sábado, 2 de agosto de 2014

Revisitando o Concílio – 1



Os textos do Concílio Vaticano II são tão importantes para a Igreja contemporânea – quer gostemos deles quer não, todos temos de admitir – que é necessário revisitá-los com frequência, seja para investigá-los mais a fundo, seja para compará-los com a Igreja atual e ver em quê esta está sendo fiel ao Concílio e em quê não; e se esta fidelidade ou infidelidade traz os frutos materiais e espirituais que os papas João XXIII e Paulo VI, bem como todos os padres conciliares, a Igreja inteira e o mundo esperavam.
Relendo pois os documentos do Concílio, decidi reproduzi-los aqui em alguns trechos que acho fundamentais e comentá-los quando necessário, fazendo uma ligação com o modo como a Igreja está ou não aplicando o trecho em questão. Prescindirei da história dos documentos ou das discussões conciliares dos trechos citados. Limitar-me-ei a estabelecer, quando achar necessário, uma ponte comparativa do trecho pronto com a vida da Igreja atual.
Seguirei a ordem de aprovação dos documentos, começando com o primeiro, a Constituição Sacrossanctum Concilium.
O texto do documento vai caracteres normais. Meus eventuais comentários seguem em itálico, dentro ou fora do corpo do texto.

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A presença de Cristo na Liturgia

(...) Cristo está sempre presente na sua igreja, especialmente nas ações litúrgicas.
Está presente no sacrifício da Missa, quer na pessoa do ministro – “O que se oferece agora pelo ministério sacerdotal é o mesmo que se ofereceu na Cruz” – quer e sobretudo sob as espécies eucarísticas. Está presente com o seu dinamismo nos Sacramentos, de modo que, quando alguém batiza, é o próprio Cristo que batiza. Está presente na sua palavra, pois é Ele que fala ao ser lida na Igreja a Sagrada Escritura. Está presente, enfim, quando a Igreja reza e canta, Ele que prometeu: «Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles» (Mt. 18,20).
Em tão grande obra, que permite que Deus seja perfeitamente glorificado e que os homens se santifiquem, Cristo associa sempre a si a Igreja, sua esposa muito amada, a qual invoca o seu Senhor e por meio dele rende culto ao Eterno Pai.
Com razão se considera a Liturgia como o exercício da função sacerdotal de Cristo. Nela, os sinais sensíveis significam e, cada um à sua maneira, realizam a santificação dos homens; nela, o Corpo Místico de Jesus Cristo – cabeça e membros – presta a Deus o culto público integral.
Portanto, qualquer celebração litúrgica é, por ser obra de Cristo sacerdote e do seu Corpo que é a Igreja, ação sagrada par excelência, cuja eficácia, com o mesmo título e no mesmo grau, não é igualada por nenhuma outra ação da Igreja.

(Sacrossanctum Concilium, 7)

Eis aqui: tudo começa com a liturgia e reflui para ela. Não à toa que o primeiro documento do Concílio trata sobre a Liturgia. Recentemente, também o Papa Bento XVI, ao editar suas obras completas, quis destacar este aspecto primordial da Liturgia na vida da Igreja fazendo com que o primeiro volume publicado fosse sobre seus escritos sobre Liturgia. A Liturgia é a continuação da obra da salvação de Cristo no tempo, realizada através dos Sucessores dos Apóstolos segundo sua ordem;é, portanto, obra do próprio Cristo. Para tanto, o próprio Senhor Jesus se faz presente na Palavra, no ministro sagrado, no povo reunido (“Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome...”), sobretudo nos próprios sacramentos e, de maneira excelsa e sublime, na Eucaristia. Disto decorre que tudo o que a Igreja vive, tudo o que a Igreja é, tudo o que a Igreja faz, tudo o que a Igreja prega, ela própria, enfim, nasce da Eucaristia como de uma fonte e volta para ela como a correnteza de um rio corre para o mar. A Liturgia é a fonte e o mar da vida divina presente no meio de nós.

Que grande mistério: o Senhor está presente no meio de nós, nos falando pela sua Palavra, batizando-nos, perdoando os nossos pecados, nos dando Sua graça em todos os sacramentos; sobretudo, oferecendo-se a Si mesmo, Sacerdote, Hóstia e Altar. Apesar dos percalços por que passamos como Igreja, apesar de tantas dificuldades e perseguições dentro e fora dela, temos essa consoladora esperança: o Senhor não nos deixa só, não nos abandona. Ele está no meio de nós.

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