Da vida de Antão, de Santo Atanásio,
bispo e doutor da Igreja
Depois da morte de seus pais ficou só com sua única irmã, muito mais jovem.
Tinha então uns dezoito a vinte anos, e tomou cuidado da casa e de sua irmã.
Menos de seis meses depois da morte de seus pais, ia, como de costume, a
caminho da igreja. Enquanto caminhava, ia meditando e refletia como os
apóstolos deixaram tudo, e seguiram o Salvador (Mt 4,20;19,27); como, segundo
se refere nos Atos (4,35-37), os fiéis vendiam o que tinham e o punham aos pés
dos Apóstolos para distribuição entre os necessitados, e quão grande é a
esperança prometida nos céus para os que assim fazem (Ef 1,18; Col 1,5).
Pensando estas coisas, entrou na igreja. Aconteceu que nesse momento se estava
lendo o evangelho, e ouviu a passagem em que o Senhor disse ao jovem rico:
"Se queres ser perfeito, vende o que tens e dá-o aos pobres, depois vem,
segue-me e terás um tesouro no céu" (Mt 19,21). Como se Deus lhe houvera
proposto a lembrança dos santos, e como se a leitura houvesse sido dirigida
especialmente a ele, Antão saiu imediatamente da igreja e deu a propriedade que
tinha de seus antepassados: trezentas "aruras", terra muito fértil e
formosa. Não quis que nem ele nem sua irmã tivessem algo que ver com ela.
Vendeu tudo o mais, os bens móveis que possuía, e entregou aos pobres a
considerável soma recebida, deixando só um pouco para sua irmã.
De novo, porém, entrando na igreja, ouviu aquela palavra do Senhor no evangelho:
"Não se preocupem do amanhã" (Mt 6,34). Não pôde suportar maior
espera, mas foi e distribuiu aos pobres também este pouco. Colocou sua irmã
entre virgens conhecidas e de confiança, entregando-a para que a educassem.
Então ele dedicou todo seu tempo à vida ascética, atento a si mesmo e vivendo
de renúncia a si mesmo, perto de sua própria casa. Ainda não existiam tantas
celas monásticas no Egito, e nenhum monge conhecia sequer o longínquo deserto.
Todo o que desejava enfrentar-se consigo mesmo, servindo a Cristo, praticava
sozinho a vida ascética, não longe de sua aldeia. Naquele tempo havia na aldeia
vizinha um ancião que desde sua juventude levava na solidão a vida ascética.
Quando Antão o viu, "teve zelo pelo bem" (Gl 4,18), e se estabeleceu
imediatamente na vizinhança da cidade. Desde então, quando ouvia que em alguma
parte havia uma alma esforçada, ia, como sábia abelha, buscá-la e não voltava
sem havê-la visto; só depois de haver recebido, por assim dizer, provisões para
sua jornada de virtude, regressava. Aí, pois, passou o tempo de sua iniciação, se
afirmou sua determinação de não voltar à casa de seus pais nem de pensar em
seus parentes, mas a dedicar todas as suas inclinações e energias à prática contínua
da via ascética. Fazia trabalho manual pois tinha ouvido que "o que não
quer trabalhar não tem direito de comer" (2 Ts 3,10). Do que recebia
guardava algo para sua manutenção e o resto dava-o aos pobres. Orava
constantemente [14], tendo aprendido que devemos orar em privado (Mt 6,6) sem
cessar (Lc 18,1; 21,36; 1 Ts 5,17). Além disso, estava tão atento à leitura da
Sagrada Escritura, que nada se lhe escapava: retinha tudo, e assim sua memória
lhe servia de livros.
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