Vida intelectual no século II
Na época de Justino, os filósofos conquistaram o direito de cidadania em Rima. Vitoriosa em seus exércitos, Roma permanece vassala da cultura e da fermentação religiosa do Oriente. Os mestres do pensamento vêm da Ásia para ensinar em Roma. Os romanos foram tomados de excessiva admiração pela filosofia grega e pelas religiões mistéricas. Roma absorvera os impérios; restava-lhe abrir suas portas às divindades do Panteão.
Cansados de uma religião sem poesia e sem alma, os romanos voltaram-se para os filósofos. A filosofia transformara-se numa escola espiritual de paz e de serenidade, e o filósofo num diretor de consciência, num mestre interior, num guia. O próprio imperador Marco Aurélio reveste-se da moral do estoicismo.
No momento em que Justino se converte, a Igreja se acha em plena fermentação. O homem vindo de fora, o pagão de Roma ou de Éfeso, encontrava certa dificuldade para discernir a Igreja de Cristo, em meio às inúmeras escolas que já proliferavam em torno dela. Os falsos profetas criavam comunidades que se opunham à grande Igreja. Como distinguir o bom grão do joio? O pagão daquela época, como o descrente de hoje, não podia deixar de ficar desnorteado no meio desse formigamento de seitas que reclamavam para si o Cristo.

O ambiente cristão
Dentro da Igreja, não se fazem jogadas. A tradição mal acaba de nascer. Justino pôde ver homens que haviam conhecido Pedro e Paulo. Em Éfeso certamente encontrou cristãos que haviam ouvido João, o Vidente. Cem anos separam-no da vida de Jesus: a mesma distância que separa a nossa geração da do duque de Caxias.
Justino ingressa num cristianismo jovem, de fé ardente e contagiosa, que procura formular sua doutrina. O pensamento de Justino revela sua própria história; ele argumenta tal como raciocina. Seus escritos defendem a fé que ele escolheu.
Duas coisas mudaram: na época de Justino, a Igreja atinge o público culto: filósofos e patrícios pedem o batismo e tomam o lugar dos estivadores e dos escravos. A expansão cristã provoca críticas e gracejos por parte dos escritores pagãos e acusações caluniosas da multidão. A tais oposições os cristãos respondem com a juventude de sua fé: “Nada de literatura. O que vale é a vida”, dizia Minúcio Félix. Justino faz-lhe eco: “Atos e não palavras”.
O Evangelho ia de vento em popa. Para detê-lo, os mundanos espalhavam boatos em que o “zé-povinho”, sempre crédulo, acreditava. Os cristãos eram acusados de adorar um deus com cabeça de asno, de se entregarem à devassidão e de participar dos festins de antropófagos. Filósofos e retóricos lançavam o descrédito sobre esses concorrentes incômodos. Não se deveria de chofre tachar de hostilidade a resistência ao Evangelho. A oposição no século II, como a de todos os períodos da história religiosa, provém de preconceitos, de opções prévias, de ignorância e de mal-entendidos que os escritores cristãos vão esforçar-se por afastar, a fim de estabelecer o diálogo entre a fé o pensamento, entre a Igreja e o mundo. Justino será o homem do diálogo. Uma de suas principais obras intitular-se-á Diálogo com o judeu Trifão.

domingo, 1 de novembro de 2009

Solenidade de Todos os Santos

Bendito seja Deus nos seus anjos e nos seus santos! Essa oração que fazemos junto ao Santíssimo Sacramento resume bem a presente solenidade: celebrar todos os santos e santas de Deus é bendizer a Deus pelo grande dom que Ele dá à Igreja nos seus santos e por meio deles.
Mas o que é santidade? A santidade é, antes de tudo, uma propriedade do próprio Deus: Ele, só Ele, é que o Santo, o separado de todas as coisas porque sua natureza de tal modo transcende tudo que nada o pode abarcar, nada o pode prender. Mas, ao mesmo tempo que é o Altíssimo, o Inalcançável, Ele, em sua bondade, se inclina para o homem e o chama à altíssima vocação da santidade, do apartar-se de tudo o que não é Deus para estar junto d’Ele.
Se é Deus quem chama e dá a santidade, este dom, este chamado, é dirigido a todos os povos, a todas as pessoas. Todos são chamados a serem amigos de Deus, a andarem em sua presença. Objetivamente, no entanto, por causa do pecado original, os homens tiveram sua mente obscurecida e passaram a viver afastados de Deus. Mesmo assim, Deus, através do Seu Filho, que viveu e morreu por nós, temos de volta a vida que Deus nos tinha dado no início. E a nossa entrada nesta vida nova, vida de santidade, se dá quando entramos na Santa Igreja, Casa Deus entre os homens, Templo Santo, Corpo de Cristo, Sinal da sua salvação entre todos os povos. Aqueles que pela fé e pelo batismo recebem o Espírito Santo e se nutrem dos sacramentos são o povo santo, a nação sacerdotal que o Senhor escolheu para proclamar as suas obras maravilhosas. Você, cristão, pelo santo batismo, possui o Espírito Santo, que o torna santo! Mesmo na sua fraqueza, mesmo que cometa pecados, mesmo assim Deus o ama e o chama a viver uma vida de santidade, continuamente se purificando das obras más do pecado e se tornando semelhante ao Cristo Nosso Deus em sua vida terrena. É Cristo, o Santo de Deus, o Bem-aventurado, o modelo primeiro e insubstituível para o cristão; mas para que não penses que este ideal é alto demais, Deus deu-nos uma inumerável multidão de homens e mulheres que foram, na vida e na morte, capazes de imitar o Senhor pela força do Espírito Santo que estava neles. É a eles que nos dirigimos hoje, suplicando suas preces junto a Deus para que nós possamos também nós imitá-los e caminhar na amizade de Deus neste mundo. Que o Senhor nos conceda a graça grandiosa de sermos, como os santos que hoje celebramos, testemunhas dignas de sua Palavra e que sejamos contados entre o número daqueles que têm seus nomes inscritos nos céus e que no fim desta vida hão de participar da bem-aventurança eterna.