Tamanha é a grandiosidade do mistério celebrado no Natal – o aparecimento do Filho de Deus no meio dos homens – que tal solenidade estende-se por oito dias e culmina com a terceira grande festa do tempo de Natal: a solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus. Mas, quem imagina que a principal personagem celebrada nesta festa é a Santíssima Virgem, engana-se. Basta um olhar mais aprofundado no título desta solenidade para compreender-lhe o sentido: o menino há oito dias nascido em Belém, filho de Maria, é o Deus perfeito; Aquele que nasceu de uma mulher, conforme nos disse a Carta aos Gálatas (4,6), é o Filho de Deus, o Verbo de Deus, como ouvimos na Liturgia do dia do Natal: Verbo que era no princípio, que estava com Deus, que era Deus (cf. Jo 1,1). Pois bem, aquela criançinha choramingando no presépio e que hoje, oito dias depois, foi circuncidada e recebeu o nome de Jesus (cf. Lc 2,21), é o Deus bendito por quem foram feitas todas as coisas (cf. Jo 1,3).
A festa de hoje, portanto, proclama o dogma fundamental da nossa fé: a divindade de Cristo, que é, ao mesmo tempo, homem. Este dogma foi proclamado solene e triunfalmente após o Concílio de Éfeso, em 431. Naquela época, a heresia do Nestorianismo, que pregava que em Cristo subsistiam duas pessoas, uma divina e outra humana, estava amplamente difundida. Em decorrência disso, Maria seria mãe da pessoa humana de Cristo, seria apenas Christotokos. Reunidos num Concílio em Éfeso, cidade da Ásia Menor, os bispos da Igreja seguiram a doutrina já apontada por Inácio de Antioquia, Orígenes, Atanásio e João Crisóstomo, dizendo que em Cristo existe apenas uma pessoa divina, na qual subsistem duas naturezas, uma divina e uma humana, as quais, como definirá a seguir o Concílio de Calcedônia (451) estão juntas “sem confusão nem mudança, sem divisão nem separação”. Todo este ensinamento estava incluso no título que se deu à Virgem Maria: Theotokos, Mãe de Deus, já que não se pode separar o Jesus divino do Jesus humano. Dessa forma, Maria é verdadeiramente Mãe de Deus, a segunda Pessoa da Santíssima Trindade, em sua natureza humana.
No sentir da Igreja, no entanto, mais importante do que a maternidade divina de Maria, foi sua fé em Deus. O Senhor Jesus já tinha dito quando uma mulher lhe disse: “Felizes as entranhas que te trouxeram e os seios que te amamentaram!”: “Felizes, antes, os que ouvem a palavra de Deus e a observam” (Lc 11, 27-28). É isso que vemos com clareza em toda a história da anunciação e do nascimento de Jesus: todos aqueles fatos extraordinários geraram em Maria uma mais entranhada fé e confiança em Deus, que nela havia já cumprido as extraordinárias promessas do nascimento miraculoso do Messias e, por isso, ela meditava todos esses fatos em seu coração. Em outras palavras, ela procurava compreender a ação de Deus nos acontecimentos de sua vida, de forma que estivesse melhor preparada para dar as respostas adequadas quando se pusessem os questionamentos que a nossa carne humana, tão débil, nos faz ter nos tempos de crise. Sem dúvida, pela meditação nas palavras e nos acontecimentos extraordinários que viveu, a Virgem Mãe foi crescendo em sua fé em Deus e em seu amor pelo Filho maravilhoso que tinha gerado miraculosamente. Assim, ela é para nós modelo de fé e de escuta da Palavra de Deus; ao contemplar extasiada o fruto bendito de seu ventre reclinado sobre o presépio, ela é também o modelo de perfeita contemplativa para os cristãos, que deveriam, da mesma forma, aprender a contemplar as maravilhas de Deus, sobretudo Aquela grande maravilha deitada no presépio, dormindo o sono profundo e tranquilo dos inocentes.