Antes de nos determos no estupendo Evangelho deste XXI Domingo Comum, Evangelho que encerra o capítulo sexto de São João e o discurso do Pão da Vida, é-nos útil rememorar brevemente este capítulo precioso que escutamos nos últimos domingos e que forma uma sequência precisa, um todo orgânico.Atraídas pelo ensinamento e pela fama de Jesus, muitas multidões vão procurá-lo. Ele teve compaixão delas – eram como ovelhas sem pastor (Mc 6,34) – e realizou a prodigiosa multiplicação dos pães, para que não desfalecessem no caminho. No entanto, ao invés de enxergarem o sinal grandioso realizado por Jesus, as pessoas quiseram fazê-lo rei, um rei que pudesse matar a sua fome, curar suas doenças, lhe dar bem-estar; em suma, um rei terreno. Jesus, cujo reino não é desse mundo (cf. Jo 18,36), esquivou-se deles e partiu para um monte, sozinho, para orar.
De noite, quando os discípulos voltavam para Cafarnaum de barco, sem Jesus, viram-no andando sobre as águas e tiveram medo. Estes dois episódios, o da multiplicação dos pães e o do caminhar sobre as águas, prefiguram simbolicamente o que Jesus dirá a seguir: Ele é o Pão da Vida descido do céu, Pão dado por Deus e não por um homem, Pão que é a própria carne de Jesus. E como Jesus pode dar sua carne e seu sangue para ser comido – já que são ambos verdadeira comida? (Jo 6,55) Ele tem poder sobre os elementos deste mundo (já que multiplica os pães) e sobre seu próprio corpo (ele caminha sobre as águas); assim, através de tal poder, Ele pode cumprir sua promessa de ser alimento para os homens. Mas os judeus e muitos dos seus discípulos não entenderam isso, e escandalizaram-se: “Esta palavra é dura. Quem consegue escutá-la?” (Jo 6, 60) Quem comerá a carne de um homem, mesmo que este homem seja grande e milagroso como Jesus, mesmo que Ele seja o Messias? Tal proposta era absurda para a mentalidade judaica dos seus discípulos. Mas eles não souberam ultrapassar o puramente terreno, não conseguiram enxergar em Jesus o transcendente, o divino. Não compreenderam que “o Espírito é que dá vida, a carne não adianta nada” (Jo 6,63).Um mistério muito grande é o da incredulidade dos discípulos de Jesus: “Entre vós há alguns que não crêem” (Jo 6,64). Por que tantas vezes olhamos para a Igreja e não vemos a transparência dos outros cristos que são os cristãos? Por que não vemos resplandecer na vida de tantos batizados o Dom espiritual que possuem e que lhes dá uma vida de filhos de Deus, uma vida nova? Por que esta vida não se manifesta? Jesus nos oferece a resposta: “Ninguém pode vir a mim, a não ser que lhe seja concedido pelo Pai” (6,65). Não é por nossos próprios esforços, não é porque nós somos bons ou melhores que descobrimos os segredos de Jesus, lhe penetramos o Espírito, entendemos o que Ele fala, seguimos o que Ele manda: isso é um Dom dado a nós por Deus Pai. A fé em Cristo é um Dom, não um mérito nosso. E ela é tão fraca, tão pequena! Jesus tinha dito que se crêssemos só um pouquinho, moveríamos montanhas (Cf. Mt 17,20). Mas é comum vermos os cristãos fazendo milagres bem inferiores a mover montanhas? Não vemos e isso acontece porque a fé dos cristãos de hoje é tão pequena, tão pequena, que diante dela, um grão de mostarda é uma montanha. É por isso que devemos pedir a cada dia, a cada hora, a cada instante: “Senhor, aumenta-nos a fé!” (Lc 17,5) Senhor, que nós não sejamos como os discípulos descrentes em vós, que vos abandonam, que não andam mais convosco! Que não sejamos como os que apostatam a fé e se perdem no mundo, que não sejamos como aqueles que mesmo carregando o vosso Santo Nome nos lábios, vociferando “aleluias” e “améns”, não crêem de verdade! Senhor, o nosso desejo é que, do fundo do nosso coração, possamos dizer como Josué, como Pedro: eu e minha casa serviremos ao Senhor, pois a quem nos iríamos?, só Ele tem palavras de Vida eterna, só Ele é o Santo! Que se realize, ó Bom Jesus, ó Pastor de nossas almas, ó Pão da Vida Eterna, que se realize em nossa vida a vossa Santa Palavra, que é Espírito, que é Vida verdadeira! Que nós possamos enxergar na Santíssima Eucaristia, pelo olhar da fé, a vossa presença, o cumprimento da vossa promessa e o penhor de sua realização escatológica! Senhor, aumenta-nos a fé, vós que sois bendito para sempre, e que viveis e reinas com o Pai na unidade do Espírito Santo. Amém.
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