3.4. A formação missionária dos presbíteros
Todos os presbíteros devem receber uma formação missionária específica e cuidadosa, dado que a Igreja quer empenhar-se, com renovado ardor e urgência, na missão ad gentes e numa evangelização missionária, dirigida a seus batizados, de modo particular àqueles que se afastaram da participação na vida e atividade da comunidade eclesial. Essa formação deveria ter início já no seminário, sobretudo mediante a direção espiritual e um estudo cuidadoso e aprofundado do sacra- mento da Ordem, a fim de salientar como a dinâmica missionária é intrínseca ao sacramento.
Aos presbíteros já ordenados muito beneficiará, e pode-se até tornar necessária, a formação missionária, integrada no programa de formação permanente. A consciência, por um lado, da urgência da missão e, por outro, da formação e espiritualidade missionárias talvez insuficientes do presbitério há de indicar, a cada Bispo ou Superior Maior, as medidas que devem ser tomadas para dar início a uma renovada preparação para a missão e a uma mais profunda e estimulante espiritualidade missionária nos presbíteros.
Parece-nos útil destacar que um dos principais aspectos da missão é a tomada de consciência de sua urgência, que inclui o aspecto da formação dos candidatos ao ministério presbiteral, com sua específica vertente missionária.
Se o número de vocações vem crescendo globalmente no mundo, embora ainda modestamente (isso, enquanto sobretudo o Ocidente desperta algumas apreensões), o aspecto absolutamente determinante para o futuro da Igreja é a formação: um sacerdote com uma identidade clara e específica, com uma sólida formação humana, intelectual, espiritual e pastoral, gerará mais facilmente novas vocações, pois viverá a consagração como missão e, contente e seguro do amor que o Senhor tem por sua existência sacerdotal, saberá difundir o «bom perfume de Cristo » ao seu redor e viver cada instante de seu ministério como uma oportunidade missionária.
Mostra-se cada vez mais urgente, então, criar um «círculo virtuoso» entre o tempo da formação no seminário e o do ministério ini- cial e da formação permanente. [37] 37 Esses momentos devem permanecer firmemente unidos e absolutamente harmônicos, para que também nessa obra o clero possa tornar-se cada vez mais plenamente o que é: uma pérola preciosa e indispensável, oferecida por Cristo à Igreja e à humanidade inteira.
Conclusão
Se a missionariedade é um elemento constitutivo da identidade eclesial, devemos ser gratos ao Senhor, que renova, também por intermédio do Magistério pontifício recente, essa clara consciência em toda a sua Igreja, e em particular nos presbíteros.
A urgência missionária no mundo é verdadeiramente grande e exige uma renovação da pastoral, no sentido de que a comunidade cristã deveria conceber-se em «missão permanente», tanto ad gentes como onde a Igreja já está estabelecida, ou seja, indo em busca daqueles que batizamos e têm o direito de ser evangelizados por nós.
As melhores energias da Igreja e dos presbíteros sempre foram empregadas no anúncio do querigma, que é a essência da missão que nos foi dada pelo Senhor. Essa « tensão missionária » permanente não poderá deixar de ser útil também à identidade do presbítero, que, precisamente no exercício missionário dos tria munera, encontra o principal caminho para sua santificação pessoal e, portanto, também para sua plena realização humana.
Além disso, o envolvimento real e efetivo de todos os membros do Corpo eclesial (bispos, presbíteros, diáconos, religiosos, religiosas e leigos) na missão favorecerá a experiência de unidade visível, tão essencial à eficácia de todo e qualquer testemunho cristão.
A identidade missionária do presbítero, para se manter, deve olhar incessantemente para a Bem-Aventurada Virgem Maria, que, cheia de graça, foi levar e apresentar o Senhor ao mundo e que continua, sem- pre, a visitar os homens de todos os tempos, ainda peregrinos neste mundo, para mostrar-lhes o rosto de Jesus de Nazaré, Senhor e Cristo, e para introduzi-los na comunhão eterna com Deus.
Vaticano, 29 de junho de 2010
Solenidade de São Pedro e São Paulo
[1] CONC. ECUM. VAT. II, Decr. Ad gentes, 2; cf. também 5-6; 9-10; Const. dogm. Lumen gentium, 8; 13; 17; 23; Decr. Christus Dominus, 6.
[2] Cf. PAULO VI, Exort. ap. Evangelii nuntiandi (8 de dezembro de 1975), 2; 4-5; 14; JOÃO PAULO II, Cart. enc. Redemptoris missio (7 de dezembro de 1990), 1; ID., Cart. ap. Novo millennio ineunte (6 de janeiro de 2001), 1; 40; 58.
[3] BENTO XVI, falando aos bispos alemães durante a Jornada Mundial da Juventude (2005), disse: «Sabemos que o secularismo e a descristianização estão a alastrar-se, que o relativismo cresce e que a influência da ética e da moral católicas diminui cada vez mais. Não poucas pessoas abandonam a Igreja ou então, se nela permanecem, somente aceitam uma parte do ensinamento católico, escolhendo apenas determinados aspectos do cristianismo. Permanece preocupante a situação religiosa no Leste, onde sabemos que a maioria da população ainda não recebeu o batismo, não mantém qualquer contato com a Igreja e muitas vezes não tem nenhum conhecimento acerca de Cristo e da Igreja. [...] Diletos Irmãos, vós mesmos afirmastes [...]: ‘Nós tornamo-nos terra de missão’. [...] Deveríamos refletir seriamente sobre o modo como hoje podemos realizar uma verdadeira evangelização [...]. As pessoas não conhecem a Deus, não conhecem a Cristo. Existe um novo paganismo e não é suficiente que procuremos manter o rebanho já existente, embora isso seja muito importante; mas impõe-se esta grande interrogação: o que é realmente a vida? Penso que todos juntos devemos procurar descobrir novos modos de apresentar o Evangelho ao mundo contemporâneo, anunciar de novo Cristo e estabelecer a fé » (Disc. no Seminário de Colônia, 21 de agosto de 2005). Ao Clero de Roma, Bento XVI, no início do pontificado, sublinhou a importância da Missão na Cidade, já em andamento (cf. Discurso ao Clero de Roma [13 de maio de 2005]). Em sua viagem ao Brasil, em maio de 2007, para abrir a 5a Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe, cujo tema era « Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que n’Ele os nossos povos tenham vida », o Papa encorajou os Bispos brasileiros a uma verdadeira «missão», voltada àqueles que, mesmo tendo sido batizados por nós, por diversas circunstâncias históricas não foram suficientemente evangelizados (cf. Discurso aos Bispos do Brasil na Catedral da Sé, em São Paulo [11 de maio de 2007]).
[4] Entre os textos da missão encontramos Jo 3,14; 4,34; 5,23-24.30.37; 6,39.44.57; 7,16.18.28; 8,18.26.29.42; 9,4; 11,42; 14,24; 17,3.18; 1 Jo 4,9.14.
[5] Cf. Catecismo da Igreja Católica, 690.
[6] Cf. também JOÃO PAULO II, Exort. ap. pós-sinodal Pastores dabo vobis (25 de março de 1992), 22.
7 Ibid., 12: «A referência a Cristo é, então, a chave absolutamente necessária para a compreensão das realidades sacerdotais ».
[8] Cf. CONC. ECUM. VAT. II, Const. dogm. Lumen gentium, 28.
[9] Cf. Catecismo da Igreja Católica, 1582.
[10] Cf. BENTO XVI, Homilia para a Santa Missa Crismal (9 de abril de 2009); JOÃO PAULO II, Exort. ap. pós-sinodal Pastores dabo vobis (25 de março de 1992), 12; 16.
[11] BENTO XVI, Discurso aos participantes da Plenária da Congregação para o Clero (16 de março de 2009). É, sem dúvida, o batismo que torna todos os fiéis « homens no- vos ». O sacramento da Ordem, portanto, se por um lado especifica e atualiza o que os presbíteros têm em comum com todos os batizados, por outro revela qual é a natureza própria do sacerdócio ordenado: permanecer em tudo orientado para Cristo, cabeça e pastor da Igreja, servir à nova criação que nasce do banho batismal: Vobis enim sum episcopus – afirma Agostinho – vobiscum sum christianus.
[12] Cf. CONC. ECUM. VAT. II, Decr. Presbyterorum Ordinis, 4-6. Sobre os tria munera debruça-se também longamente João Paulo II, Exort. ap. pós-sinodal Pastores dabo vobis (25 de março de 1992), 26.
[13] JOÃO PAULO II, ibid., 32.
[14] Cf. ibid., 26; JOÃO PAULO II, Cart. enc. Redemptoris missio (7 de dezembro de 1990), 67.
[15] Cf. A. VANHOYE, Prêtres anciens, prêtre nouveau selon le Nouveau Testament, Paris 1980, 346.
[16] JOÃO PAULO II, Exort. ap. pós-sinodal Pastores dabo vobis (25 de março de 1992), 12.
[17] Cf. CONC. ECUM. VAT. II, Decr. Ad gentes, 1.
[18] Cf. CONC. ECUM. VAT. II, Declar. Nostra aetate, 1; Const. past. Gaudium et spes, 24; cf. ibid., 29; 22; 92.
[19] Cf. CONC. ECUM. VAT. II, Const. past. Gaudium et spes, 45.
[20] JOÃO PAULO II, Exort. ap. pós-sinodal Pastores gregis (16 de outubro de 2003), 9: « Trata-se efetivamente de funções intimamente ligadas entre si, que reciprocamen- te se explicam, condicionam e iluminam. Por isso mesmo, o Bispo, quando ensina, ao mesmo tempo santifica e governa o Povo de Deus; enquanto santifica, também ensina e governa; quando governa, também ensina e santifica. Santo Agostinho define a totalidade deste ministério episcopal como amoris officium ». O que é dito aqui dos bispos pode também ser aplicado, com as devidas distinções, aos presbíteros.
[21] Disc. no Seminário de Colônia (21 de agosto de 2005).
[22] Cf. JOÃO PAULO II, Exort. ap. pós-sinodal Ecclesia in America (22 de janeiro de 1999), 12.
[23] Na alocução para a apresentação dos votos de Natal à Cúria Romana, em 21 de dezembro de 2007, Bento XVI disse: « Nunca se pode conhecer Cristo apenas teori- camente. Com grande doutrina pode-se conhecer tudo sobre as Sagradas Escrituras, sem nunca O ter encontrado. É parte integrante do facto de O conhecer, caminhar juntamente com Ele, entrar nos seus sentimentos, como diz a Carta aos Filipenses (2, 5). [...] O encontro com Jesus Cristo exige escuta, exige a resposta na oração e em praticar o que Ele nos diz. Com o conhecimento de Cristo chegamos ao conhecimento de Deus, e só a partir de Deus compreendemos o homem e o mundo, um mundo que de outra forma permanece uma pergunta sem sentido. Tornar-se discípulos de Cristo é portanto um caminho de educação para o nosso verdadeiro ser, para o justo ser homens ».
[24] CONC. ECUM. VAT. II, Const. dogm. Lumen gentium, 9.
[25] CONC. ECUM. VAT. II, Decr. Presbyterorum ordinis, 10.
[26] Cf. CONC. ECUM. VAT. II, Const. dogm. Lumen gentium, 28; Decr. Ad gentes, 39; PAULO VI, Exort. ap. Evangelii nuntiandi (8 de dezembro de 1975), 68; JOÃO PAULO II, Cart. enc. Redemptoris missio (7 de dezembro de 1990), 67.
[27] O Papa Bento XVI, estimulando os Bispos brasileiros a « encaminhar a atividade apostólica como uma verdadeira missão dentro do rebanho que constitui a Igre- ja Católica », acrescentou que « trata-se efetivamente de não poupar esforços na busca dos católicos afastados e daqueles que pouco ou nada conhecem sobre Jesus Cristo. [...] Uma missão evangelizadora que convoque todas as forças vivas deste imenso rebanho. Meu pensamento dirige-se, portanto, aos sacerdotes, religiosos, religiosas e leigos que se prodigalizam, muitas vezes com imensas dificuldades, para a difusão da verdade evangélica. [...] Neste esforço evangelizador, a comunidade eclesial se destaca pelas iniciativas pastorais, ao enviar, sobretudo às casas das periferias urbanas e do interior, seus missionários, leigos ou religiosos. [...] O povo pobre das periferias urbanas ou do campo precisa sentir a proximidade da Igreja, seja no socorro de suas necessidades mais urgentes, seja na defesa de seus direitos e na promoção comum de uma sociedade fundamentada na justiça e na paz. Os pobres são os destinatários privilegiados do Evangelho, e um Bispo, modelado segundo a imagem do Bom Pastor, deve estar particularmente atento a oferecer o divino bálsamo da fé, sem descuidar do ‘pão material’. Como pude evidenciar na Encíclica Deus caritas est, ‘a Igreja não pode descurar o serviço da caridade, tal como não pode negligenciar os Sacramentos nem a Palavra’ » (Discurso aos Bispos do Brasil na Catedral da Sé, em São Paulo [11 de maio de 2007]).
[28] Cf. Código de Direito Canônico, cân. 229-§1 e 757.
[29] Cf. CONC. ECUM. VAT. II, Decr. Presbyterorum ordinis, 14.
[30] Cf. JOÃO PAULO II, Cart. enc. Redemptoris missio (7 de dezembro de 1990), 44.
[31] BENTO XVI, Exort. ap. Sacramentum caritatis, 84.
[32] Cf. BENTO XVI, Discurso aos Bispos do Brasil na Catedral da Sé, em São Paulo (11 de maio de 2007), 3.
[33] Cf. CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ, Declaração Dominus Iesus (6 de agosto de 2000), 4.
[34] Cf. CONC. ECUM. VAT. II, Const. dogm. Lumen gentium, 35.
[35] CONGREGAÇÃO PARA O CLERO, Diretório para o ministério e a vida dos presbí- teros Tota Ecclesia (31 de janeiro de 1994), 43.
[36] Cf. BENTO XVI, Cart. enc. Deus caritas est (25 de dezembro de 2005), 22; ID., Discurso aos Bispos do Brasil na Catedral da Sé, em São Paulo (11 de maio de 2007), 3.
[37] Cf. JOÃO PAULO II, Cart. enc. Redemptoris missio (7 de dezembro de 1990), p83.



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