
No calvário só Cristo é a vítima; quem se encontra na sua vizinhança ou é, como o ladrão, crucificado com justiça em razão de seus delitos, ou (sempre e de qualquer maneira) culpado pela crucificação de Cristo. Qualquer participação real e objetiva na angústia da cruz do Senhor só poderá ter, subjetivamente, este caráter de parcialidade que separa como um abismo, a angústia de Cristo da angústia do Cristão: aquele que sofre por uma graça concedida, é, apesar de tudo, sempre um pecador manchado ao menos pela culpa hereditária. Não quer dizer que a sua qualidade de pecador lhe seja expressamente manifesta como ocasião da angústia: pode acontecer que permaneça escondida, tal como a luz sobrenatural que é preciso deixar incondicionalmente à vontade de Deus. Mas, mesmo neste caso, nunca será tentado a confundir a sua angústia com a do Senhor; suportá-la-á, solitário, no lugar que lhe foi destinado e numa obediência para ele próprio inexplicável.
Podemos por conseguinte, e em resumo, formular uma segunda lei:
Enquanto somos pecadores, e podemos sempre voltar a sê-lo de novo, ainda como crentes, a objetiva ação redentora da Cruz não aboliu simplesmente a angústia do pecado; pelo contrário, esta é posta diante de nós, mesmo na Nova Aliança. Podemos deixá-la atrás de nós, na medida em que verdadeiramente nos aproximamos da Fé que a Cruz nos oferece; fé viva, isto é: que forme a nossa vida. Todavia, ainda que nos seja concedida a graça de sofrer a angústia da Cruz, permanece respeitada a distância que há entre quem não faz mais do que participar do sofrimento e Quem sofreu a sua Paixão redentora; e desta distância é consciente quem sofre a angústia.
No que acabamos de dizer está implícita uma terceira asserção que deve ser ainda expressamente considerada. Se é verdade que a angústia participante na cruz é um fruto especial nascido de um dom da fé, da caridade e da esperança, e uma particularíssima intensificação das mesmas, concedida por Deus, então é impossível que um homem passe diretamente da angústia do pecado para a angústia da Cruz. Em outras palavras: o mistério do obscurecimento na angústia da Cruz, está, sob o ponto de vista teológico, necessariamente enquadrado no mais amplo mistério da redenção cristã do pecado como da angústia do pecado e, por aí, na alegria cristã. Uma autêntica participação, segundo a vontade de Deus, na noite do Crucificado será, pois, sempre um episódio inserido entre uma e outra luz, entre uma e outra alegria, entre uma e outra força.
É, não só improvável, mas intrinsecamente impossível, que Deus chame um homem da angústia do pecado para a angústia da Cruz, sem que este tenha experimentado plenamente a alegria cristã. Isto vale antes de tudo para a noite mística propriamente dita, que não se pode interpretar cristãmente senão numa referência à Cruz: não como um fenômeno de “purificação” posta no início de uma via espiritual, mas sim, e em primeiro lugar, como uma graça cristã, e portanto social, que é administrada por Deus somente, e que pode, por conseguinte, ser imposta em todas as etapas da vida espiritual, com a limitação, porém, que é concedida unicamente a quem tenha chegado a conhecer a luz de Deus na fé, na caridade e na esperança até aos mais profundos recantos da alma. Porque tal “noite” outra coisa não é senão a privação desta luz; e quanto maior for o contraste, quanto mais completa for a privação, tanto mais profunda e eficaz será a noite. Só o Filho de Deus, gerado desde toda a eternidade no seio do Pai, nutrido com a sua substância, pode avaliar plenamente o que significa ser abandonado pelo Pai. Ainda aqui as mulheres de Betânia nos ensinam: elas não teriam podido sentir a angústia da ausência incompreensível de Jesus, se não tivessem sido suas amigas, se a sua presença santificante não tivesse sido para elas a própria vida. Se isto vale para a grande noite mística e para a grande angústia mística que nela se experimenta, vale de um modo análogo, como que em menor formato, para toda a vida de fé cristã viva: “o conforto” da fé precede sempre o “desconforto”, porque este não pode ser sentido cristãmente senão como privação de uma luz espiritual.
Podemos por conseguinte, e em resumo, formular uma segunda lei:
Enquanto somos pecadores, e podemos sempre voltar a sê-lo de novo, ainda como crentes, a objetiva ação redentora da Cruz não aboliu simplesmente a angústia do pecado; pelo contrário, esta é posta diante de nós, mesmo na Nova Aliança. Podemos deixá-la atrás de nós, na medida em que verdadeiramente nos aproximamos da Fé que a Cruz nos oferece; fé viva, isto é: que forme a nossa vida. Todavia, ainda que nos seja concedida a graça de sofrer a angústia da Cruz, permanece respeitada a distância que há entre quem não faz mais do que participar do sofrimento e Quem sofreu a sua Paixão redentora; e desta distância é consciente quem sofre a angústia.
No que acabamos de dizer está implícita uma terceira asserção que deve ser ainda expressamente considerada. Se é verdade que a angústia participante na cruz é um fruto especial nascido de um dom da fé, da caridade e da esperança, e uma particularíssima intensificação das mesmas, concedida por Deus, então é impossível que um homem passe diretamente da angústia do pecado para a angústia da Cruz. Em outras palavras: o mistério do obscurecimento na angústia da Cruz, está, sob o ponto de vista teológico, necessariamente enquadrado no mais amplo mistério da redenção cristã do pecado como da angústia do pecado e, por aí, na alegria cristã. Uma autêntica participação, segundo a vontade de Deus, na noite do Crucificado será, pois, sempre um episódio inserido entre uma e outra luz, entre uma e outra alegria, entre uma e outra força.
É, não só improvável, mas intrinsecamente impossível, que Deus chame um homem da angústia do pecado para a angústia da Cruz, sem que este tenha experimentado plenamente a alegria cristã. Isto vale antes de tudo para a noite mística propriamente dita, que não se pode interpretar cristãmente senão numa referência à Cruz: não como um fenômeno de “purificação” posta no início de uma via espiritual, mas sim, e em primeiro lugar, como uma graça cristã, e portanto social, que é administrada por Deus somente, e que pode, por conseguinte, ser imposta em todas as etapas da vida espiritual, com a limitação, porém, que é concedida unicamente a quem tenha chegado a conhecer a luz de Deus na fé, na caridade e na esperança até aos mais profundos recantos da alma. Porque tal “noite” outra coisa não é senão a privação desta luz; e quanto maior for o contraste, quanto mais completa for a privação, tanto mais profunda e eficaz será a noite. Só o Filho de Deus, gerado desde toda a eternidade no seio do Pai, nutrido com a sua substância, pode avaliar plenamente o que significa ser abandonado pelo Pai. Ainda aqui as mulheres de Betânia nos ensinam: elas não teriam podido sentir a angústia da ausência incompreensível de Jesus, se não tivessem sido suas amigas, se a sua presença santificante não tivesse sido para elas a própria vida. Se isto vale para a grande noite mística e para a grande angústia mística que nela se experimenta, vale de um modo análogo, como que em menor formato, para toda a vida de fé cristã viva: “o conforto” da fé precede sempre o “desconforto”, porque este não pode ser sentido cristãmente senão como privação de uma luz espiritual.
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