domingo, 31 de maio de 2009

"As misericórdias do Senhor se renovam a cada manhã" (Lm 3,23)


O tempo é o lugar privilegiado de acolhermos o favor de Deus, a sua graça, a sua misericórdia. Mas duas questões aqui se impõem: que tempo é esse? E onde podemos experimentar a misericórdia de Deus?
O tempo é o hoje da vida. Afinal, o que sabemos sobre o tempo de vida que nos resta aqui nesse mundo? O tempo do qual dispomos é o hoje, é o agora. Portanto, é esse hoje que devemos viver. Viver imersos no passado ou voltados para o futuro não é vida, é sobrevida.
E é justamente hoje que Deus nos alcança, renovando suas misericórdias a cada manhã, a cada dia. A rotina diária frequentemente nos impede de enxergar a beleza da simplicidade rica dos cuidados divinos para conosco. Nosso Pai amoroso nos precede a cada dia, preparando com carinho tudo aquilo que contribui para o nosso bem. E não somente isso, em cada pessoa que, no seu comportamento de cuidado, preocupa-se conosco, melhorando o nosso tempo, Deus continua exercendo o seu cuidado para conosco.
Olhemos esse mundo, experimentemos o tempo que é de Deus e acontece agora, com sentimentos de gratidão. Digamos: “Obrigado Senhor, por tudo o que tens feito e por todo o bem com que nos cercas, através da pessoas que ajudam a melhorar a nossa estadia aqui na terra".
Retomemos o santo Tempo Comum com esses sentimentos.

"Recebei o Espírito Santo" - Solenidade de Pentecostes



A Solenidade de Pentecostes encerra o Tempo Pascal, celebrando o seu grande Dom: o Espírito Santo. Hoje se cumprem as promessas feitas por Deus por meio dos profetas, promesas segundo as quais seria derramado sobre a casa de Israel o Espírito de Deus, Espírito de vida nova. Hoje também chega ao seu cume o plano salvífico de Deus: dar-nos a sua própria vida, colocando-nos na comunhão da Trindade pelo Seu Espírito.
É pelo derramamento do Espírito que entramos no dinamismo da ressurreição. Jesus não veio ao este mundo para morrer e ressuscitar somente. Caso isso tivesse acontecido, o que teríamos a ver com Jesus? Quem ressuscitou foi Ele. Mas não. Aquela vida que Jesus recebeu do Pai, arracando-o da morte, Ele nos deu, ao doar o Seu Espírito. Assim, ao partilharmos o mesmo Espírito que habita corporalmente em Jesus, nós já ressuscitamos para a vida da graça, e um dia, ressuscitaremos plenamente. É por isso que a Páscoa é um tempo de alegria proque temos a certeza de que em Cristo, no Espírito, somos homens novos.
Esse Espírito foi derramado sobre os apóstolos no dia mesmo da ressurreição de maneira discreta, conforme nos atesta o Evangelho de João (cf. Jo 20, 19-23). No dia mesmo da Páscoa, à tarde, Jesus dá o Espírito, batizando os apóstolos, fazendo-os suas testemunhas. O outro momento em que o Espirito foi doado encontramos nos Atos dos Apóstolos (cf. At 2, 1-11). Aqui o Espírito manifesta-se de forma barulhenta e pública, impulsionando os seus discípulos à missão. E esse mesmo Espírito continua presente na Igreja, continua sendo derramado pela Palavra viva e pelos sacramentos, principalmente a Eucaristia, quando o recebemos sob o véu sacramental
Esse Espírito, doado permanentemente à Igreja, dá testemunho que Jesus é o Senhor. É Ele que clama na Igreja e pela Igreja que não há outro senhorio a não ser o de Cristo, conforme nos diz S.Paulo: "ninguém pode dizer: Jesus é o Senhor, senão sob a ação do Espírito Santo" (1Cor 12,3). Dá testemunho é confessar no Espírito Santo, diante do mundo, que Jesus é o Cristo.
Essa presença do Espírito assume, por meio do anúncio da Igreja, as feições de cada cultura, purificando-as para torná-las cheias dos sentimentos de Jesus Cristo. É pelo Espírito que a Igreja assume a diversidade de povos, raças e línguas.
Que reconheçamos sempre a presença do Espírito Santo em nossa vida pessoal e eclesial. Rezemos sempre: “Vinde, Pai dos Pobres, dai aos corações vossos sete dons”. Amém.

sábado, 30 de maio de 2009

O Espírito Santo é o perdão dos pecados


Na oração Sobre as Oferendas da Missa desse sábado da 7ª Semana do Tempo Pascal, nós rezamos assim: “Ó Deus, nós vos pedimos, a vinda do Espírito Santo, ele que é o próprio perdão dos pecados...” Esse texto litúrgico confessa que o perdão dos pecados não é uma coisa dada a nós, mas a própria pessoa de Deus em nós, o Seu Espírito Santo.
Entre o Espírito e o pecado há uma oposição. Recordemos que o pecado é o fechamento à comunhão com Deus, é um "não"ao projeto de Deus, é iludir-se que podemos construir a nossa história sem a ação deificante do Espírito de Deus. O Espírito, por sua vez, é Aquele que nos coloca de novo no dinamismo da vida trinitária, na vida da graça. Por isso Ele é o perdão dos pecados. Por isso, podemos afirmar que onde está Espírito, a graça de Deus, não há espaço para a desgraça do pecado. Por outro lado, onde o pecado encontra espçao, a ação do Espírito fica sufocada.
Essa realidade da oposição entre o Espírito e o pecado aparece de maneira eloquente nos evangelhos, quando Jesus afirma que até o pecado contra o filho do homem será perdoado, mas o pecado, a blasfêmia contra o Espírito Santo, não alcançará perdão, nem nesse mundo, nem no mundo vindouro (cf. Mt 12,32; Mc 3,29 e Lc 12,10). Jesus está dizendo com isso que o pecado contra o Espírito é o não acolhimento da ação de Deus. Lembrem-se que esse discurso se dá no contexto no qual o opositores Dele o acusam de estar possuído pelo diabo, mesmo vendo que suas obras são boas. O pecado contra o Espírito é a incapacidade de acolher com gratuidade o favor de Deus. Por isso não há perdão, não há espaço para a ação do Espírito de Deus, numa vida bloqueada pelo pecado. Porém, caso o coração humano se abra a Deus, ali novamente haverá a paz e alegria da graça de Deus.
O Espírito Santo é a pessoa de Deus mais próxima de nós. É Deus em nós. É o perdão em nós. Deixemo-nos guiar por esse dinamismo divino que habita em nós, gerando sempre uma obra nova.

O Verdadeiro amigo

O significado de uma pessoa ser amiga da outra, hoje, está completamente deturpado, uma vez que você só é realmente amigo se for a favor do que o seu colega está fazendo, mesmo que este ato seja ilícito. É este modelo de amizade que a sociedade utilitarista impõe sobre as pessoas. Mas, para os cristãos, a amizade é irmã do amor e não impõe condições, mas impõe reciprocidade, afetividade, respeito, carinho, confiança e alegria.
O verdadeiro amigo irá nos avisar do perigo que está a nossa frente, o qual, na maioria das vezes, não conseguimos enxergar. Porém, o verdadeiro amigo adverte sem se contrapor às nossas decisões tomadas acerca do assunto alertado, pois mesmo que o amigo tome decisões erradas na vida e se arrependa, temos que oferecer e receber o ombro amigo sem pré-requisitos e também saber ouvir e escutar.
Não há escola para formação de amigos. Eles por si já nascem aptos. Por isto não impomos regras dentro de uma verdadeira amizade, elas se compatibilizam sem invasões, unindo os verdadeiros amigos, sem maldades, sem segredos, sem interesses. A felicidade de um é a felicidade do outro. E todo esse mistério só é possível porque o próprio Jesus cristo quis ter os seus amigos e dar a vida por eles.
Portanto, sem esforços, sabemos distinguir nossos amigos. Digamos sem medo: Hoje te procurei simplesmente para dizer: estou feliz porque te amo, meu amigo. És muito importante para mim.

sexta-feira, 29 de maio de 2009

O Espírito Santo: fonte da santidade e da contínua purificação da Igreja

Na profissão de fé católica professamos que a Igreja é Santa. A santidade, juntamente com a unicidade e a catolicidade são as notas que caracterizam a Igreja. Ser santa faz parte do próprio ser da Igreja, de sua essência.
Quando falamos em santidade, falamos na vida segundo o Espírito Santo. Ora, a Igreja nasceu de Cristo que, derramando o Espírito Santo sobre aqueles que Nele creram, gerou um novo povo. Cristo, Cabeça da Igreja, uniu a si, ao comunicar o Dom do Espírito, um corpo, constituído por todos os fiéis batizados. Assim, a Igreja é Santa porque está unida a Cristo. E esse vínculo de santidade só possível pela ação do Espírito Santo que habita na Igreja como num Templo.
O Espírito Santo na Igreja gera a vida da graça, à medida que renova cada homem que acolhe o Cristo pela fé nas águas do Batismo. Todo batizado é justificado, ou seja, regenerado no Espírito de Cristo, de tal forma que cada cristão é um homem novo, porque ali está semeado a semente da graça.
É verdade, no entanto, que sentimos na vida prática o pecado dos filhos da Igreja, as marcas do homem velho. E não são poucos os escândalos provocados pelos pecados dos cristãos. Tais atitudes dos cristãos parecem contrárias à afirmação da santidade da Igreja. E muitos cristãos, diante destes escândalos, chegam até a afirmar que os cristãos agem assim porque a Igreja é uma realidade santa e pecadora.
Tal afirmação não condiz com a fé, além de ser perigosa. Não está de acordo com a fé, porque, conforme já assinalamos, a santidade da Igreja vem do Espírito de Cristo dado a Igreja, gerando em cada cristão uma realidade nova. Não basta, portanto, um cristão pecar para que a Igreja deixe de ser santa, embora o pecado seja sempre um obstáculo à manifestação da santidade na Igreja com todo o seu esplendor. É uma colocação perigosa porque pode gerar nos cristãos certo consentimento ao pecado, uma vez que m bom número de cristãos possam ser levados a crê que somos assim mesmos um povo santo e pecador. Não há lugar na Igreja para o pecado. O mesmo Espírito autor da santidade da Igreja, convence-a permanentemente do pecado, convidando-o a uma contínua purificação, a tornar-se sempre aquilo que ela já é no seu ser, impulsionando cada cristão a ser aquilo que já é desde o Batismo: santos.
Em síntese: na sua essência a Igreja é Santa, porque nasce do Santo. É o Espírito Santo que renova os batizados, os convocados em Cristo por Deus Pai a formarem o Seu povo santo, a Igreja. Na sua existência, porém, a Igreja sentirá sempre o peso do pecado, uma vez que os filhos da Igreja serão sempre tentados e, muitas vezes, cederão a ele. Mas aqui também o Espírito age, renovando-a, fazendo a Igreja retornar ao primeiro amor. Enfim, a experiência existencial do pecado na Igreja não lhe retira a santidade que lhe é própria, mas também não é convite aos cristãos se conformarem com o pecado, mas a se abrirem a uma permanente experiência Daquele que é a fonte da santidade e da permanente purificação da Igreja: o Espírito Santo.

Sobre o respeito humano


O respeito humano é hoje um dos principais pecados que se cometem contra o oitavo mandamento. Este diz: “Não apresentarás um testemunho mentiroso contra o seu próximo” (Ex 20,16). A Igreja sempre deu um sentido positivo a este mandamento: ele nos prescreve a veracidade, a sinceridade, a boa-fé, o ato de ser e dizer conforme à realidade. Devemos ser verazes com as pessoas independentemente de a verdade agradar ou não. Mas muitos se apegam à Lei do Amor para amansar e tornar mais palatável e menos inconveniente a verdade que deveria ser dita. Por isso, esse respeito humano, que em nossa época é conhecido como o “politicamente correto”, traz tantos prejuízos ao mundo e à Igreja.
Por respeito humano, por ser politicamente incorreto, não professamos abertamente a nossa fé. Assim, é politicamente incorreto afirmar coisas como “Quem crer e for batizado será salvo, mas quem não crer será condenado.” (Mc 16,16). É politicamente incorreto afirmar que “serão julgados e condenados todos os que não deram crédito à verdade, mas consentiram no mal.” (2Ts 2,12). É politicamente incorreto afirmar que o inferno existe. É politicamente incorreto afirmar que “fora da Igreja, não há salvação”. E muitas outras coisas. Mas quando nós nos atrevemos a falar estas coisas, imediatamente acrescentemos: “mas não é exatamente isso que queremos dizer; queremos dizer assim e assim e assado...” para que não sejamos mal compreendidos. Como somos covardes! Ó geração sem sangue nas veias, ó geração pusilânime! Muito deviam se envergonhar os cristãos tíbios, que se envergonham, por exemplo, de fazer o sinal-da-cruz, de rezar o terço ou de carregar a Sagrada Escritura em público. Temos vergonha dos epítetos que os pagãos nos dariam se nos vissem fazendo tais coisas: “carola!”, “rato de sacristia!”, “beata!”, “alienado!” e assim por diante.
Quando vamos aprender que devemos agradar a Deus antes que aos homens? Quando vamos ter coragem de assumir nossa identidade católica e cristã? Quando vamos abandonar o comodismo e a preguiça para pôr mãos na massa na tarefa de ser cristão integralmente? Eis aqui, questionamentos que nos deveriam fazer pensar bastante.
“Mas quem me negar diante dos homens será negado diante dos anjos de Deus.” (Lc 12,9)

quinta-feira, 28 de maio de 2009

No próximo domingo, 31 de maio, celebraremos a solenidade de Pentecostes, encerrando, assim, o Tempo Pascal. O mistério celebrado é a vinda do Espírito Santo, como Dom dado à Igreja.
A festa de Pentecostes era, para povo da Antiga Aliança, a festa da entrega da Lei, celebrada cinqüenta dias após a Páscoa. Essa festa coincidia também com o início das colheitas. Por isso Pentecostes também era identificada como festa das primícias. Para nós cristãos, a vinda do Espírito no contexto dessa festa judaica possui um significado profundíssimo: O Espírito Santo é o verdadeiro Dom vindo do alto, o fruto verdadeiro e bendito colhido da Páscoa do Senhor.
É exatamamente essa a novidade do cristianismo: pelo Espírito Santo, infundido em nós, a vida de Deus nos é interior. Pelo Espírito, partilhamos a mesma vida do Filho de Deus, Jesus Cristo; por isso também somos filhos adotivos. A fé cristã não se trata de um seguimento de regras externas. O Espírito é derramado sobre cada um de nós, assumindo a nossa forma, transfigurando aquilo que somos, não para nos despersonalizar, mas para fazer resplandecer aquilo que há de mais humano em nós. Á medida que o Espírito nos diviniza, Ele nos humaniza. Não se trata do Espírito agir em nós como numa possessão, mas Ele gera em nós uma obra nova, a vida da Graça, de tal forma que somos nós mesmos e ao mesmo tempo somos tão parecidos com o próprio Cristo. Sim, porque a missão do Espírito não é outra senão a de plasmar, modelar em nós os traços de Jesus Cristo. A fé cristã é, portanto, vida na interioridade do Espírito Santo.
E, no entanto, quanta pobreza na celebração de Pentecostes! Na verdade, grande parte dos cristãos não sabe e não conhece a riqueza da missão do Espírito, a não a de iluminar a vida, quando esta parece difícil. A Terceira Pessoa da Trindade é quase um adendo na história da salvação para a experiência religiosa do Ocidente. O Espírito não passa de uma força que impulsiona a missão da Igreja, Aquele dos setes dons. Quanto prejuízo para a fé! A fé trinitária, incluída aí a personalidade do Espírito, não passa de um teorema frio e distante para muitos católicos latinos. Enfatizamos por demais a unicidade de Deus, em detrimento das pessoas, quase que o identificando com o motor imóvel aristotélico. Um deus assim não corresponde à novidade da mensagem evangélica.
É evidente que tal compreensão da Trindade, e, consequentemente, da ação do Espírito, trouxe prejuízos à vida litúrgica, moral e espiritual para a Igreja latina: ser cristão se reduz, tratando-se de um “jesuísmo” sem vida, um ascetismo próximo ao pelagianismo; celebrar é liturgia é cumprir rubricas, e não celebrar a epifania do Espírito que torna presente o mistério pascal de Cristo; e a espiritualidade é simplesmente viver virtudes abstratas.
O Deus revelado nas Escrituras, da Tradição viva da Igreja, como ao Oriente e ao Ocidente, por outro, lado, nada tem a ver com frieza, solidão, distância. Ele é essencialmente relação de pessoas. O Pai, desde de toda a eternidade, nos criou para que, através do Seu Filho Jesus, pudéssemos comungar de sua vida divina. E isso tornou-se possível porque Cristo nos deu o Espírito Santo. Por isso, desde o Batismo, já participamos da vida de Deus. E cada sacramento esse Espírito vem ao nosso encontro para torna cada momento de nossa vida prenhe do amor de Deus.
Celebremos Pentecostes, o fruto a Páscoa do Senhor, o Doce e Suave Espírito Santo. Ele é a seiva que dá a vida a nós, ramos da Verdadeira Videira, Jesus Cristo, cujo agricultor é o Pai do Céu. O Pentecostes aconteceu historicamente há mais ou menos dois mil anos, e continua a acontecer em cada sacramento, principalmente Eucaristia, quando o Espírito é invocado e transfigura as espécies eucarísticas no Corpo e Sangue do Senhor, fazendo Cristo mais íntimo de nós do que nós mesmos.

Celebremos o Dom do Espírito Santo, fruto da Páscoa do Senhor


No próximo domingo, 31 de maio, celebraremos a solenidade de Pentecostes, encerrando, assim, o Tempo Pascal. O mistério celebrado é a vinda do Espírito Santo, como Dom dado à Igreja.
A festa de Pentecostes era, para povo da Antiga Aliança, a festa da entrega da Lei, celebrada cinqüenta dias após a Páscoa. Essa festa coincidia também com o início das colheitas; por isso Pentecostes também era identificada como festa das primícias. Para nós cristãos, a vinda do Espírito no contexto dessa festa judaica possui um significado profundíssimo: O Espírito Santo é o verdadeiro Dom vindo do alto, o fruto verdadeiro e bendito colhido da Páscoa do Senhor.
É exatamamente essa a novidade do cristianismo: pelo Espírito Santo, infundido em nós, a vida de Deus nos é interior. Pelo Espírito, partilhamos a mesma vida do Filho de Deus, Jesus Cristo; por isso somos filhos adotivos de Deus. É pelo Espírito que a fé cristã não se trata de um seguimento de regras externas. O Espírito é derramado sobre cada um de nós, assumindo a nossa forma, transfigurando aquilo que somos, não para nos despersonalizar, mas para fazer resplandecer aquilo que há de mais humano em nós. À medida que o Espírito nos diviniza, Ele nos faz mais humanos. Não se trata do Espírito agir em nós como numa possessão, mas Ele gera em nós uma obra nova, a vida da Graça, de tal forma que continuamos a sermos nós mesmos e ao mesmo tempo somos tão parecidos com o próprio Cristo. Sim, porque a missão do Espírito não é outra senão a de plasmar, modelar em nós os traços de Jesus Cristo. A fé cristã é, portanto, vida na interioridade do Espírito Santo.
E, no entanto, quanta pobreza na celebração de Pentecostes! Na verdade, grande parte dos cristãos não sabe e não conhece a riqueza da missão do Espírito, a não ser a de iluminar a vida, quando esta parece difícil. A Terceira Pessoa da Trindade é quase um adendo na história da salvação para a experiência religiosa do Ocidente. O Espírito não passa de uma força que impulsiona a missão da Igreja, Aquele dos setes dons. Quanto prejuízo para a fé! A fé trinitária, incluída aí a personalidade do Espírito, não passa de um teorema frio e distante para muitos católicos latinos. Enfatizamos por demais a unicidade de Deus, em detrimento das pessoas, quase que o identificando com o motor imóvel aristotélico. Um deus assim não corresponde à novidade da mensagem evangélica.
É evidente que tal compreensão da Trindade, e, consequentemente, da ação do Espírito, trouxe prejuízos à vida litúrgica, moral e espiritual para a Igreja latina: ser cristão se reduz a imitar, tratando-se de um “jesuísmo” sem vida, um ascetismo próximo ao pelagianismo; celebrar é liturgia é cumprir rubricas, e não celebrar a epifania do Espírito que torna presente o Mistério Pascal de Cristo; e a espiritualidade é simplesmente viver virtudes abstratas.
O Deus revelado nas Escrituras, da Tradição viva da Igreja, comum ao Oriente e ao Ocidente, por outro, lado, nada tem a ver com frieza, solidão, distância. Ele é essencialmente relação de pessoas. O Pai, desde de toda a eternidade, nos criou para que, através do Seu Filho Jesus, pudéssemos comungar de sua vida divina. E isso tornou-se possível porque Cristo nos deu o Espírito Santo. Por isso, desde o Batismo, já participamos da vida de Deus. E em cada sacramento esse Espírito vem ao nosso encontro para torna cada momento de nossa vida prenhe do amor de Deus.
Celebremos Pentecostes, e o fruto da Páscoa do Senhor, o Doce e Suave Espírito Santo. Ele é a seiva que dá a vida a nós, ramos da Verdadeira Videira, Jesus Cristo, cujo agricultor é o Pai do Céu. O Pentecostes aconteceu historicamente há mais ou menos dois mil anos, e continua a acontecer em cada sacramento, principalmente na Eucaristia, quando o Espírito é invocado e transfigura as espécies eucarísticas no Corpo e Sangue do Senhor, fazendo Cristo mais íntimo de nós do que nós mesmos.

Soneto Vocacional


Pequenino ainda eu pensei:
Que serei, quando grande eu for?
E senti no meu peito gravado
O chamado de nosso senhor!

Pais, irmãos, doce lar, deixar tudo...
Golpe agudo a provar meu amor!
Mas na vinha serás mais feliz:
Eis que diz segredando o Senhor!...

Ganharás muito mais do que isso,
pois te alisto entre os meus escolhidos,
Serás padre, serás outro Cristo!

Vendo, então, a grandeza sublime,
que se imprime nos homens ungidos,
a ser padre,afinal,decidi-me!
In verbo tuo laxabo rete
(em tua palavra lanço a rede).

Soneto Vocacional

Pequenino ainda eu pensei:
Que serei, quando grande eu for?
E senti no meu peito gravado
O chamado de nosso senhor!

Pais, irmãos, doce lar, deixar tudo...
Golpe agudo a provar meu amor!
Mas na vinha serás mais feliz:
Eis que diz segredando o Senhor!...

Ganharás muito mais do que isso,
pois te alisto entre os meus escolhidos,
Serás padre, serás outro Cristo!

Vendo, então, a grandeza sublime,
que se imprime nos homens ungidos,
a ser padre,afinal,decidi-me!
In verbo tuo laxabo rete
(em tua palavra lanço a rede).

quarta-feira, 27 de maio de 2009

A Família que Deus me Deu



Na vida, podemos escolher os amigos, podemos escolher a pessoa amada, podemos escolher a profissão e muitas outras coisas. Mas não podemos escolher a família. Ela é um presente de Deus... presente que não pode ser recusado, nem trocado, nem deixado de lado. A família é um presente para ser amado... para ser cuidado... para ser assumido com toda a nossa vida!!!
A família que Deus me deu não é a melhor nem a pior do mundo. É simplesmente a minha família. Discussões... incompreensões... momentos de dificuldades... lágrimas... tudo isso também existe na família que Deus me deu. Mas também existe perdão... compreensão... momentos de felicidade... sorrisos... e lágrimas também! Lágrimas que brotam de um coração sincero e humilde, que reconhece o seu erro, e se reconcilia com o outro, e se decide pelo amor!!!
A família que Deus me deu é a mais bonita do mundo, porque é a minha família, é a minha gente, é a minha história, é a minha escola, é a minha vida. Na família que Deus me deu eu me tornei pessoa humana, eu aprendi a ser honesto, a amar e a respeitar os outros. Na família que Deus me deu eu recebi a fé, eu conheci a Igreja de Jesus Cristo!!!
A família que Deus me deu já sofreu tanto (mas quem não sofre???), já passou por tanta coisa. Mas nunca perdeu a esperança!!!
A família que Deus me deu também se parece um pouquinho com a Sagrada Família de Nazaré. Toda vez que amamos, toda vez que perdoamos, toda vez que partilhamos o pouco que temos, toda vez que morremos para fazer o outro nascer, toda vez que colocamos Deus em primeiro lugar, toda vez que realizamos essas pequenas coisas certas, na simplicidade do coração, parecemos com aquela Família de Nazaré!!!
Sagrada Família de Jesus, Maria e José, rogai pela família que Deus me deu... e pelas famílias do mundo inteiro também!!!

segunda-feira, 25 de maio de 2009

O Dom do Espírito nos capacita a receber a Deus

Do Tratado contra as heresias, de Santo Irinieu, bispo
.
Ao dar a seus discípulos poder para que fizessem os homens renascer em Deus, o Senhor lhe disse: Ide e fazei discípulos meus todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. (Mt 28,19)
Deus prometera, por meio dos profetas, que nos últimos tempos derramaria o seu Espírito Santo sobre os seus servos e servas para que recebessem o dom da profecia. Por isso, o Espírito Santo desceu sobre o Filho de Deus, que se fez Filho do homem, habituando-se com ele a conviver com o gênero humano, a repousar sobre os homens e a morar na criatura de Deus. Assim renovava os homens segundo a vontade do Pai, fazendo-os passar da sua antiga condição para a vida nova em Cristo.
São Lucas nos diz que esse Espírito, depois da ascensão do Senhor, desceu sobre os discípulos no dia de Pentecostes, com o poder de dar a vida nova a todos os povos e de fazê-los participar da Nova Aliança. Eis por que, naquele dia, todas as línguas se uniram no mesmo louvor de Deus, enquanto o Espírito congregava na unidade as raças mais diferentes e oferecia ao Pai as primícias de todas as nações.
Foi por isso que o Senhor prometeu enviar o Paráclito, que os tornaria capazes de receber a Deus. Assim como a farinha seca não pode, sem água, tornar-se uma só massa nem um só pão, nós também, que somos muitos, não poderíamos transformar-nos num só corpo, em Cristo Jesus, sem a água que vem do céu. E assim como a terra árida não produz fruto se não for regada, também nós, que éramos antes como uma árvore ressequida, jamais daríamos frutos de vida, sem a chuva da graça enviada do alto.
Com efeito, nossos corpos receberam, pela água do batismo, aquela unidade que os torna incorruptíveis; nossas almas, porém, a receberam pelo Espírito.
O Espírito de Deus desceu sobre o Senhor como espírito de sabedoria e discernimento, espírito de conselho e fortaleza, espírito de ciência e de temor de Deus (Is 11,2). É este mesmo Espírito que o Senhor por sua vez deu à Igreja, enviando do céu o Paráclito sobre toda a terra, daquele céu de onde também Satanás caiu como um relâmpago (cf. Lc 10,18).
Por esse motivo, temos necessidade deste orvalho da graça de Deus para darmos fruto e não sermos lançados ao fogo, e para que também tenhamos um defensor onde temos um acusador. Pois o Senhor confiou ao Espírito Santo o cuidado de sua criatura, daquele homem que caíra nas mãos dos ladrões e a quem ele, cheio de compaixão, enfaixou as feridas e deu dois denários reais. Tendo assim recebido pelo Espírito a imagem e a inscrição do Pai e do Filho, façamos frutificar os dons que nos foram confiados e os restituamos multiplicados ao Senhor.

domingo, 24 de maio de 2009

Sentou-se à direita de Deus – Ascensão do Senhor

Eis, irmãos, um dia glorioso! O Senhor Jesus, a quem o Pai ressuscitou dos mortos, subiu hoje aos céus! Durante quarenta dias apareceu aos discípulos há dois mil anos atrás; mas nesses dois mil anos e nesse ano da graça de 2009, o Senhor apareceu aos cristãos desses tempos e à nós que comemos e bebemos com ele (cf. At 10,41) cotidianamente na Eucaristia, durante quarenta dias, nesta Páscoa. Hoje, então, quando a Igreja se reúne mais uma vez para estar com Ele, observa, estupefata, como outrora os discípulos, o Senhor que se eleva aos céus, para sentar-se à direita do Pai.
Qual o motivo da admiração da Igreja? Simplesmente, como nos diz a coleta da Missa de hoje, a ascensão do Senhor já é nossa vitória. Porque o Filho sempiterno de Deus tendo descido do céu para unir-se à nossa humanidade, subiu, hoje, de volta para lá levando a sua humanidade, que também é a nossa, divinizada. Isso melhor nos diz o Santo doutor de Hipona: Desceu do céu por sua misericórdia e ninguém mais subiu senão ele; mas nele, pela graça, também nós subimos.
A narração da Ascensão do Senhor nos Atos dos Apóstolos nos dá um pormenor significativo da ocasião deste fato: diz-nos São Lucas que durante uma refeição, [Jesus] deu-lhes esta ordem: “Não vos afasteis de Jerusalém, mas esperai a realização da promessa do Pai, da qual vós me ouvistes falar: ‘João batizou com água; vós, porém, sereis batizados com o Espírito Santo, dentro de poucos dias’” (1,4-5), e diz em seguida: Depois de dizer isso, Jesus foi levado ao céu, à vista deles. Uma nuvem o encobriu, de forma que seus olhos não podiam mais vê-lo. (1,9). O contexto nos insinua que os Apóstolos estavam reunidos com o Senhor numa refeição, a qual podemos entender como sendo a Eucaristia e que, logo em seguida, o Senhor foi elevado aos céus. Assim podemos compreender que nós, reunidos para a Eucaristia neste hoje, somos testemunhas do Ressuscitado, que nos instrui pela Sua Palavra, parte o Pão que é Seu Corpo para nós, e que se vai em sua presença física quando comemos o Seu Corpo para ficar em nós pela presença do Seu Espírito Santo, o Paráclito prometido.
Deu-lhes esta ordem: “Não vos afasteis de Jerusalém” (At 1,4). Como entendermos isso senão como uma ordem para permanecermos em Sua Igreja? Somente na Igreja de Cristo, somente reunidos e orando unanimemente com os Apóstolos, os irmãos e com Maria, a Mãe de Jesus (cf. At 1,14), podemos receber o Espírito Santo prometido. É na Igreja que recebemos o Espírito. Porque é o Espírito como que a alma do Corpo de Cristo, que é a Igreja, Corpo esse que é Deus juntamente com a Cabeça, Jesus Cristo, Senhor nosso. Assim participamos da plenitude divina de Cristo, assentado nos céus, conforme nos diz o Apóstolo: Sim, ele pôs tudo sob seus pés e fez dele, que está acima de tudo, a Cabeça da Igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que possui a plenitude universal (Ef 1,22-23).
Antes de subir de volta para o seu Pai e Deus (cf. Jo 20,17), o Senhor nos deixou ainda uma última ordem, como nos relata o Evangelho de hoje: Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda criatura! Quem crer e for batizado será salvo. Quem não crer será condenado (Mc 16,15-16). Eis a missão da Igreja: anunciar, testemunhar Aquele que se manifestou a Ela, e que subiu aos céus. E essa missão foi, é e será cumprida, até que Ele volte da mesma forma que foi (cf. At 1,11), conforme nos é dito: Depois de o terem adorado, voltaram para Jerusalém com grande júbilo (Lc 24,52) e em outro lugar: Os discípulos então saíram e pregaram por toda parte (Mc 16,20).
Muitas coisas mais se poderiam dizer acerca deste mistério que celebramos hoje, capazes de encher muitos livros; mas, com o que foi dito, basta somente acrescentar isto que diz Santo Agostinho: Hoje nosso Senhor Jesus Cristo subiu ao céu; suba também com ele o nosso coração.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Nova fase do Blog: o sopro do Espírito nos renova

No dia de 25 de outubro de 2008, sob a inspiração do Espírito Santo, que, conforme professa a fé católica, é Senhor que dá a Vida e procede do Pai e do Filho, iniciamos este blog. Nosso objetivo inicial era criar um espaço de reflexão sobre o tesouro espiritual da fé cristã. Nesse espaço seriam postados textos de nossa autoria (os colaboradores do blog) e também textos escolhidos dos Padres da Igreja e de outros pensadores, sejam filósofos ou teólogos. E assim começamos tal empresa. Acreditamos que o retorno dado pelo nosso pequeno e fiel grupo de leitores indica estarmos no caminho certo.
No entanto, as sugestões destes mesmos leitores e a reflexão a partir do material produzido por nós nos levaram a querer ampliar os nossos horizontes, a dar passos mais largos. Por isso, a partir de hoje este espaço não será somente um lugar onde possamos encontrar conteúdos espirituais da fé cristã, mas também um espaço (conforme a própria apresentação do blog indica) de leitura da realidade à luz da espiritualidade cristã ortodoxa. Entendamos ortodoxa como fidelidade à ortodoxia da fé presente na Sagrada Tradição e na Escritura, sob a guia e interpretação dos pastores legítimos da Igreja no exercício de seu magistério (o Santo Padre e o Colégio Universal dos Bispos).
Seguiremos a recomendação de S. Paulo: "Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso espírito, para que possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe agrada e o que é perfeito". (Rm 12,2) Acreditamos que a fé deve nos auxiliar a ver a realidade a partir do alto, a partir do prisma divino. Para isso é importante a participação de todos, através de comentários e sugestões.
Outra novidade nessa nova fase diz respeito a nossa identificação, os colaboradores deste blog. Até então, assumimos os Santos Doutores do Oriente Cristão como nossos patronos: Santo Atanásio, São João Crisóstomo, São Basílio Magno e São Gregório Nazianzeno. Esses mesmos patronos foram utilizados também como pseudônimos nossos. Porém, tal recurso foi sentido como um elemento que não proporcionava o contato mais próximo com os nossos leitores. Por isso, decidimos não mais recorrer ao uso de pseudônimos. Todos nós, colaboradores, somos seminaristas da Província Eclesiástica de Maceió, em Alagoas. Santo Atanásio é, na verdade, Bruno Igor, seminarista do 3º ano de Filosofia da Diocese de Palmeira dos Índios; São João Crisóstomo é Henrique Nogueira, seminarista do 2º ano de Filosofia da Arquidiocese de Maceió; São Basílio Magno é Luciano Duarte, seminarista do 4º ano de Teologia da Arquidiocese de Maceió; e São Gregório Nazianzeno é José dos Anjos, seminarista do 2º ano de Filosofia da Diocese de Penedo. Uma terceira e última novidade é a presença de um novo colaborador: Deyvid Caiano, seminarista do 1º ano de Filosofia da Arquidiocese de Maceió. Deyvid estará sob o patrocínio de São Gregório de Nissa.
Continuaremos sob a mística desses Santos Doutores e sob as intuições do Espírito Santo, Dom de Deus Pai, derramado sobre cada um de nós por Seu Filho Jesus Cristo, para que tenhamos a graça de participar da Vida Divina já aqui nesse mundo: Veni Creator Spiritus!

quinta-feira, 21 de maio de 2009

O aleluia pascal

Dos comentários sobre os salmos de Santo Agostinho, bispo

Toda a nossa vida presente deve transcorrer no louvor de Deus, porque louvar a Deus será também a alegria eterna de nossa vida futura. Ora, ninguém pode tornar-se apto para a vida futura se, desde já, não se prepara para ela. Agora louvamos a Deus, mas também rogamos a Deus. Nosso louvor está cheio de alegrias, e nossa oração, de gemidos. Foi-nos prometido algo que ainda não possuímos; porém, por ser feliz quem o prometeu, alegramo-nos na esperança; mas, como ainda não estamos na posse da promessa, gememos de ansiedade. É bom perseverarmos no desejo, até que a promessa se realize; estão acabará o gemido e permanecerá somente o louvor.
Assim podemos considerar duas fases da nossa existência: a primeira, que acontece agora em meio às tentações e dificuldades da vida presente; e a segunda que virá depois n segurança e alegria eterna. Por isso, foram instituídas para nós duas celebrações: a do tempo antes da Páscoa e a do tempo depois da Páscoa.
O tempo antes da Páscoa representa as tribulações que passamos nesta vida. O que celebramos agora, depois da Páscoa, significa a felicidade que alcançamos na vida futura. Portanto, antes da Páscoa celebramos e significamos o que ainda não possuímos. Eis porque passamos o primeiro tempo em jejuns e orações; no segundo, porém, que estamos celebrando, deixando os jejuns, nos dedicamos ao louvor de Deus. É este o significado do Aleluia que cantamos.
Em Cristo, nossa cabeça, ambos os tempos foram figurados e manifestados. A paixão do Senhor mostra-nos as dificuldades da vida presente, em que é preciso trabalhar, sofrer e por fim morrer. A ressurreição e glorificação do Senhor nos revelam a vida que um dia nos será dada.
Agora, pois, irmãos, vos exortamos a louvar a Deus. É isto o que todos nós exprimimos mutuamente quando cantamos: Aleluia. Louvai o Senhor, dizemos nós uns aos outros. E assim todos põem em prática aquilo que se exortam mutuamente. Mas louvai-o com todas as vossas forças, isto é, louvai a Deus não só com a língua e a voz, mas também com a vossa consciência, vossa vida, vossas ações.
Na verdade, louvamos a Deus agora que nos encontramos reunidos na Igreja. Mas logo ao voltarmos para casa, parece que deixamos de louvar a Deus. Não deixes de viver santamente e louvarás sempre a Deus. Deixas de louvá-lo quando te afastas da justiça e do que lhe agrada. Mas, se nunca te desviares do bom caminho, ainda que tua língua se cale, tua vida clamará; e o ouvido de Deus estará perto do teu coração. Porque assim como nossos ouvidos escutam nossas palavras, assim os ouvidos de Deus escutam nossos pensamentos.

sábado, 16 de maio de 2009

O cristão e a angústia - XI

Hans Urs von Balthsar, o maior teólogo do século XX

Apresentamos a última parte da série de textos sobre a angústia segundo a ótica cristã, por Hans Urs von Balthasar, no livro O cristão e a angústia.

Ao representar a grande angústia cristã se deve procurar com o maior cuidado que transpareçam as suas leis determinadas pela Cruz, a sua diversidade da angústia natural, a sua origem na certeza e na alegria da missão e o seu desembocar na vitória da Cruz, mais importante é ainda distinguir sempre, e muito nitidamente, entre esta angústia e o pecado e a angústia do pecado. Está a espalhar-se hoje aquilo que Karl Rahner estigmatizou como a falsa e funesta “mística do pecado” (de que nem um grande escritor como Graham Greene nem o Kranz der Engel de Gertrude von Le Fort ficaram isentos). Defendida sob o pretexto da sinceridade e do antifarisaísmo, esta teoria pretende que na própria culpa tomada voluntariamente sobre si mesmo (por solidariedade com os outros pecadores) haveria um fator de redenção: ora isto está em contradição radical com a verdadeira redenção. Se se desfazem hoje irrevogavelmente (e é bom que assim seja) os quadros de um individualismo cristão, de uma solitária especulação sobre a própria salvação, que para o homem moderno sabem demasiadamente o egocentrismo, nas leis do Evangelho, todavia, não se toca: elas são sólidas e válidas para todas as gerações. Em Deus não há sombra de trevas, e na culpa não existe luz alguma. O Filho de Deus fez-se igual a nós em tudo, exceto no pecado, e este “exceto” é a premissa pela qual Ele pôde tomar sobre si e expiar todos os pecados.
Quem se afasta um milímetro que seja desta doutrina, confunde tudo. O cristão pode cooperar e ser solidário, exatamente na medida em que se liberta do pecado. Angustiar-se com os outros, ele pode fazê-lo, apenas na medida em que, objetivamente, foi liberto da angústia do pecado.
A terceira lei, portanto, será esta: Deus não oferece a nenhum crente a participação (mística, ou mesmo comum) na angústia da Cruz do seu Filho, sem lhe ter dado, primeiro, toda a força da missão cristã, toda a alegria e toda a luz da Fé, da Caridade e da Esperança, isto é: sem lhe ter tirado a angústia do pecado. Ter como possível uma “síntese” das duas angústias, ou tentá-la, é contrário à sã doutrina cristã.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

A verdadeira humildade cristã

Capítulo XV da I Parte de “Na Liberdade da Solidão”
de Thomas Meton

A humildade é uma virtude, não é uma neurose.
Libera-nos para que possamos agir virtuosamente, servir a Deus e conhecê-lo. A verdadeira humildade, portanto, jamais poderá inibir qualquer ação realmente virtuosa. Tampouco pode impedir-nos de nos realizarmos aderindo à vontade de Deus.
A humildade nos torna livres para fazermos o que é verdadeiramente bom, mostrando-nos nossas ilusões e retirando nossa vontade daquilo que era apenas um bem aparente.
Uma humildade que gela nosso ser e frustra toda sã atividade não é, de modo algum, humildade, mas uma forma disfarçada de orgulho. Seca as raízes da vida espiritual, tornando impossível nossa entrega total a Deus.
Senhor, ensinaste-nos a amar a humildade, mas não apredemos. Aprendemos somente a amar-lhe a camada externa – a humildade que torna alguém atraente e encantador. Por vezes, fazemos uma pausa para refletir sobre essas qualidades e muitas vezes fingimos possuí-las e tê-las adquirido “praticando a humildade”.
Se fôssemos realmente humildes, saberíamos até que ponto somos mentirosos!
Ensina-me a aceitar uma humildade que, sem cessar, me faça ver que sou um mentiroso e um fingido, e que, mesmo assim, tenho a obrigação de procurar com esforço a verdade, de ser tão verídico quanto me seja possível, ainda que tenha que achar, inevitavelmente, toda verdade de que sou capaz, envenenada pela duplicidade. Eis o que é terrível a respeito da humildade; nunca tem pleno êxito. Se ao menos fosse possível ser inteiramente humilde aqui na terra! Mas não, aí está o problema. Tu, Senhor, foste humilde. Nossa humildade, porém, consiste em sermos orgulhosos e termos plena consciência disso e nos sentirmos esmagados pelo peso insuportável desse fato, sem nada podermos fazer para remediá-lo.
Como és severo em tua misericórdia, e, no entanto, tens de ser assim. Tua misericórdia tem de ser justa, por que tua verdade tem de ser verdadeira. Contudo, como tu és severo em tua misericórdia; pois quanto mais nos abatemos no esforço de sermos verídicos, tanto mais descobrimos nossa falsidade. Será misericordioso fazer-nos chegar por tua luz, inexoravelmente, ao desespero?
Não – não é ao desespero que me conduzes, mas à humildade. Pois a verdadeira humildade é, de certo modo, um desespero muito real: desespero no que concerne a mim mesmo, a fim de que possa esperar inteiramente em ti.
Quem poderá cair em tamanha escuridão?

Senhor, que eu deseje o que tu desejas

Do capítulo II da II Parte de “Na Liberdade da Solidão”
de Thomas Meton

Senhor meu Deus não sei para onde vou. Não vejo o caminho diante de mim. Não posso saber com certeza onde terminará. Nem sequer, em realidade, me conheço, e o fato de pensar que estou seguindo a tua vontade não significa que, em verdade, o esteja fazendo. Mas creio que o desejo de te agradar te agrada realmente. E espero ter esse desejo em tudo que eu faço. Espero que jamais farei algo de contrário a esse desejo. E sei que, se assim fizer, tu me hás de conduzir pelo caminho certo, embora eu nada saiba a esse respeito. Portanto, sempre hei de confiar em ti, ainda que me pareça estar perdido e nas sombras da morte. Não hei de temer, pois estás sempre comigo e nunca me abandonarás, para que eu enfrente sozinho os perigos que me cercam.

domingo, 10 de maio de 2009

Igreja católica: “A cidade de Deus” na Terra


Quantas tentativas vãs! Quantas frustrações por não chegarem ao fim desejado! E quanto mal camuflado de bem! “Eles”, ainda, tentaram construir uma sociedade universal. Tinham fins louváveis. A saber, promover a unidade do gênero humano, a justiça e a paz social. Mas, seus meios são incapazes de fazê-los alcançar tais fins verdadeiramente. E isso a história nos prova. Seus meios consistiam na enganação e imposição. Enganar a quem? Impor o que? Enganar a seus próprios cidadãos. E impor suas próprias vontades, não o bem comum. Enganaram, quando eles, querendo estabelecer seus interesses próprios, mesmo que com intenções relacionadas a seus fins universais, se vestiram com a melhor capa de bondade, fraternidade humana e se diziam defensores do bem comum, quando na verdade, buscaram autopromoção social e, consequentemente, autoritarismo. E assim, enganaram o povo cidadão! Impuseram, quando eles, movidos pela sede de poder e domínio universal e extirpando qualquer forma de altruísmo, se preocupavam unicamente em expandir seus impérios, sobretudo, tendo as guerras como suas principais armas. E é enganar-se voluntariamente fazer de Augusto César o pioneiro de uma revolução política de significação mundial, ou de Alexandre Magno o apóstolo da fraternidade humana e da unidade do gênero humano, (Gilson, Etienne – A evolução da cidade de Deus. Esta e todas as outras citações neste texto).
Alexandre, o grande, do império Macedônio que antecedeu ao império Romano, tinha como ideal conquistar para civilizar, civilizar para unir, mas, não tardou em perceber que somente pela força das armas seu ideal se tornava inalcançável. Por isso, imediatamente introduziu os deuses helênicos na cultura e na religião recém conquistadas a ponto de se impor como um deus. No império Romano, Augusto, não receou a ser igual ao Macedônio, sobretudo, no que diz respeito aos meios e aos fins. Mas, eles sucumbiram; E com eles seus poderes e impérios. Porque eles não eram deuses como se autodenominaram. Morreram e não ressuscitaram.
Mas, é, todavia no império romano e sob o reinado mesmo de Augusto que aparece o pacífico fundador de uma verdadeira ‘sociedade’ universal. Seu nome é Jesus Cristo e Ele é, verdadeiramente, o Rei do Universo. A Ele, e somente a Ele, seja dada a honra, o poder e a glória pelos séculos dos séculos. Amém. Cristo não foi como os outros, somente homem, mas Deus. Perfeitamente homem e perfeitamente Deus, que morreu; mas ressuscitou verdadeiramente. Talvez, com relação aos ideais, aqueles que se autodenominavam “deuses”, em algo coincidia com o ideal de Cristo. A saber, a unidade do gênero humano. Mas, no que diz respeito aos meios para tal fim não há nenhum tipo de coincidência. A história lhe empresta a ambição de unir todos os homens na mesma taça de ‘amor’. Este gênero de taças é bem conhecido. São imperadores que a oferecem e elas são, de início, cheias de sangue.
O único sangue capaz de unir verdadeiramente as pessoas e assim, construir uma sociedade universal é o sangue de Cristo, não porque Ele derramou Seu sangue numa batalha, guerra ou revolução na luta por Seu ideal, mas, por ter derramado Seu sangue por obediência até morrer e morrer numa cruz. Não é em uma força física que deve se fundamentar este tipo de sociedade desejada há tanto tempo por muitos, mas na força do verdadeiro Amor. E foi por amor que Cristo derramou seu sangue. Não, Ele não se rebelou contra o sistema político de Sua época e nem provocou revoltas contra o Estado em um suposto discurso pelo pobre e seus direitos. Nem incitou ninguém a invadir propriedade privada, nem o pobre a lutar pelo que não é de sua posse - não é feita aqui nem um tipo de apologia ao Estado e nem se defende a idéia de que ser cristão é viver nesse mundo fingindo não ver a realidade. A única apologia que é feita é a do Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, não a do “evangelho” de Karl Marx . Cristo diante da realidade política e social na qual, viveu não promoveu lutas revolucionárias entre patrícios e plebeus nem, muito menos, fingiu não ver Sua contrastante sociedade, mas, simplesmente aceitou Sua missão na realidade na qual estava inserido. A saber, a de Servo sofredor, por obediência a Deus Pai e por verdadeiro amor a humanidade. Ele simplesmente foi obediente até a morte e morte de cruz, Àquele que o enviou. E na obediência, Ele provou esse amor. E é o amor de Cristo que une; que torna a humanidade una, pois Ele a faz participar de Sua divindade tornando-a filha adotiva de Deus Pai, no Seu Espírito Santo. Este a une tornando-a em Cristo um só corpo e um só Espírito. Sem a Fé nesta afirmação, como bem mostra a história, é inalcançável a universalidade da humanidade. Mas, se Cristo prega que Seu reino não é deste mundo, não seria estranho ao Evangelho, para os que o acolhem, quererem construir esse modelo universal de humanidade nesse mundo? Sim, seria. Mas, desse modo, os cristãos seriam totalmente estranhos a esse mundo e viveriam numa anomalia, pois viveriam num mundo sendo de outro. É nisto em que consiste a esperança cristã. Afinal, o Reino de Cristo não é desse mundo, não é temporal, mas, sim de uma realidade atemporal, incorruptível e eterna. No entanto, Cristo não abandonou a humanidade às mãos da morte. Ele instituiu a Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica e nela, por Seu Espírito, Ele se faz presente como esperança na terra. E enquanto peregrinos neste mundo só há um meio para se chegar ao fim tão desejado por muitos e em muitos tempos – a universalidade do gênero humano – a Santa Igreja Católica. Ele é a imagem da unidade e universalidade e do Reino de Deus neste Mundo. Afinal, não é por acaso que o nome católico significa universal. Ela é a cidade de Deus na terra. Por isso, erraram e erram todos aqueles que almejam a tais fins, mas, os buscaram ou buscam por meios que não sejam a Igreja de Cristo. Só no Corpo Místico de Cristo haverá verdadeira fraternidade e unidade humana.

sábado, 9 de maio de 2009

Eu sou a videira e vós os ramos - V Domingo da Páscoa


O Tempo Pascal nos faz viver intensamente a realidade de Jesus ressuscitado. Esse acontecimento é a razão da nossa fé, é a razão da nossa existência como cristãos. Agora o ser humano já não é mais escravo do pecado, mas vive a vida no Espírito Santo, o incalculável Dom que Jesus nos oferece na sua Ressurreição.
Na celebração de hoje, Jesus nos fala da parábola da Videira e os Ramos. Jesus é a “verdadeira videira” (Jo 15,1), e nós somos os ramos. Como os ramos não podem viver sem a árvore, assim também nós não podemos viver sem Deus; como os ramos não podem dar frutos sem a árvore, assim também a nossa vida se torna inútil, egoísta e vazia sem Deus. Longe de Deus, o que existe é uma vida miserável; o que existe são “gritos de desespero” (Is 5,7). Mas essa não é a vida que Jesus nos oferece. A vida que Jesus nos oferece não somente nos faz viver a nós, mas também faz viver aos outros, porque Jesus é a vida do mundo. Quem vive a vida em Jesus, é verdadeiramente feliz, produz o fruto do qual o mundo tanto necessita: o amor! Sem esse amor, não existe o Reino de Deus. Nós, que somos os ramos da videira que é o próprio Jesus, temos a obrigação de produzir esse fruto para a vida de todo o mundo, ou seja, estabelecer novas relações com os homens e levar esses homens a estabelecer novas relações com Deus, por meio de Jesus, a Árvore da Vida.
Entretanto, o Senhor nos adverte severamente: “Se alguém não permanece em mim é lançado fora, como o ramo, e seca; tais ramos são recolhidos, lançados ao fogo e se queimam” (Jo 15,6). São palavras duras! Mas ao contrário dos homens, Deus não nos engana jamais. Jesus é muito claro, quando diz: “O machado já está posto à raiz das árvores e toda árvore que não produzir bom fruto será cortada e lançada ao fogo” (Mt 3,10). Esse é o destino do homem que resolveu viver longe de Deus, pois, afastar-se de Deus é morrer, é se condenar. O homem que vive sem Deus não pode produzir frutos, porque ele vive somente para si, no seu mundo egoísta. Jesus nos deu o Dom da sua natureza divina, mas muitos homens não o aceitaram, pois insistem em viver uma vida sem Deus. “Mas eu te plantara como uma vinha excelente, toda de cepas legítimas. Como te transformaste para mim em ramos degenerados de vinha abastarda?” (Jr 2,21) – essa é a queixa de Deus, o Agricultor.
A celebração de hoje vem confirmar a nossa total dependência de Deus, “porque, sem mim, nada podeis fazer” (Jo 15,5). Se vivemos e somos felizes, apesar de tudo, é porque Deus nos ama. Portanto, vivamos a vida que Jesus nos oferece, para “produzirmos frutos para Deus” (Rm 7,4) e para a vida do mundo.

Visita do Papa à Terra Santa

O Santo Padre Bento XVI está em visita à Jordânia e à Terra Santa. Acompanhemo-lo com nossas orações, para que sua viagem seja tranquila e frutuosa, contribuindo para a Paz na terra onde Nosso Senhor viveu.

Oremos pelo nosso Papa Bento:

Que Deus o conserve, lhe dê a vida, lhe faça bem-aventurado sobre a terra e não o entregue nas mãos dos seus inimigos.

Pai-Nosso, Ave-Maria, Glória ao Pai.

Disse o Senhor Jesus e o repetirá até o fim do mundo:
"Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos Céus."



quinta-feira, 7 de maio de 2009

O cristão e a angústia – X

Georges Bernanos
Do livro O cristão e a angústia, de Hans Urs von Balthasar

É preciso que os poetas católicos dispostos a tratar o tema da angústia cristã, sobretudo eles, aceitem que lhes lembremos esta verdade. A sua responsabilidade é grave e tanto mais grave quanto mais peso tiver o seu testemunho na Igreja e fora dela. Quem conhece com alguma profundidade Georges Bernanos não pode sustentar que ele exagera a noite, o desespero e a angústia, objeção que surgirá facilmente a uma leitura superficial.
Basta um relance à sua vida que, de catástrofe em catástrofe, conserva sempre a marca da autenticidade cristã, para que não possamos ter qualquer dúvida a esse respeito. A zona onde radica e donde brota a sua obra fica para além de toda a inclinação à grandiloqüência e de toda a efervescência da paixão (não menos violenta que a do seu antepassado espiritual Bloy): é uma segurança incorruptível nas coisas da Igreja e do sobrenatural, que ele revela com mão objetiva de medico, não querendo produzir sensação nem falsear seja o que for, mas apenas mostrar o que é. O próprio Bernanos conhecia a angústia desde criança, uma angústia que o atormentou e não o largou mais em toda a vida. Mas não impediu a sua extraordinária, vitoriosa, cavalheiresca coragem; em última análise, não foi mais do que uma forma desta coragem: estar nu e indefeso diante de Deus, tal como os santos que descreve. Ele pôde assim, no ano da sua morte, atingir uma profundidade em que não são exageradas nem blasfemas estar palavras do seu diário: “Nós queremos realmente o que Ele quer, nós queremos verdadeiramente, sem o sabermos, os nossos sofrimentos, a nossa dor, a nossa solidão, julgando querer unicamente a nossa alegria. Imaginamos que fugimos da morte, e na verdade queremos esta morte, como Ele quis a sua. Como Ele se imola em cada altar onde se celebra a Missa, assim recomeça o morrer de novo em cada homem na agonia. Nós queremos o que Ele quer, mas não sabemos aquilo que queremos, não nos conhecemos, o pecado faz-nos viver à superfície, só entramos em nós para morrer, e é lá que Ele nos espera”.
A novela de Gertrud Von Le Fort “Die Letzte am Schaffott” (A Última no Patíbulo) já é mais uma problemática: não pela descrição da angústia mística e do sacrifício nela consumado na extrema debilidade, nem pela contraposição desta “pequena debilidade” ao heroísmo viril da mestra das noviças, que, aliás, no fim das contas, não é escolhida para o sacrifício; mas, pela maneira como em Blanche de la Force uma angústia natural, inata e mesmo claramente neurótica, vai constituir a base de uma angústia mística, ou pelo menos desemboca nela sem solução de continuidade. A angústia de Blanche é “predisposição” e é posta em relação com o seu nascimento, ocorrido durante um pânico popular: “desde muito cedo que ela dá mostras de uma ansiedade que excede em muito a que por vezes se observa nas crianças”. “A escada não escorregará?... Não cairá a parede? A gôndola não se afundará? Não se irão as pessoas zangar?”, pergunta continuamente a rapariguinha. Mais tarde, encontra “pequenos expedientes, que serve ao menos para disfarçar o medo... Blanche mostrava-se subitamente cansada ou indisposta, tinha-se esquecido de ir buscar ou de aprender isto ou aquilo, numa palavra: conseguia achar um pretexto para não entrar na gôndola ou subir a escada”. A entrada no Carmelo ao princípio é claramente uma fuga da angústia para a segurança, e é no meio desta ansiedade neurótica, deste “medo do medo”, que vem surpreendê-la a vocação para a autêntica angústia mística. Não é que uma tal vocação possa ser dada unicamente a naturezas fortes e serenas e não a caracteres ansiosos. Mas, neste segundo caso, deve atender-se a não estabelecer uma continuidade, mais, deve até suprimir-se a aparência desta continuidade, porque entre o obscurecimento da angústia natural neurótica e o outro tão diverso, da angústia sobrenatural, insere-se sempre a luz e a serena força vocação.


Getrude von le Fort

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Espaço sagrado: lugar da manifestação de Deus


O mundo atual está repleto de apelos que nos bombardeiam através de todos os sentidos. Dentre esses sentidos nenhum outro sofre tantos apelos como a visão e a audição. Há um excesso de informações em tempo real pela via cibernética e há também os apelos visuais e a multiplicidade de sons nas ruas das nossas cidades. Nesse contexto, onde repousar o nosso olhar? Onde pararmos para contemplar o silêncio? Onde experimentar o vazio que nos coloca em contato com nossa interioridade?
O lugar por excelência para esse verdadeiro momento sabático dos nossos sentidos deveriam ser os nossos templos. No entanto, o que vemos hoje em nossas igrejas nada mais é do que a transposição dos mesmos apelos visuais e sonoros do mundo profano. Quem adentra em nossos espaços sagrados em busca de descanso, perceberá nossas igrejas repletas de banners, flores artificiais, murais, cortinas, imagens – às vezes de gosto duvidoso – em excesso. Tudo concorre à dispersão, tudo leva à superficialidade de um mundo que já não sabe mais encontrar a Beleza no silêncio e no vazio.
O espaço sagrado surgiu para ser um lugar de encontro. Não um encontro forjado pelo homem, mas o encontro cuja iniciativa é do próprio Deus, que ali se manifesta. No Antigo Testamento, a tenda e, posteriormente, o templo eram lugares por excelência de teofanias. “Entremos no lugar em que Ele habita” (Sl 131, 7a). Por isso eram lugares também de repouso, porque lugares repletos de Deus; e só em Deus a nossa alma encontra descanso (cf. Sl 61,2).
Na plenitude dos tempos, o Verbo encarnado revela-se como o verdadeiro templo. De fato, por seu esvaziamento, por sua aniquilação, na humanidade por Ele assumida, Cristo foi totalmente revestido da vida nova no Espírito na ressurreição. “Nele habita corporalmente a plenitude da divindade” (Cl 2,9). Por isso Cristo é verdadeiramente o lugar da teofania de Deus. Esvaziado de si na sua humanidade, Jesus tornou-se o espaço da manifestação de Deus por excelência.
Os nossos templos devem ser sacramento desse esvaziamento do Verbo eterno feito homem. Espaços simples, vazios do supérfluo, do demasiadamente mundano, para que Deus ali possa manifestar-se, possa falar ao nosso coração. E no encontro com a Beleza do essencial, que eleva o nosso olhar e purifica os nossos ouvidos, possamos exclamar como o salmista: "Minha alma desfalecida se consome suspirando pelos átrios do Senhor. Meu coração e minha carne exultam pelo Deus vivo"(Sl 83,3).

segunda-feira, 4 de maio de 2009

O padre diocesano: sinal encarnado da Palavra de Deus


O padre diocesano é por excelência o homem da palavra. Porém, não é homem de qualquer palavra, mas o homem portador da própria palavra de Deus. Os anos dedicados ao estudo da Sagrada Escritura, coleção de livros que contém a palavra de Deus, devem levar o candidato ao sacerdócio e futuro ministro da palavra a uma espiritualidade essencialmente inebriada pela força viva da Palavra de Deus.
Pe. Henri Nouwen nos diz que o seminarista, estudante de teologia, ao dedicar o seu tempo ao conhecimento dos mistérios divinos, não tem como objetivo possuir Deus. Ao contrário: à medida que mergulha nas profundezas da revelação, o estudioso da teologia deve se deixar possuir por Deus. Da mesma forma, o futuro padre e aquele que já exerce o ministério sacerdotal devem estudar a palavra de Deus não para ser detentor dessa Palavra, dominá-la, dissecá-la como quem lida com manuscritos antigos. Mas aquele que se aproxima da Palavra vinda do alto deve ser inebriado por essa Palavra. A Palavra de Deus é uma pessoa, o Verbo feito carne. Por isso, lidar com os textos sagrados é buscar revestir-se dos sentimentos e atitudes de Cristo presente em cada letra da Bíblia.
No Antigo Testamento, a experiência profética é marcada por homens experimentados pela força da palavra. Daí a imagem riquíssima do rolinho engolido por Ezequiel (cf. Ez 3,1-3). Somente nutridos da palavra, os profetas poderiam anunciá-la. Somente imbuídos da Palavra os profetas podiam fazer a leitura da realidade do povo de Deus a partir do alto, colocando-a dentro do plano salvífico de Deus.
Na plenitude dos tempos, podemos afirmar que a palavra não somente nutre o ministro ordenado. A palavra de Deus, por seu Espírito, faz morada naquele que é separado para estar unido à pessoa de Cristo Cabeça da Igreja. Podemos falar aqui de uma hipostatização da palavra de Deus em cada sacerdote. Em outras palavras: no dinamismo do Espírito, a palavra de Deus se encarna em cada pessoa ordenada para o sagrado ministério. Enxertado na Palavra, o padre diocesano torna-se sinal vivo da vontade de Deus, lendo a vida e os fatos de seu povo a partir do próprio Deus.
É verdade que essa experiência da palavra de Deus é uma realidade compartilhada por todos os cristãos, uma vez que todos participam da vida de Cristo e da tríplice missão de ensinar, reger e santificar. No entanto, tudo aquilo que se aplica aos cristãos, assume outra conotação naqueles chamados ao serviço sacerdotal. Estes se configuram a Cristo como pastor. E esta configuração deve levar o padre diocesano a ser aquilo que Cristo é: encarnação da Palavra.
O mundo nunca teve tanta sede da palavra de Deus. E Nesse mundo sedento, o padre deve ser aquele que não somente anuncia a palavra, mas alguém que a torna presença viva, nos seus atos, no seu modo de viver, na sua experiência de oração; e principalmente quando parte o pão da Palavra presente nas Letras Santas em cada Eucaristia. E para isso não há outro caminho para o padre diocesano: estudo e leitura orante da Sagrada Escritura.

domingo, 3 de maio de 2009

Cristo disse: “Eu sou o Bom Pastor” - IV Domingo do Tempo Pascal

Cristo por nós foi tentado, sofreu e na cruz morreu. Ele foi obediente e humilhou-se até a morte e morte de cruz. Por isso, Deus O exaltou sobremaneira e deu-lhe o nome mais excelso e mais sublime e elevado muito acima de outro nome (Fl 2,8-9). Nosso Senhor Jesus Cristo por sua paixão, morte e ressurreição nos tornou de dignos de chamar Deus de pai. Por Ele, no Seu Espírito que santifica e dá a vida, a humanidade permanece numa aliança eterna com a divindade. E em Cristo podemos ser chamados de Cristãos. Isto porque, enquanto peregrinos nesse mundo, reconhecemos Cristo como único salvador e exemplo de vida a ser seguido. É à vida de Cristo que devemos configurar a nossa, sacrificando-a diariamente por amor a Deus na Santa Igreja, corpo místico do próprio Cristo. Nela, cheios do Espírito Santo, nos identificamos totalmente a Cristo; em sua paixão e morte. Mas, como Ele, se formos obedientes verdadeiramente como Ele o foi e guardarmos Seus mandamentos, também o Pai nos ressuscitará. Irmãos, sendo cristãos verdadeiramente, tenhamos fé e a traduzamos em obras. A saber, amando-nos uns aos outros, como ele nos amou e nos mandou. Mas, como é difícil nos identificar a Cristo a tal ponto! A dor é grande porque requer nossa morte, para que, ao invés de vivermos para nós mesmos, Cristo viva em nós e nós Nele. E Ele disse: Quem quiser me seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz e me siga (Mt 16,24). E, como cristãos, sofremos, no tempo presente as mesmas dores de uma mulher num parto. No entanto, nó cremos n’Aquele que é, que era e que vem; o único digno de ser chamado Salvador do mundo, pois, em nenhum outro há salvação, porque debaixo do céu nenhum outro nome foi dado aos homens, pelo qual devamos ser salvos ( At 4,12); e Ele é o sentido de nossas tribulações. É por Ele e Nele, na esperança da vida eterna, que as suportamos. E sendo Cristo nossa fé e nossa esperança é também Aquele que nos conduz. No mais, hoje, Deus que um dia se fez homem, é verdadeiramente nosso pastor e nós somos suas ovelhas. Nós, que outrora vivíamos desnorteados sem esperança no mundo por causa de nossa própria prepotência, já temos Deus conosco. E por isso, nossas vidas têm sentido. Já não devemos caminhar cegamente, como antes, fechados a nós mesmos, mas abertos para Deus. Assim, Ele nos conduzirá, como um pastor que conduz suas ovelhas. Sim, somos a imagem da ovelha, frágil que não sabe caminhar sozinha, mas precisa de alguém que lhe indique o caminho e que lhe seja o próprio caminho. O caminho para onde? Para a verdade e a vida. Ele se torna nosso pastor e caminho quando nós, auxiliado pelo Espírito Santo, vivemos para Ele, esvaziando-nos de mesmos. Desse modo, não mais seremos pastores de nós mesmos, mas Cristo será nosso único e verdadeiro pastor. E ele nos ama de tal modo que doou sua vida a nós, por que o verdadeiro pastor é aquele que dá a vida por suas ovelhas. Ele não só nos deu a vida, mas vive conosco, pois, permanece em nós: pelo Espírito que nos deu e assim podemos afirmar como o salmista: Ainda que eu atravesse o vale escuro, nada temerei, pois estais comigo. Vosso bordão e vosso báculo são o meu amparo (Sl 22,4). Eis, irmãos o caminho para a verdade e para a vida, o próprio Cristo! Somente Nele viveremos e suportaremos esta vida presente em vista da vida futura. É só reconhecendo-O como nosso pastor e deixando-O conduzir nossas vidas, que chegaremos à verdadeira felicidade. A saber, contemplar Deus, na eternidade, face a face. À felicidade eterna só chegaremos se formos levados por Cristo em Seus ombros e sentindo o consolo de Seu abraço. Como o pastor leva as ovelhinhas à melhor das pastagens e alimenta-as, Cristo nosso bom pastor, além de nos conduzir se faz alimento e para nós. 

sábado, 2 de maio de 2009

Símbolo Atanasiano

Na memória de Santo Atanásio, oferecemos a você, caro leitor, esta síntese da fé católica elaborada pelo Santo Doutor.

Quem quiser salvar-se deve antes de tudo professar a fé católica.
Porque aquele que não a professar, integral e inviolavelmente, perecerá sem dúvida por toda a eternidade.
A fé católica consiste em adorar um só Deus em três Pessoas e três Pessoas em um só Deus.
Sem confundir as Pessoas nem separar a substância.
Porque uma só é a Pessoa do Pai, outra a do Filho, outra a do Espírito Santo.
Mas uma só é a divindade do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, igual a glória, coeterna a majestade.
Tal como é o Pai, tal é o Filho, tal é o Espírito Santo.
O Pai é incriado, o Filho é incriado, o Espírito Santo é incriado.
O Pai é imenso, o Filho é imenso, o Espírito Santo é imenso.
O Pai é eterno, o Filho é eterno, o Espírito Santo é eterno.
E contudo não são três eternos, mas um só eterno.
Assim como não são três incriados, nem três imensos, mas um só incriado e um só imenso.
Da mesma maneira, o Pai é onipotente, o Filho é onipotente, o Espírito Santo é onipotente.
E contudo não são três onipotentes, mas um só onipotente.
Assim o Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é Deus.
E contudo não são três deuses, mas um só Deus.
Do mesmo modo, o Pai é Senhor, o Filho é Senhor, o Espírito Santo é Senhor.
E contudo não são três senhores, mas um só Senhor.
Porque, assim como a verdade cristã nos manda confessar que cada uma das Pessoas é Deus e Senhor, do mesmo modo a religião católica nos proíbe dizer que são três deuses ou senhores.
O Pai não foi feito, nem gerado, nem criado por ninguém.
O Filho procede do Pai; não foi feito, nem criado, mas gerado.
O Espírito Santo não foi feito, nem criado, nem gerado, mas procede do Pai e do Filho.
Não há, pois, senão um só Pai, e não três Pais; um só Filho, e não três Filhos; um só Espírito Santo, e não três Espíritos Santos.
E nesta Trindade não há nem mais antigo nem menos antigo, nem maior nem menor, mas as três Pessoas são co-eternas e iguais entre si.
De sorte que, como se disse acima, em tudo se deve adorar a unidade na Trindade e a Trindade na unidade.
Quem, pois, quiser salvar-se, deve pensar assim a respeito da Trindade.
Mas, para alcançar a salvação, é necessário ainda crer firmemente na Encarnação de Nosso Senhor Jesus Cristo.
A pureza da nossa fé consiste, pois, em crer ainda e confessar que Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, é Deus e homem.
É Deus, gerado na substancia do Pai desde toda a eternidade; é homem porque nasceu, no tempo, da substância da sua Mãe.
Deus perfeito e homem perfeito, com alma racional e carne humana.
Igual ao Pai segundo a divindade; menor que o Pai segundo a humanidade.
E embora seja Deus e homem, contudo não são dois, mas um só Cristo.
É um, não porque a divindade se tenha convertido em humanidade, mas porque Deus assumiu a humanidade.
Um, finalmente, não por confusão de substâncias, mas pela unidade da Pessoa.
Porque, assim como a alma racional e o corpo formam um só homem, assim também a divindade e a humanidade formam um só Cristo.
Ele sofreu a morte por nossa salvação, desceu aos infernos e ao terceiro dia ressuscitou dos mortos.
Subiu aos Céus e está sentado a direita de Deus Pai todo-poderoso, donde há de vir a julgar os vivos e os mortos.
E quando vier, todos os homens ressuscitarão com os seus corpos, para prestar conta dos seus atos.
E os que tiverem praticado o bem irão para a vida eterna, e os maus para o fogo eterno.
Esta é a fé católica, e quem não a professar fiel e firmemente não poderá se salvar.

Bispo, doutor e herói da ortodoxia – Santo Atanásio

A Igreja hoje faz memória de um santo de extrema importância para a fé cristã e que nos honra como um dos padroeiros deste blog: Santo Atanásio. Foi através dele que a Igreja fixou, de uma vez por todas, os termos da fé em Cristo como Deus verdadeiro, por sua participação ativa no Concílio de Nicéia. Também foi através de uma carta sua que foi fixado o cânon do Novo Testamento, em 367.
Atanásio nasceu em 295, em Alexandria, no Egito. Extremamente bem dotado, tanto na inteligência quanto nas virtudes, procurou a vida eremítica, tendo como mestre Santo Antão, o pai dos monges, do qual escreveria a biografia, o famoso “A vida de Santo Antão”.
Naqueles tempos, a Igreja recém-liberta das perseguições pelo edito de Constantino, enfrentava um inimigo interno muito poderoso: a heresia de Ário. Este era um sacerdote muito culto, que formulou a teoria de que Cristo não era Deus, mas somente um homem criado como os outros, importante, sem dúvida, mas que não possuía a dignidade divina. Justamente Alexandria, em sua efervescência cultural, era o maior foco dessa heresia. Ora, quando o antigo mestre de Atanásio, Alexandre, foi elevado à dignidade de bispo e patriarca de Alexandria, quis ter Atanásio junto de si para aproveitar-lhe os dotes. E este último acompanhou Alexandre, na qualidade de diácono, ao Concílio de Nicéia, em 325, convocado para julgar as teses de Ário.
No Concílio, Atanásio destacou-se na defesa da ortodoxia da fé, de tal modo que as teses de Ário foram condenadas, e ele atraiu sobre si tanto o beneplácito e a admiração dos católicos quanto o ódio dos arianos. Assim se expressava Atanásio, no seu Símbolo, acerca da fé na divindade de Cristo: “A pureza da nossa fé consiste, pois, em crer ainda e confessar que Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, é Deus e homem. É Deus, gerado na substancia do Pai desde toda a eternidade; é homem porque nasceu, no tempo, da substância da sua Mãe. Deus perfeito e homem perfeito, com alma racional e carne humana. Igual ao Pai segundo a divindade; menor que o Pai segundo a humanidade. E embora seja Deus e homem, contudo não são dois, mas um só Cristo.”
Aproximando-se a morte de Alexandre, e temendo (com razão) ser escolhido bispo em seu lugar, fugiu para o deserto. Mas, tendo Alexandre morrido em 328, escolheram Atanásio para sucedê-lo; mas somente tomou posse da Sé Patriarcal seis meses depois, depois de ser achado em um esconderijo e ser conduzido, entre lágrimas e triunfalmente, pelo povo, até sua Sede.
Feito bispo, Atanásio foi modelo de pastor: firme e resoluto nas decisões, defensor incansável da fé católica, governou exemplarmente sua Igreja. Mas a oposição ariana era grande e conchavos políticos envolvendo os imperadores fizeram com que fosse exilado quatro vezes de sua diocese. Foi cercado de toda a sorte de infâmias e falsas acusações, saindo triunfante de todas elas. Da última vez, foi reconduzido ao seu rebanho, o qual apascentou até a morte, em 373. São Gregório Nazianzeno fez-lhe este grande elogio: “Atanásio foi uma coluna da Igreja e o modelo dos bispos”. Herói da ortodoxia cristã, grande doutor da Igreja, Atanásio consumiu sua vida inteiramente por Cristo. Por isso é para nós grande modelo de santidade. Confessemos, pois, a fé verdadeira, como Santo Atanásio nos ensinou e que ele rogue por nós para sejamos fiéis até o fim à santa fé católica.
Santo Atanásio, rogai por nós!

sexta-feira, 1 de maio de 2009

O gérmen do pecado


De muitos modos e maneiras Deus nos falou outrora pelos seus santos e profetas. Ele quis desde sempre que estivéssemos com Ele como filhos e criaturas feitas à imagem de sua própria natureza (Sb 2,23). No entanto, nossos primeiros pais pecaram por desobediência se colocando no lugar de Deus. Eles foram tentados e, na tentação, o orgulho lhes fechou olhos e coração. Eles confundiram a realidade aparente com a verdadeira realidade. Não quiseram enxergar a bela criação de Deus como elas são de fato segundo a vontade de Deus, mas passaram a vê-las de acordo com suas próprias vontades. Eles quiseram ser Deus. E só conseguiram ser meras criaturas frágeis necessitados da graça de Seu criador. O pecado mostrou-os quem o são realmente. Mas, não seria nosso fim, como filhos de Deus e carregando a imagem Dele impressa em nossa alma, pois Ele nos criou à sua imagem e semelhança, de sermos deuses também? É verdade que fomos feitos para sermos deuses. E isso Cristo nos mostrou na Sua encarnação. Com efeito, Deus se fez humano para tornar a humanidade divina. Mas, em que consiste, então, o pecado de nossos primeiros pais? Não seria justo eles quererem ser como deuses, já que é este seu fim? Eles erraram quando quiseram se tornar deuses por suas próprias forças. Não teria, Deus, no momento da criação colocado neles o gérmen de Sua divindade imprimindo Seu Espírito na alma deles? Tendo sido impressa a imagem de Deus em suas almas, seria necessário, ainda, por meio de um próprio esforço inútil, nossos primeiros pais buscar a divindade que estava tão perto deles, ou melhor, que estava com eles e neles? Eis, meus irmãos o gérmen do pecado! Não reconhecer Deus como Deus e, sobretudo, não reconhecê-lo como amor. Se nossos primeiros pais enxergassem o Deus amor, eles bem saberiam que não seria necessário tentar roubar a divindade que Deus concede como dom, porque nos ama verdadeiramente. Muito bem afirma o salmista: “Se o Senhor não construir a nossa casa, em vão trabalharam seus construtores... é inútil levantar de madrugada ou a noite retardar vosso repouso, para ganhar o pão sofrido do trabalho, que a seus amados Deus concede enquanto dormem (126(127)). Eles não confiaram em Deus. Não foram fiéis à Sua Palavra. Por isso, desobedecendo-O, perderam a identidade e dignidade de filhos de Deus. Eis o gérmen da primeira culpa! Eis o nosso pecado! Não caiamos neste mesmo erro, irmãos queridos. Esforcemo-nos, pois, para enxergarmos a nós mesmos e assim enxergando-nos em nossa integridade, na intimidade de nossa alma, encontremos a imagem de Deus lá escondida. Encontrando-O, identifiquemo-nos com Ele, por meio de uma continua ascese. Dessa vez, não por um esforço prepotente e, por isso inútil, com o fizeram outrora, mas, pela força do Espírito Santo que vem nos elevar até Deus. Pois, Deus Pai enviou Seu único Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, ao mundo para que por Sua morte, nos libertasse do poder da morte e escuridão do pecado. E pela  paixão, morte e ressurreiçao de Cristo nos foi dada de volta a identidade que perdemos em nossos primeiros pais. A saber, a diginidade de sermos filhos e amigos de Deus