
Hoje a Igreja faz memória de um de seus mais gloriosos santos, São Vicente de Paulo. Ele brilhou como um facho de luz na França do século XVII assolada por guerras e miséria. Apresento uma série de textos que tratam da vida deste grande santo e modelo dos servidores do Evangelho. Nestes nossos tempos em que os pobres são utilizados como cavalo de batalha ideológico, Monsieur Vincent, como era chamado pelos seus contemporâneos, por cujas mãos passavam mais dinheiro do que pelas do ministro das finanças do reino, nos ensina com sua vida e obra como se deve servir aos pobres autêntica e evangelicamente. Boa leitura! E viva o ínclito Vicente!
Introdução
Depois dos apóstolos, talvez não haja nenhum homem que mais tenha prestado serviços à Igreja Católica e à humanidade inteira. Para contribuir à santificação do clero e do povo cristão, ele instituiu uma congregação de missionários que foi digna do autor, e continua a espalhar a fé por todo o mundo.
Para santificação dos sacerdotes e dos fiéis, ele estabeleceu retiros espirituais, cujo uso se espalhou por toda parte. Para a formação de jovens padres, para aperfeiçoar-lhes a santidade e exaltar-lhes a vocação, criou seminários, que se espalharam por todo o mundo cristão.
Aos pobres doentes, ele instituiu a Congregação das Filhas da Caridade, cujo devotamento admirável provocou o estabelecimento de muitas outras congregações semelhantes.
Para preservar da morte as crianças abandonadas pelas ruas, ele fundou um hospital de crianças abandonadas, e hoje, deste seu exemplo, hospitais e outras casas do gênero estão disseminadas por todo o mundo cristão.
Ele fez mais ainda: hospitais para velhos, doentes mentais, presos e mendigos. Enviava missionários com o fim exclusivo de consolar os escravos cristãos. Sustentava com suprimentos, às vezes por longos anos, províncias inteiras que haviam sido devastadas pelas guerras, pela fome ou pela peste, como a Lorena, a Champagne e a Picardia.
E quem era esse homem, esse Vicente de Paulo, esse benemérito? Filho dum lavrador, começou por pastorear o rebanho do pai. Feito sacerdote, foi preso por Corsários turcos e vendido como escravo nas costas da África.
Os inícios
Vicente de Paulo nasceu numa terça-feira de Páscoa, 24 de abril de 1575, na aldeiazinha de Puy, perto de Dax, nos confins de Bordeaux, lá para os Pirineus. O pai chamava-se Guilherme de Paulo, a mãe Bertranda de Moras. Possuíam uma pequena granja, onde trabalhavam e donde tiravam o pão de cada dia, para si e para os seis filhos, duas meninas e quatro meninos.
Vicente, que era o terceiro, trabalhava, como os outros, na propriedade: guardava, como vimos, o rebanho, levando-o a pastar. Desde pequeno, sentia compaixão pelos pobres. Quando voltava do moinho, com o saco de farinha nas costas, dava alguns punhados aos pobres, quando não tinha outra coisa para dar. Muitas vezes, com eles, partilhou o pão que comia e as vestes que usava. Tendo economizado, certa vez, trinta sous, quantia considerável naquela época e para aquela idade, deu tudo a um pobre, que lhe parecia ser o mais abandonado de todos.
Com essa bondade de coração, mostrava grande vivacidade de espírito. O pai, então, resolveu fazê-lo estudar. A despesa seria espantosa, mas esperava que um dia fosse recompensado. Assim, enviou-o aos franciscanos de Dax, pagando sessenta libras por ano, segundo o costume do tempo e do país.
Era, então, pelo ano de 1588. O jovem Vicente, com apenas 13 anos fez tantos progressos, que, ao fim de quatro anos, foi aceito como preceptor dos dois filhos de um certo senhor De Commet, advogado de Dax, por indicação do superior do convento.
Foi esse De Commet que, tocado e edificado pela virtude de Vicente, o aconselhou a ser padre.
Vicente, que o respeitava muitíssimo, tendo-o como a um segundo pai, recebeu o conselho com ardor, e depois a tonsura e as quatro ordens menores em 20 de dezembro de 1596, com a idade de vinte anos, após ter empregado nove nos estudos em Dax.
O pai, para ajudá-lo, teve que vender uma junta de bois, e Vicente foi para Toulouse, para os estudos de teologia, nos quais gastou sete anos.
Durante a estadia em Toulouse, o jovem ia, algumas vezes, estudar em Saragoça.
Para não pesar à família, embora o pai, ao morrer, ordenasse que lhe dessem o dinheiro necessário, Vicente retirou-se para a cidadezinha de Busset, durante as férias, ali se encarregando da educação dum número considerável de crianças, cujos pais tinham posses, e se sentiam satisfeitos de poder confiar os filhos a um homem do qual a virtude e a capacidade eram publicamente reconhecidas e divulgadas. Mesmo de Toulouse, enviavam-lhe crianças, meninos e meninas, como se vê por uma carta escrita por ele à mãe.
Entre os alunos, havia dois sobrinhos-neto do célebre Jean de La Valette, grão-mestre de Malta, que resistiu gloriosamente a todas as forças otomanas.
O Duque de Épernon, governador da Guiana, parente próximo dos dois meninos, desejou, e muito, conhecer Vicente, Monsieur Vicente, como dizia respeitosamente, por ele vindo a conceber grande estima.
Vicente retornou de Busset a Toulouse com os pensionistas, terminando, então, seus estudos de teologia. Bacharel, dizem dele os autores da Gallia Christiana: “Era doutor em teologia”. Contudo, a prova autêntica daquela afirmação não foi encontrada.
Durante os estudos de teologia em Toulouse, Vicente recebeu o subdiaconato, em 19 de setembro de 1598, o diaconato três meses depois, e, finalmente, a ordenação, em 23 de setembro de 1600.
Os grandes padres de Dax, estando vaga uma das sedes, escolheram-no para a paróquia de Tilh, mas um competidor, que havia requerido tal paróquia em Roma, acabou por lhe tomar o lugar. Vicente, desejoso de paz para continuar os estudos em Toulouse, não deu a mínima importância à questão. Até porque lhe prometiam algo mais importante, que pleiteavam com a mediação do Duque de Épernon. Efetivamente, Vicente fez, no começo de 1605, uma viagem a Bordeaux, e teve uma entrevista com o duque, sem que se soubesse por que objetivo fora lá. Somente diz, numa carta daquela época, que havia feito uma viagem de negócios. A sorte parecia sorrir-lhe. De volta a Toulouse, ficou sabendo que um amigo o instituíra herdeiro dos seus bens. Para recolher parte da herança, teve que ir a Marselha.
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